sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Fui nomeado 2º comandante provincial e graduado a Superintendente-chefe. Divaldo Martins


Há dois anos, depois de ter ficado um em casa, fui transferido para a Lunda Sul. Mal desembarquei, tive um " desarranjo", e só rezava para chegarmos rapidamente ao sítio onde seria alojado. Mal desci, como quem não quer nada perguntei ao oficial que me acompanhava onde era WC, e quando me levaram lá, até a diarreia passou. A pia, completamente castanha, parecia um reservatório de água podre. A água era tão preta, mas tão preta, que parecia um espelho. Consegui travar a explosão iminente e pedi que me mostrassem o quarto. Era grande, mas parecia uma prisão. O chão era de cimento bruto e tinha uma pequena janela gradeada que dava para a traseira do prédio, onde as crianças de manhã iam brincar e cagar. Por falar em cagar, só consegui travar mais meia-hora, e acabei por me render e sentar naquela pia imunda, com uma perna a tentar travar a porta que não fechava. Voltei para o quarto e a minha mãe ligou. Perguntou se estava tudo bem e eu disse que sim. Se tinha sido bem instalado e eu disse que sim, enquanto tentava afastar a lágrima teimosa que me pintava o olhar. Fiquei depois a olhar para o teto a me perguntar: o quê que eu fiz? Porquê que estou a passar por isso? Quando decidi ir pra Lunda ninguém concordou. Nem a minha família, nem os meus amigos, nem os meus colegas. Todo o mundo achava que era um castigo, que não devia aceitar. Mas eu, farto de estar em casa sem fazer nada, acabei por ir. E arrependi-me, confesso. Partilhava o rés-do-chão, que fazia de casa de passagem, com um
colega muito simpático, o Chinha. De manhã funcionava na casa o protocolo. O nosso cozinheiro era o Sr. Manuel, um velho tuberculoso que era um verdadeiro "maitre" e que não parava de tossir enquanto nos fazia a caldeirada de cabrito. O meu companheiro de quarto era um rato que me dava cabo dos bolos secos, enchia a cama de cocó e já nem fugia quando me via. Nos dias mais tristes, quando me trancava a comer pão com leite moça, levava um bocado pra ele e ficávamos lá os dois. Trabalhava num barracão de teto de chapa, quase a ruir, que entrava água quando chovia - chovia três vezes por dia - e onde tinha de ouvir as discussões dos meus funcionários sobre feitiço. Mas sempre que alguém de Luanda me perguntasse, eu dizia que estava tudo bem. Seis meses depois, abandonei a messe e arrendei um apartamento em escombros. A janela do quarto não tinha vidros e quase sempre ficava constipado. Meti a casa em obras - até agora continua. Fiz amigos. O novo comandante mudou-me de gabinete, e hoje fui nomeado 2º comandante provincial e graduado a Superintendente-chefe. Não ganhei o mundo, não cheguei a lua, mas provei a mim mesmo - e quem sabe aos outros - que a fé e a perseverança devem andar juntas se quisermos vencer. Durante esse tempo aprendi muito. Aprendi que nem todos os que nos sorriem são nossos amigos. Aprendi que o mal que nos querem fazer só vinga se deixarmos, que podemos transformar uma queda numa oportunidade para saltar mais alto. Aos 34 anos, com certeza que voltarei a cair, mas terei ainda tempo de voltar a levantar e continuar a caminhar. Tenho recebido muitas felicitações, muita gente mudou de ideias e já me chamam de sortudo. Só o destino dirá se têm razão, mas eu prometo tudo fazer para continuar a aproveitar os momentos no chão para pensar e aprender a saltar mais alto. A todos os meus amigos, à minha família, em especial os meus filhos, desejo um feliz Natal e bom ano novo.

2 comentários:

valter disse...

Comandante,Dentro de cada um de nós está a liberdade de dizer não a aquilo que não esta certo,e se isso te levar a estar mal com os homens,podes crer que estarás bem com DEUS.
feliz Natal...

SIM disse...

SR. COMANDANTE, EU SEI MAIS AO MENOS O QUE EH ISSO POR AI EU ESTIVE EM 19666 NO LUBALO, CACOLO, EM EM HENRIQUE DE CARVALHO (SAURIMO) E EU TINHA NOJO DE IR A CASA DE BANHO ERA UMA RETRETE POIS ANDEI POR A LUNDA NORTE E SUL DESEJO-LHE BÕA SORTE E SAÚDE.