Vem isto a propósito da denúncia
feita no semanário Expansão de 4 de Julho sobre os salários auferidos pelos
Administradores e Membros do Conselho Fiscal do Fundo Soberano de Angola,
instituição dotada de muito dinheiro proveniente do OGE e à custa dos impostos
que cidadãos humildes e em grande dificuldade financeira pagam para que estes
"senhores" possam viver "à la française" (ou "à la
suisse").
ALVES
DA ROCHA
EXPANSÃO
Cada Administrador do FSDEA aufere mensalmente
43.600 USD e cada membro do Conselho Fiscal 23.900 USD (e parece que em moeda
forte, delapidando-se as já de si frágeis reservas internacionais). Afinal em
que País estamos? O Estado tem ou não tem dinheiro? Ou será que para umas
coisas tem e para outras não. Neste momento de crise financeira e económica
exige-se decoro e comprometimento com o povo, cuja maioria vive em condições
sub-humanas.
O Fundo tem a responsabilidade, através de uma gestão competente, não danosa e eficiente entregar dividendos ao Estado, enquanto único accionista do Fundo. Mas, ao que parece, e ainda de acordo com o Expansão, em Setembro de 2016, os prejuízos acumulados foram estimados em 390,6 milhões USD. Uma empresa privada, se assim o entender e os seus ganhos de produtividade o permitirem, pode pagar este tipo de remuneração. Depende da política de desenvolvimento da empresa, definida pelos accionistas e aplicada pelo Conselho de Administração. O FSDEA é uma Instituição do Estado, utilizando dinheiro dos contribuintes e não pode, nem deve permitir-se a prática destas remunerações. Que tipo de trabalho justifica, afinal, uma remuneração de 43.600 USD por mês? E mesmo de 23.900 USD para um membro do Conselho Fiscal que reúne duas ou três vezes por ano? Será que no caso do Fundo Soberano o seu Conselho Fiscal desempenhou cabalmente as suas responsabilidades e tarefas? Parece que não, atendendo ao teor do artigo do Semanário Expansão.
Fazendo-se uma actualização a 2016 do montante médio mensal de remunerações do trabalho das Contas Nacionais (completas só até 2012), o salário médio mensal em Angola pode ser estimado em cerca de 60.000 AKZ, correspondentes a 300 USD. O que os Partidos Políticos têm a dizer sobre isto? Em especial o MPLA. Está-se perante uma diferença de 145 vezes. Não consegui encontrar no Programa de Governação do Partido do Poder qualquer referência ao problema das desigualdades de remuneração existentes nas Instituições do Estado e na economia em geral. Mas também os outros Partidos Políticos que podem ser Governo, a estas matérias dizem nada. A questão salarial no país não merece referência e consideração, com excepção dos 500 USD de salário mínimo nacional prometidos pela UNITA e que, do meu ponto de vista, e já o escrevi, não tem nenhuma viabilidade económica.
A questão salarial é de uma importância crucial para a redução das desigualdades sociais e económicas em Angola e devia ser abordada politicamente de uma forma responsável e científica pelos Partidos que pretendem governar o país. Pela via salarial e do emprego podem conseguir-se melhorias na redução das desigualdades sociais, bastando conseguir crescimento económico e equilibrar os ganhos de produtividade. Apesar de todos as propostas de Governação defenderem a diversificação como novo modelo de crescimento económico do país, são, no entanto, omissos quanto ao modo como criar uma massa crítica de procura nacional endógena viabilizadora da rendibilidade dos empreendimentos e dos investimentos que darão corpo à diversificação. E a substituição das importações - modelo muito apreciado por dirigentes políticos e empresários - igualmente é apelativa da criação de um poder de compra doméstico que consinta um mínimo de rendibilidade aos investimentos.
Outro dos grandes desafios para a próxima legislatura é o do emprego, ponto de partida para uma maior participação do factor trabalho do Rendimento Nacional. Digo bem, ponto de partida, porque o salário - dependente da produtividade e da repartição dos respectivos ganhos - é igualmente uma componente relevante para a garantia de uma melhor repartição do Rendimento Nacional. Mas, como já tenho escrito, muitas vezes e em diferentes circunstâncias, sem crescimento económico nada feito.
Também se sabe, através de inúmeras evidências empíricas, que pode acontecer crescimento económico com aumento de desemprego, tudo dependendo da intensidade tecnológica e capitalistística dos processos de produção e de fornecimento de serviços. A relação entre progresso técnico e emprego é complexa e antiga (desde os tempos da 1ª Revolução Industrial - introdução da máquina a vapor na indústria - e dos escritos de Karl Marx sobre a formação da mais-valia do trabalho), mas tem ganhado muita actualidade devido às permanentes inovações tecnológicas introduzidas nos vários sistemas de produção e corporizadas pela informática e robótica. No imediato, passa a haver substituição de trabalho por capital e os salários tendem a baixar, devido ao excesso de oferta. O que pode acontecer no futuro - longo prazo - ainda não se sabe muito bem: os empregos perdidos serão recuperados? O MPLA garante a criação de 500 mil novos empregos durante a próxima legislatura. A CASA-CE não promete nada a não ser a "promoção do emprego e o combate à precaridade" sem estimar qualquer cifra.
Tomem-se os 500.000 novos postos de trabalho. (Atenção: novos, o que significa que durante este período não ocorrerá nenhuma destruição de emprego). Como chegar a este número correlacionando produtividade (mais especificamente ganhos de produtividade) e crescimento do PIB? Só com uma taxa média anual de crescimento de 5% tal objectivo será viável, para ganhos médios anuais de produtividade de 2,5%.
No entanto, a maior parte das previsões de crescimento económico em Angola até 2021 apontam para uma taxa média anual de menos de 2% e do sector não petrolífero um pouco acima de 2%. Qualquer um dos valores é claramente insuficiente para patrocinar a melhoria do nível geral de vida da população, que cresce a uma taxa de 3,1% ao ano.
Mas temos de juntar a variável produtividade, para se chegar a uma estimativa mais realista da criação de emprego. A integração na Zona de Livre Comércio da SADC vai ser muito exigente em ganhos de produtividade, porque é a partir daqui que se pode adquirir músculo competitivo estrutural. Claro que também conta a competitividade institucional, empresarial, fiscal, das infraestruturas, etc., que é coisa que não se tem, nem as propostas de Governação dos Partidos dizem algo a propósito. Admitam-se ganhos de produtividade de 6,5% ao ano (ganhos de produtividade correspondem ao crescimento da produtividade bruta média aparente do factor trabalho). Nada de especial se olharmos para os casos da África do Sul, Namíbia, Botsuana, Tanzânia, Maurícias e fora do espaço sadciano o Quénia. Neste caso, para que o MPLA possa chegar ao fim da legislatura com 500000 novos empregos a economia terá de crescer a uma cadência média anual de cerca de 9%. Claro que não é impossível, desde que se removam obstáculos como a corrupção, a burocracia, o tráfico de influências, o ambiente de negócios e se consiga atrair muito investimento privado. E igualmente se passe para um modelo de crescimento mais baseado na redução das desigualdades, na redistribuição do rendimento e na promoção da inclusão social.
A taxa de desemprego formal em 2016 estimada pelo CEIC (Relatório Económico 2016) situa-se no intervalo 22%-24%, evidentemente muito alta e afastada dos propósitos de melhorar a distribuição do rendimento nacional.
As explicações para o desemprego fornecidas pela análise macroeconómica clássica e keynesiana são parciais, porquanto a experiência vai mostrando que mesmo com salários moderados e crescimento económico rápido, é sempre inevitável algum desemprego (por razões relacionadas com as imperfeições e diversidade dos mercados de trabalho). O mercado de trabalho é uma abstracção cómoda para efeitos de análise. Na realidade o que existe são diferentes segmentos do mercado de trabalho, podendo os desequilíbrios subsistirem simultaneamente em cada um deles: excesso de oferta nuns e excesso de procura noutros. No final, os "vasos comunicantes" da economia funcionam para se ter uma situação geral: excesso geral de oferta de trabalho - donde diminuição da taxa salarial - ou excesso geral de procura de trabalho, consequencializando aumento da remuneração deste factor de produção. O desemprego provocado pela segmentação do mercado (de trabalho) tem origem e natureza diferente do desemprego clássico e keynesiano.
Com este artigo ponho ponto final às minhas incursões políticas pelas propostas de Governação dos Partidos Políticos. E neste momento já decidi qual a orientação do meu voto no dia 23 de Agosto.
O Fundo tem a responsabilidade, através de uma gestão competente, não danosa e eficiente entregar dividendos ao Estado, enquanto único accionista do Fundo. Mas, ao que parece, e ainda de acordo com o Expansão, em Setembro de 2016, os prejuízos acumulados foram estimados em 390,6 milhões USD. Uma empresa privada, se assim o entender e os seus ganhos de produtividade o permitirem, pode pagar este tipo de remuneração. Depende da política de desenvolvimento da empresa, definida pelos accionistas e aplicada pelo Conselho de Administração. O FSDEA é uma Instituição do Estado, utilizando dinheiro dos contribuintes e não pode, nem deve permitir-se a prática destas remunerações. Que tipo de trabalho justifica, afinal, uma remuneração de 43.600 USD por mês? E mesmo de 23.900 USD para um membro do Conselho Fiscal que reúne duas ou três vezes por ano? Será que no caso do Fundo Soberano o seu Conselho Fiscal desempenhou cabalmente as suas responsabilidades e tarefas? Parece que não, atendendo ao teor do artigo do Semanário Expansão.
Fazendo-se uma actualização a 2016 do montante médio mensal de remunerações do trabalho das Contas Nacionais (completas só até 2012), o salário médio mensal em Angola pode ser estimado em cerca de 60.000 AKZ, correspondentes a 300 USD. O que os Partidos Políticos têm a dizer sobre isto? Em especial o MPLA. Está-se perante uma diferença de 145 vezes. Não consegui encontrar no Programa de Governação do Partido do Poder qualquer referência ao problema das desigualdades de remuneração existentes nas Instituições do Estado e na economia em geral. Mas também os outros Partidos Políticos que podem ser Governo, a estas matérias dizem nada. A questão salarial no país não merece referência e consideração, com excepção dos 500 USD de salário mínimo nacional prometidos pela UNITA e que, do meu ponto de vista, e já o escrevi, não tem nenhuma viabilidade económica.
A questão salarial é de uma importância crucial para a redução das desigualdades sociais e económicas em Angola e devia ser abordada politicamente de uma forma responsável e científica pelos Partidos que pretendem governar o país. Pela via salarial e do emprego podem conseguir-se melhorias na redução das desigualdades sociais, bastando conseguir crescimento económico e equilibrar os ganhos de produtividade. Apesar de todos as propostas de Governação defenderem a diversificação como novo modelo de crescimento económico do país, são, no entanto, omissos quanto ao modo como criar uma massa crítica de procura nacional endógena viabilizadora da rendibilidade dos empreendimentos e dos investimentos que darão corpo à diversificação. E a substituição das importações - modelo muito apreciado por dirigentes políticos e empresários - igualmente é apelativa da criação de um poder de compra doméstico que consinta um mínimo de rendibilidade aos investimentos.
Outro dos grandes desafios para a próxima legislatura é o do emprego, ponto de partida para uma maior participação do factor trabalho do Rendimento Nacional. Digo bem, ponto de partida, porque o salário - dependente da produtividade e da repartição dos respectivos ganhos - é igualmente uma componente relevante para a garantia de uma melhor repartição do Rendimento Nacional. Mas, como já tenho escrito, muitas vezes e em diferentes circunstâncias, sem crescimento económico nada feito.
Também se sabe, através de inúmeras evidências empíricas, que pode acontecer crescimento económico com aumento de desemprego, tudo dependendo da intensidade tecnológica e capitalistística dos processos de produção e de fornecimento de serviços. A relação entre progresso técnico e emprego é complexa e antiga (desde os tempos da 1ª Revolução Industrial - introdução da máquina a vapor na indústria - e dos escritos de Karl Marx sobre a formação da mais-valia do trabalho), mas tem ganhado muita actualidade devido às permanentes inovações tecnológicas introduzidas nos vários sistemas de produção e corporizadas pela informática e robótica. No imediato, passa a haver substituição de trabalho por capital e os salários tendem a baixar, devido ao excesso de oferta. O que pode acontecer no futuro - longo prazo - ainda não se sabe muito bem: os empregos perdidos serão recuperados? O MPLA garante a criação de 500 mil novos empregos durante a próxima legislatura. A CASA-CE não promete nada a não ser a "promoção do emprego e o combate à precaridade" sem estimar qualquer cifra.
Tomem-se os 500.000 novos postos de trabalho. (Atenção: novos, o que significa que durante este período não ocorrerá nenhuma destruição de emprego). Como chegar a este número correlacionando produtividade (mais especificamente ganhos de produtividade) e crescimento do PIB? Só com uma taxa média anual de crescimento de 5% tal objectivo será viável, para ganhos médios anuais de produtividade de 2,5%.
No entanto, a maior parte das previsões de crescimento económico em Angola até 2021 apontam para uma taxa média anual de menos de 2% e do sector não petrolífero um pouco acima de 2%. Qualquer um dos valores é claramente insuficiente para patrocinar a melhoria do nível geral de vida da população, que cresce a uma taxa de 3,1% ao ano.
Mas temos de juntar a variável produtividade, para se chegar a uma estimativa mais realista da criação de emprego. A integração na Zona de Livre Comércio da SADC vai ser muito exigente em ganhos de produtividade, porque é a partir daqui que se pode adquirir músculo competitivo estrutural. Claro que também conta a competitividade institucional, empresarial, fiscal, das infraestruturas, etc., que é coisa que não se tem, nem as propostas de Governação dos Partidos dizem algo a propósito. Admitam-se ganhos de produtividade de 6,5% ao ano (ganhos de produtividade correspondem ao crescimento da produtividade bruta média aparente do factor trabalho). Nada de especial se olharmos para os casos da África do Sul, Namíbia, Botsuana, Tanzânia, Maurícias e fora do espaço sadciano o Quénia. Neste caso, para que o MPLA possa chegar ao fim da legislatura com 500000 novos empregos a economia terá de crescer a uma cadência média anual de cerca de 9%. Claro que não é impossível, desde que se removam obstáculos como a corrupção, a burocracia, o tráfico de influências, o ambiente de negócios e se consiga atrair muito investimento privado. E igualmente se passe para um modelo de crescimento mais baseado na redução das desigualdades, na redistribuição do rendimento e na promoção da inclusão social.
A taxa de desemprego formal em 2016 estimada pelo CEIC (Relatório Económico 2016) situa-se no intervalo 22%-24%, evidentemente muito alta e afastada dos propósitos de melhorar a distribuição do rendimento nacional.
As explicações para o desemprego fornecidas pela análise macroeconómica clássica e keynesiana são parciais, porquanto a experiência vai mostrando que mesmo com salários moderados e crescimento económico rápido, é sempre inevitável algum desemprego (por razões relacionadas com as imperfeições e diversidade dos mercados de trabalho). O mercado de trabalho é uma abstracção cómoda para efeitos de análise. Na realidade o que existe são diferentes segmentos do mercado de trabalho, podendo os desequilíbrios subsistirem simultaneamente em cada um deles: excesso de oferta nuns e excesso de procura noutros. No final, os "vasos comunicantes" da economia funcionam para se ter uma situação geral: excesso geral de oferta de trabalho - donde diminuição da taxa salarial - ou excesso geral de procura de trabalho, consequencializando aumento da remuneração deste factor de produção. O desemprego provocado pela segmentação do mercado (de trabalho) tem origem e natureza diferente do desemprego clássico e keynesiano.
Com este artigo ponho ponto final às minhas incursões políticas pelas propostas de Governação dos Partidos Políticos. E neste momento já decidi qual a orientação do meu voto no dia 23 de Agosto.
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