Não pretendo ser o apóstolo da
desgraça, mas receio que a economia possa estar num processo de colapso, se,
entretanto, medidas drásticas e fortíssimas não forem tomadas, mas que se
encontram altamente condicionadas pelas promessas eleitorais. Nenhum dos
programas dos três partidos políticos que podem ser Governo - MPLA, CASA-CE e
UNITA - se atreveram a abordar os problemas que afectam a economia angolana e a
discernir sobre os meios e as modalidades de os atenuar e marcar a cadência
futura para a sua resolução.
ALVES DA ROCHA
EXPANSÃO
O título desta minha crónica,
foi, de certa maneira, inspirado nas possíveis diferentes formas de a vida
humana acabar neste planeta Terra. Na Bíblia Sagrada este fenómeno é chamado de
Armagedão. Do ponto de vista estritamente científico, a Terra poderá vir a ser
engolida pelo Sol - devido à actuação de forças centrífugas ou centrípetas. Ou,
então, ser atingida por alguns meteoritos que a destruirão sob a forma de
tsunamis, incêndios e inundações. Ou ainda, mais lentamente, através da
degradação ambiental. O resultado será inevitável, mesmo que, entretanto, se
possam tomar algumas medidas preventivas ou correctivas facilitadas pelos
extraordinários avanços tecnológicos e científicos (por exemplo, a destruição
dos meteoritos por meio de bombardeamentos cirúrgicos feitos através de naves
espaciais poderosas, desvio da sua rota de colisão com a terra, etc.).
A economia angolana já está a ser
ameaçada por alguns meteoritos de elevado poder de destruição, tendo eu dúvidas
de que nos tempos mais próximos se possa desviar a sua rota de colisão, na
ausência do único carburante válido e convincente: o preço do petróleo, que
continua numa rota absolutamente de estabilidade em torno de 48 USD o barril.
Não há perspectiva que esta "arma económica" mude a sua trajectória
pelo menos até 2021, levantando, em conformidade, receios, dúvidas e incertezas
quanto à capacidade de crescimento futuro da economia angolana. E sem crescimento
mais nada pode acontecer.
Os meteoritos que já estão a
colidir com a economia nacional são: taxa de câmbio, taxa de inflação, défice
fiscal e crescimento económico. Sob a designação genérica de "
Estabilidade Macroeconómica e Sustentabilidade das Finanças Públicas" o
programa de governação do partido que seguramente, de uma forma ou de outra,
com mais ou menos transparência, vencerá as eleições de 23 de Agosto deste ano,
diz praticamente nada de relevante sobre estas matérias: "a manutenção da
estabilidade macroeconómica implicará as seguintes acções: combater a inflação
e assegurar a estabilidade da moeda nacional e do seu poder de compra, alargar
o âmbito de aplicação do regime dos preços vigiados para se defender as camadas
mais vulneráveis, definir uma nova política cambial com base num regime de
câmbios flexíveis controlados, ...". Intenções apenas, ainda que
consensuais, mas sem se dizer como fazê-lo. E não se pode argumentar que se
trata apenas e por enquanto de um programa de governação, como tal de intenções.
Mas a mim, como economista, e, com certeza, que para muitos empresários, o
"como fazê-lo" interessa e de que maneira. É no como fazê-lo que as
relações entre os objectivos entre si e destes com as medidas de política
económica podem ser de conflitualidade, de antinomia, de contradição ou de
convergência (a obtenção de uns potencia o alcance de outros).
Por exemplo e numa lógica da
Teoria das Escolhas Públicas, que objectivo é mais importante de se atingir, no
médio prazo: a estabilidade dos preços ou a defesa das Reservas Internacionais
Líquidas? Os programas dos três partidos do arco da governação nada dizem a
este respeito.
E não se trata apenas de uma
insistência minha quanto à sua importância: uma desvalorização da moeda em
quanto impacta a taxa de inflação, a curto e médio prazo? Uma desvalorização
cambial em quanto influencia a taxa de crescimento do PIB, pela via da redução
das importações e numa situação de elevado conteúdo importado da produção
nacional? Uma redução do poder de compra internacional do Kwanza em quanto
contribui para incrementar as exportações?
As RIL do país estão em níveis
nunca verificados depois de 2002. As mais recentes informações do BNA,
colocavam o seu valor em USD 19 mil milhões em Junho do corrente ano.
Desvalorizar, tornando a moeda externa mais cara, pode resultar numa
preservação deste montante, esperando-se que o preço do petróleo suba para se
incrementar a sua disponibilidade. Que efeitos sobre a taxa de inflação? A
resposta não é, nem directa (muitos factores influenciam o comportamento dos
preços e numa economia desarticulada e desestruturada como a angolana, os
custos empresariais são influenciados negativamente pelo excesso de burocracia
e elevada corrupção, pela falta de electricidade e água (anunciado a semana passada
o adiamento sine die da entrada em funcionamento da barragem de
Laúca, nada de surpreendente para mim), nem imediata (embora não se conheçam os
lags
das medidas de política económica em Angola, seguramente que só
dois ou três meses depois a inflação se ressentiria).
Admita-se uma desvalorização
média em 2017 de 30%. Introduzindo este valor num modelo uniequacional de
correlação entre a taxa de inflação e a taxa de crescimento do PIB, a criação
de moeda e a própria taxa de câmbio, mas admitindo a hipótese de ceteris
paribus a taxa de inflação poderia situar-se, no final deste ano, em 21,8%. Mas
outra questão se coloca: qual a meta final da desvalorização, admitindo que o
propósito é o de se equilibrar e estabilizar o mercado cambial (propósito
transversal às propostas de governação dos principais partidos potencialmente
ganhadores)? A taxa de câmbio do mercado paralelo não pode ser a referência
única e exclusiva, ainda que se admita que é onde as forças reais do mercado se
confrontam. Há metodologias e outras aproximações econométricas que ajudam a
estimar a taxa de câmbio de equilíbrio de qualquer economia. O BNA deve saber
qual ela é.
O impacto da desvalorização sobre
o crescimento económico pode ser colocado ao contrário: qual a taxa de
crescimento do PIB que garantiria a estabilidade dos preços, num cenário de
desvalorização cambial de 30% em 2017? Antes de mais, o que se deve entender
por estabilidade de preços?
Nenhum dos partidos concorrentes
às próximas eleições esclareceu os eleitores e os cidadãos sobre o que é a sua
estabilidade dos preços: taxa de inflação igual a zero por cento? Taxa de
inflação de 10%? Vou escolher este último valor para responder à pergunta que
atrás formulei e admitindo que afinal o aumento de preços constitui, dentro de
determinados limites, um estímulo ao investimento e ao aumento da produção.
Neste caso, a taxa de crescimento do PIB em 2017 teria de atingir o valor de
19%.
Porém, todas as projecções sobre
o crescimento económico do país até 2021 apontam para um valor médio anual bem
mais modesto (no melhor dos cenários, 2,5% ao ano, não sendo por acaso que o
Banco Mundial reverteu a classificação de Angola de país de rendimento
médio-alto para rendimento médio-baixo), donde estar completamente fora de
causa nos tempos mais próximo a promessa da CASA-CE de colocar o país numa rota
de crescimento de 10% ao ano. Devo, ainda, acrescentar que uma dinâmica de
variação de 19% ao ano, em condições de restritividade da política monetária,
está absolutamente fora de causa e sequer de cogitação.
Estes simples exercícios serviram
para mostrar a complexidade da política económica e exigir que as promessas
eleitorais se confinem nos limites e determinantes da Ciência Económica,
deixando de ser meras propostas e arrazoados de promessas absolutamente
incumpríveis, nestas ou noutras condições da economia angolana. Quem é que
propõe, caso seja Governo, um salário mínimo equivalente a 500 USD? Um salário
mínimo de 500 USD por mês (outra promessa irresponsável, quando o valor da
produtividade média do trabalho, em 2016, foi de 13.000 USD) só será possível
quando o PIB de Angola atingir a cifra de 250 mil milhões USD (o seu valor em
2016 não chegou aos 100 mil milhões USD).
Estas são mais algumas das razões
que limitam e condicionam a minha escolha eleitoral. O tratamento inadequado e
populista, nuns casos, e o não tratamento liminar noutros, destas questões
contribuem para a minha hesitação, provavelmente só desfeita no próprio dia das
eleições. Entretanto, continuo a observar, a ler e a acompanhar (como dizia
Zeca Afonso: "lemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar").
Alves da Rocha
escreve quinzenalmente neste espaço
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