segunda-feira, 30 de junho de 2008

Fóssil do Mioceno


A estirada para Tule avançava, diminuía o percurso. A paisagem da juventude Petrofaminta que enchia baldes com água para lavar carros e solidificar a fé comestível, não melhorava. Jovens dengosas auscultavam nos vidros dos carros e trocavam impressões sobre o preço da carne. Os seguranças permaneciam encostados, apoiados nos pilares. Outros sentados em improvisadas cadeiras.

De repente o ambiente intempesta-se. Dois desabridos seguranças manifestam dor da alma. Um narra para os colegas os últimos acontecimentos. Roga apoio, mas os colegas limitam-se a ouvi-lo, porque ao mínimo deslize perdem o emprego.
-… O director da empresa da vanguarda Incendiária apresentou lamentos: Descobriu que algumas alvíssaras se evadiram dos cofres. Vai daí, nada mais fácil do que culpar os seguranças. O indistinto prosélito, qual mastodonte fóssil do Mioceno ordenou: «chamem a polícia Incendiária». A polícia chegou, ele deu-lhes a quantia necessária para as investigações e actuaram de imediato. Cismaram para quatro seguranças, arrastaram-nos e divertiram-se muitas horas a cascar-lhes chapadas com catanas nas costas e nas faces. Num deles, os Incendiários arrancaram-lhe as unhas dos dedos das mãos. Depois atiraram-nos para um albergue, com os ossos tão amassados, que alguém se lembrou de dizer: «essa pasta óssea dá para fazer pastilha elástica».

- Mentor… é doença mental?
- Hum, hum. Prometeram-lhes mundos e fundos, deram-lhes uma chave falsa para a felicidade eterna. No princípio é fácil abusar da boa fé das pessoas, tiram-se muitos dividendos, mas com o tempo tudo se desmorona. É como a prisão perpétua.
Gil Gonçalves

domingo, 29 de junho de 2008

Cultura Tradicional Bantu (X)


Há um culto especial, em certos bosques sagrados, reservados aos túmulos dos chefes. Ali ninguém pode cortar lenha, e só penetra o guardião, descendente de chefes, o qual, de vez em quando, lhes oferece sacrifícios.
Para os sacrifícios preparam pequenos e toscos altares protegidos por uma cabana, ao ar livre, perto das casas ou no bosque e nas encruzilhadas.
Veneram certas relíquias dos antepassados ilustres, sobretudo o crânio, as tíbias, unhas e cabelos, ou objectos pessoais como armas e instrumentos técnicos. Colocam-nos dentro de minúsculas habitações, onde os antepassados gostam de morar. A sua presença é mais notada e activa, porque se prolongam nas relíquias.
Um dos processos mais usados para os atrair consiste em cavar uma minúscula sepultura junto de casa. Enchem-na de alguma matéria que apodrece depressa, simbolizando o corpo do antepassado. Ao lado plantam uma árvore, que fica sacralizada, porque a aspergem com o sangue de uma galinha, ao mesmo tempo que suplicam ao antepassado que passe a viver nela. Se a árvore seca, quer dizer que o antepassado não aceitou a mansão. Essa árvore escuta diariamente as súplicas da família.

Durante o terceiro ano, aprende a adivinhação pela água e as encantações pela maneira de entender a linguagem das árvores, rios e fadas.

Se a África negra não supera a estreiteza comunitária, a dependência acabrunhadora dos parentes e a crença na omnipresente e todo-poderosa, não cremos que consiga a libertação, que leva consigo uma gama de objectivos muito maior que a independência política.

A experiência do mal provocou o medo. O bantu sofreu calamidades permanentes: vida breve, doenças endémicas, opressões seculares e a interacção ambivalente. O medo é a consequência do desconhecimento das causas naturais dos fenómenos e afunda o bantu nesse desconhecimento, na inércia e na passividade fatal que sufoca qualquer tentativa e possibilidade de encontrar a solução de um problema, a seu ver, irremediável, pois que o ultrapassa.

A privada, exercida por indivíduos anónimos, é quase sempre perigosa, não só porque não se consegue detectar a sua origem, mas sobretudo, porque é utilizada com objectivos malévolos, para satisfazer paixões. Qualquer indivíduo, possuidor destas técnicas, quase sempre imitadas dos especialistas, julga-se superior e emprega-as em proveito próprio.
«A magia privada tem um campo vastíssimo. São raras as ocasiões em que o homem não necessite da sua ajuda. Recorrem a ela para aumentar o bem-estar, favorecer as paixões e afastar males reais, ou imaginários, que os rodeiam. Algumas actividades de primeira necessidade (caça, pesca, gado, agricultura) são acompanhadas de magia. O mesmo acontece com os principais actos da vida humana: nascimento, puberdade, matrimónio e morte. Há uma magia privada, própria para apoiar ou destruir o afecto, proteger a propriedade, ter êxito na guerra, controlar os fenómenos da natureza, curar doenças, anular os projectos dos feiticeiros, fazer exorcismos aos espíritos maus». Os feiticeiros exercem a magia privada.

O uso de um pedaço de qualquer objecto, ou mesmo reprodução, afecta e influi no objecto ou pessoa real. Quando põem ao pescoço um chifre de animal, conseguem a sua protecção ou ficam livres dos seus ataques. Se perfuram com uma pequenina será um boneco antropomórfico, se lhe espetam uma faca, se o queimam ou o cortam aos pedaços, provocam a morte do inimigo representado. O mesmo acontece se rasgam uma fotografia. Assim, o especialista fabrica uma estatueta que representa determinada pessoa e, actuando sobre ela, pode matar ou prejudicar essa pessoa.

É muito usada esta acção mágica sobre a participação. Para atingir um indivíduo basta actuar sobre as suas roupas, unhas, ossos, cabelos, saliva, excrementos, ou sobre a erva ou terra que ele pisou ou da sua casa, pois conservam algo da sua vida. Tudo o que o especialista fizer sobre esses objectos, bom ou mau, acontecerá ao dono. O mesmo se verifica em relação ao caçador que bebe o sangue da peça abatida, ou ao guerreiro que bebe o sangue dos seus companheiros ou inimigos caídos na batalha. Apropriam-se da sua força vital. Pela lei da comunidade, um ser pode sofrer as consequências mágicas da desgraça caída sobre outro ser com o qual estava vitalmente ligado. A morte de um gémeo pode vitimar o sobrevivente.

A magia por contacto pode actuar sobre fotografias, pegadas, sombra, utensílios e reflexo de um ser vivo e, sobretudo, sobre o seu nome verdadeiro. «as qualidades dos objectos são realidades substanciais, simultaneamente separáveis e transmissíveis. A comunicação verifica-se, quase sempre, por contacto físico: tacto, absorção de comida ou bebida, relações sexuais. O contacto pode revestir outras formas: um olhar, um gesto, uma palavra.

«o marido polígamo dirige-se à primeira esposa e esta transmite as suas ordens às restantes esposas. Dirige-se igualmente ao primeiro filho, quando quer dar ordens aos restantes filhos. O que está encarregado de transmitir um recado dirige-se a uma terceira pessoa, isto é, à pessoa que acompanha aquele a quem deve transmitir esse recado. A não ser que se trate de um segredo pessoal. Não é estranho nem fora do normal que o negro, ao sul do Sara, recorrendo sempre a um intermediário para se dirigir ao seu semelhante, tenha institucionalizado intermediário para orar a Masa Dambali (Deus para os Bambaras).

O bantu recorre ao adivinho ou ao curandeiro sempre que alguma desgraça o persegue, quando se sente ameaçado ou deseja conseguir favores, boa sorte ou, então, quando pretende afastar a acção de feitiços dirigidos contra si. Costumam recomendar-lhe um feitiço que pode mesmo ser fabricado pelo cliente ou por qualquer artista, mas só o especialista o pode tornar poderoso.
In Cultura Tradicional Bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Edições Paulinas
Gil Gonçalves
Imagem: http://www.macua.org/livros/olhar1np.html

A Espada de Urundi Suspensa


A geratriz das ideias expõe o fervor ideológico. Perde-se o senso moral, abandona-se o bom samaritano. O perigo da política sectária acirra e confronta os espíritos, anima a imersão de conflitos civis. Quando um dos lados está contra tudo e todos, o poder salta-lhe à vista. Os anarquistas omnipresentes lançam poeira nos olhos incautos.
- Há alguém que consiga fugir da prisão preventiva das cidades? Que não se canse de fazer amor, sempre com a mesma mulher?
- Eleições, com biliões? Quando a bondade se vê e deseja…é escarcéu… os Petrofamintos e os Incendiários são guerreiros, a eleição será pautada à paulada, cacetada. Se os Petrofamintos ganharem, os Incendiários amarram o jogo, virarão o resultado.

Aliançados com grandes negócios, não darão as costas a midas. Se os Incendiários perderem – tem que ganhar – os militares estão lá para resolver, para decidir a contenda favorável aos Incendiários. É assim que sobrevive uma nação guerreira, com o seu líder eterno colocado nas nuvens. Com ar de mistério no mar desencontrado.
- A espada da barbárie de Urundi suspensa.
- Para cada quadrilha de malfeitores há sempre um herói. Como Bat Masterson e Wyatt Earp, o panteão da história lembra-os.
- Na história da caubóiada.
- Nas leis da história. Os heróis são necessários, entram em acção e repõem a ilegalidade.

O receio da cólera feria as mentes, congestionava as vias públicas. A cólera é pungente porque o poder não se sente. É sonho diurno. A lábia dos boca a boca interrompeu-se. Radiodifundia-se actualização do vibrião.
- Aguentem a cavalaria! Vai sair locução dos números epidémicos.
- Muda para a Rádio do Oráculo, a outra faz desconto.
- Já está! Deixem radiar!
Rádio Oráculo. Números da cólera…quarenta e dois mil infectados e mil e seiscentos mortos.
Mais informação com o nosso correspondente:
… Desencontro-me no desertus mirabilis. O barqueiro Caronte tem a situação controlada. Desviou um afluente do rio Estige que inunda o desertus mirabilis. As vítimas excedem-se. Os defuntos progridem com os vivos. Estes, para escaparem dos fluidos de Caronte, saltam pelas janelas do hospital, que parece o anjo da morte Mengele. O cheiro dos cadáveres é insuportável. Há mais de um mês que as autoridades locais guardam silêncio. A cólera espalha-se como uma invasão de gafanhotos. Quem divulgue informação do que se passa, as autoridades ameaçam com tribunal ad hoc. No momento em que vos falo, os Incendiários montam-me guarda. Dizem que vão cursar-me tratamento de choque informativo. Que tempos coléricos estes. Ó da guarda! Digo adeus ao mundo!
- Mentor…
- Minha Jasmim, a cólera encoleriza os cegos de espírito.
Gil Gonçalves

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Alfazema de Moçambique. Mulher


Existem campeonatos do mundo para tudo,
mas não existe nenhum para a fome.
Falta o campeonato do mundo
para premiar a melhor ditadura
E torneio para o melhor governo parte casas.

Perto, restos de uma cadeira
comentando a vida passada
Enquanto crianças saem da escola
fugindo à morte dos velozes automóveis
A morgue vigia-as.
Chegam a casa famintas
espera-as a surpresa da fome.

Neste beber, vejo as crianças nascer
brincar, crescer, a sofrer
Libertem-me da fome e dominarei o mundo!

Entretanto…
Nos universos paralelos
Existem várias dimensões
Uma dimensão LAM
Um sonho alado, aperfeiçoado, dourado.

Gil Gonçalves

Mulher

Mulher, aí mulher.
Gorda, magra,
Preta, Branca,
Amarela, Mestiça
Cristã, Muçulmana,
Ímpia

Sejas o que te quiserem chamar
Tu és mulher
E ser Mulher é ser especial.
E é-se especial
Quando se é mulher.

Mulher, formosa
Andar felino
Falar tranquilo
Olhar ardente
Coração grande
Amor eterno

Alegria infinita
Braços abertos
Colo quente
Paciente
Serena
Esta é eternamente a mulher
Lutadora
Aguerrida
Sofrida
Mas alegre
E contínua
Porque é mulher
Tomara te entendessem
Mulher

Suzete Madeira
Inicialmente publicado em: Eugénio Almeida
Malambas

Câmara, Acção!


Manos e Manas! Os estrangeiros ocupam tudo, empurram-nos, arrastam-nos. Estamos a ficar encurralados, como os Romanos e Asterix em Babaorum. Como o Sul-africano vulcão, prestes em erupção. Hoje, mais um dia desgovernado nos espera, nos desespera.

Quando a informação escasseia com intenção, os oratórios ambulantes costumam-se especulativos, e evoluem para observatórios de rua. Um acontecimento de vulto é relatado, com o tempo torna-se lendário, um mito. Os Petrofamintos instituíram observatórios de rua, nas ruas clandestinas. Popularmente, naturalmente, chamaram-lhes observatórios boca a boca. Num destes boca a boca, o orador especulava que um simples plano sem director seria suficiente para Petrofaminta estacionar, ficar bem estacionada.

Era a suma dos proeminentes que estudavam a degradada jurisdição. De improvisado púlpito, e de jurisdição contenciosa esgrima-se:
- É o relativismo moral. Os Europaeus refizeram-se, refrescaram-se, depois da secundária guerra universal. Porquê!? Porque é constante a corruptela das sociedades sem um plano económico. Depois da economia de guerra, de palitos, dirigida, fechada, informal, invisível, mista, popular, velha, uf!... E de mercado… o que necessitamos é estourar um grande Plano Marcial.
Os ouvintes, desempregados sistemáticos, desentendiam-no perfeitamente. Eram natas, a fina-flor do ensino superior.
- Oh!.. Há mais de trinta anos que estamos com esse plano de emergência da trintena!
- Carecemos da informação, da refracção da perda de intensidade da luz do backbone.
- Impaciento-me com semelhanças, inverosimilhanças.
- O plano quinquenal?
- Sim! Esse mesmo, o das quintas.
- Não! O trienal.
- A caubóiada do ir por um plano inclinado.

Um participativo escuda-se no prudente silêncio. Receia falar porque lhe podem atirar o primeiro pedregulho da incompetência. Os convivas atiçam-no, então descongestiona a perda de coragem da garganta, refina o espírito, evidencia-se e reprova a turma do deixa-disso:
- Os Petrofamintos querem rever os estatutos da fome. Os políticos falam bwe, muitos comícios, muitos debates, chuvas de palavras, seca alimentar. Fome canina de vento desabrigado. A fome supera os caudais oceânicos. Os lucros dos bancos sobem, a fome também. Palavras… dar o dito pelo não dito, e os reditos maldosos aterram-se, vítimas da sua maldade. Políticos que sorteiam justificação, todos são deuses, daqueles inacessíveis.

O contumaz orador sentiu a boca colar-se. Era um esforço desabituado, contaminado pelo pó tempestivo que inundava a cavidade bucal. Solicitou água mineral, só havia desmineralizada devido às constantes fervuras. A garganta arranhava-se, entupia-se, congestionava-se. Na aflição qualquer água serve. Fez um sorvedouro, uma goleada de goles. Com a garganta reparada desfilou a temática.
- O cortejo feudal do caudal automóvel outonal, luxuário do descrédito actual, envergonha o solo habitual da pobreza mortal. As vestais auguram aos príncipes encantados que o rei dos canhões anunciará eleições. Serão flageladas em 1132, 1133, 1134. Desflorestadas em 1135, 1136, 1137. Desacostumadas em 1138, 1139, 1140. Aguardadas pela Renascença, abandonadas pelo Barroco. A nossa diferença reside em que não podemos ter ideias diferentes. Quem não está preparado para governar, aos dinossauros deve regressar. Urge um bom realizador que grite: CÂMARA! ACÇÃO!
Gil Gonçalves
Vulcão, descrédito, desgovernado, economia

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Figura da Semana. Zé do Telhado


Algumas pessoas nunca repetem os mesmos erros. Descobrem novos erros para cometer. Mark Twain


Segurança
por Guilherme Pereira
(Jornalista)

Zé do Telhado

Zé do Telhado, titular da Ordem da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito, permanece no imaginário popular como um assaltante que roubava aos ricos para dar aos pobres. O mito e as lendas têm servido para ocultar um processo judicial feito de mentiras e provas forjadas.

Na campa, onde jaz, consta uma data de nascimento igualmente falsa. As quadrilhas integravam padres, morgados, administradores, empresários e alfaiates. Nunca foram julgados. A História reconduz-nos a julgamentos recentes, alguns dos quais da actualidade...

Na noite de 16 para 17 de Março de 1857, Zé do Telhado é já alvo de uma caça ao homem sem precedentes. Tinha renovado a quadrilha, agora constituída por Zé do Telhado e o irmão Joaquim, António da Cunha, o Silva mestre pedreiro, a senhora Tomásia, Joaquim Pinto e a mulher, donos de uma estalagem , o Morgado António Faria, o padre Torquato José Coelho Magalhães, o alfaiate Miguel Exposto, o Morgado da Magantinha(António Ribeiro de Faria) e o administrador Albino Leite.

Zé do Telhado resolve pernoitar em Amarante, cujo administrador, José Guedes Cardoso da Mota, fora avisado que o fugitivo passaria a noite na casa de Manuel Teixeira, do Sardoal.

Cabos de ordens, tropas de caçadores e regedores das freguesias são mobilizados em peso para a captura, cujo comando fora confiado ao regedor Alves, de São Gonçalo.

Cercaram a casa durante a noite. Mal irrompessem os primeiros raios de sol, por imposição legal, o assalto e as prisões consumar-se-iam. A mulher do dono da casa, quase de madrugada, apercebeu-se do cerco e tentou alertar Zé do Telhado, entretanto ocupado a cuidar do visual.

Nas situações mais dramáticas, o homem cofiava a barba hirsuta, ajeitava o paletó, empertigava a peitaça frente ao espelho.

Dirigiu-se a uma janela e interpelou um dos cabos. ”Quem anda aí? – as palavras de Zé do Telhado rasgaram a noite gelada. A resposta chegou e trazia mau augúrio: ”É o regedor da freguesia. Por ora não queremos nada, o que queremos será mais logo”. O foragido dirige-se para o lado oposto da casa e abre outra janela. ”Tu, que estás detrás do carvalho, sai!.. senão morres!”

Ao grito da última palavra, colou-se um tiro que aterrorizou a patroa. “Entregue-se, senhor, que eles não lhe fazem mal” – ajoelhou-se a mulher. Zé do Telhado nem ouviu. Ao nascer do dia, para surpresa geral, abre a porta de casa e aparece de peito feito. Desce os degraus e simula que se vai entregar. Em tropel, a tropa lança-se sobre a criatura. O gesto é fulgurante - recua, entra de novo em casa, bate com a porta, foge pelas traseiras, galgando um monte.

Os sitiantes seguiram-lhe no encalço. Sentindo-se perseguido, desfechou um tiro. Depois, outro. Estava morto o regedor Alves, comandante do pelotão destroçado.

A verdade histórica confronta-se, hoje, com as versões oficiais e a lenda de José Teixeira da Silva, nascido em 1818 no lugar do Telhado, freguesia de Castelões de Recezinhos, concelho de Penafiel.

Aos 14 anos, o garoto muda de ares e vai residir para casa do tio João Diogo, no lugar de Sobreira, freguesia de Caíde de Rei, concelho de Lousada. Castrador e tratador de animais, acolhe o sobrinho, interessado em aprender o ofício. Diogo tinha vida abastada e deu abrigo a José Teixeira da Silva durante cinco anos.

Agosto quente, festa da Senhora da Aparecida, 13 de Agosto, dia de folguedo geral no lugar. José Teixeira descobre o aceno de um lenço branco por detrás de uma janela, na casa onde morava.

Ana Lentina, a prima, faltara ao festim. Afogueado, o moço galga o portão e corre para os braços da prima. Um beijo subtil e cinco palavras de amor selaram uma paixão que acabaria em casamento e tragédia. Tinha 19 anos.

Pouco depois, assenta praça no quartel de Cavalaria 2, os “Lanceiros da Rainha”. Corria o mês de Julho de 1837. Rebenta a “Revolta dos Marechais”, contra o partido dos setembristas e pela restauração da “Carta Constitucional”. Os lanceiros alinham com os revoltosos, desbaratados a 18 de Setembro.

O general Schwalback, líder da insurreição, foge para Espanha e leva José Teixeira, que se distinguira em combate. A caminho do exílio, o intrépido recebe a notícia de que o tio, finalmente, abençoara o seu casamento com Ana.

Regressado com um perdão a Portugal, troca alianças a 3 de Fevereiro de 1845. A 7 de Novembro, nasce a primeira filha do casal – Maria Josefa.

Grassava no país uma revolta larvar contra o governo de Costa Cabral. O povo, ajoujado a impostos e arbítrios, aproveita a publicação da “Lei de Saúde Pública”- que proíbe os funerais nas igrejas e impõe aos cadáveres um exame por mandatários do governo, em detrimento dos cirurgiões locais – e amotina-se por todo o Minho contra as “papeletas da ladroeira”.

Estala a 23 de Março a “Revolução da Maria da Fonte”, liderada por mulheres. As quatro cabecilhas da revolta são presas dois dias depois, mas o rastilho espalha-se a Trás-os-Montes.

Há soldados que desertam para o lado dos insurretos. Chaves adere, depois Póvoa de Lanhoso, Vila Real, Guimarães. Centenas de revoltosas são presas pelos soldados e libertadas por companheiras.

José Teixeira foi o líder militar da insurreição, à qual aderiram pés descalços e o General-Visconde de Sá da Bandeira, às ordens de quem fica o sargento Silva. Logo se distingue na expedição a Valpaços.

Os actos de bravura, despojamento, apurado instinto militar, num combate que perdeu, valeram-lhe a mais alta condecoração que ainda hoje vigora em Portugal: a ” Ordem da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito”.

O pior viria depois.

Derrotado, aconchega a condecoração, tira as divisas de sargento e voa como um pássaro para os braços da mulher e dos cinco filhos. Os vencedores atacaram a canalha. José Teixeira é perseguido, atola-se em dívidas por impostos que não consegue pagar e é expulso das Forças Armadas.

Não há quem lhe dê ofício, a todas as portas bateu – todas se lhe fecharam.

Assim nasce o Zé do Telhado que faria lenda.

Nesse tempo, Custódio, o “Boca Negra”, capitaneava a maior quadrilha de bandoleiros que aterrorizou as duas beiras em 1842. Conhecia, de gingeira,as façanhas militares de José Teixeira.

Ferido num dos assaltos, “Boca Negra” leva Teixeira a um casario meio abandonado onde se acoitava o bando. Apresentam-se à luz da vela - o “Tira-Vidas”, “O Girafa”, o “Sancho Pacato” o “Veterano” e o “Zé Pequeno”. Para o assalto do dia seguinte, “Boca Negra”, o líder ferido, informa a quadrilha que José Teixeira o substituiria no comando.

A bola de neve cresceu, imparável.

Zé do Telhado faz e reorganiza quadrilhas, ganha fama de generoso e audaz pelas vítimas que escolhe para os assaltos e o destino do dinheiro ou das jóias – os desgraçados com que se cruzava e, antes de tudo, a “ minha rica mulher e os queridos filhinhos”, como os viria a chamar, mais tarde, ao companheiro de prisão Camilo Castelo Branco.

A fama do bandoleiro atravessa o país. O temido Zé do Telhado emite, aos que estimava, um salvo conduto com a sua assinatura e esta informação:

” O portador deste salvo-conduto pode passar livremente e mando que o ajudem quando for preciso”.

Com as autoridades no seu encalço por todo o país, mil vezes o cercaram, mil vezes se escapuliu o tenebroso. Vendo-se perdido, decide fugir para o Brasil. Escondeu-se na barca “Oliveira”, acostada no Porto, onde lhe dera guarida nos últimos três dias Ana Vitória, uma das suas vítimas que passou a idolatrá-lo e sobre quem disse haver pessoas “de bem que nunca deram às classes humildes um centésimo do que lhes deu Zé do Telhado.” Desarmado e a horas de zarpar, Zé do Telhado é preso no esconderijo, a 5 de Abril de 1861.

Às dez da manhã do dia 25 de Abril, começa no tribunal de Marco de Canaveses o julgamento de José Teixeira da Silva.

No dia 27, às duas da madrugada, o júri, presidido pelo juíz António Pereira Ferraz, considerou Zé do Telhado culpado da prática de doze crimes. Roubos, um homicídio, organização de quadrilha de assaltantes e a tentativa de evasão sem passaporte.

“Condeno o réu José Teixeira da Silva da freguesia de Caíde de Rei, comarca de Lousada, na pena de trabalhos públicos por toda a vida na Costa Ocidental de África e no pagamento de custas” – assim determinou o tribunal.

O julgamento, sabe-se hoje, foi uma farsa. Uma consulta, ainda que superficial, a todos os documentos oficiais que constam no Tribunal da Relação do Porto e no Arquivo Distrital do Porto não deixam qualquer margem para dúvidas.

Alguns dos membros das quadrilhas chefiadas por Zé do Telhado foram arroladas pela acusação e safaram-se. Morgados, padres, administradores e regedores que tinham cometido os mesmos crimes do réu nunca seriam acusados ou perseguidos.

Várias testemunhas de acusação nada viram, de tudo souberam por terem ouvido.

Consta do processo que António Ribeiro, pedreiro, ”ouviu dizer que fora o querelado José do Telhado a roubar”. Alexandre Nogueira, comerciante, “não sabe que armas feriram o regedor se as do querelado se as dos sitiantes”. António da Silva, lavrador, “soube pelo ouvir dizer do padre roubado que o Zé do Telhado fora um dos que penetrara dentro da casa armado e isto tem ouvido ao povo”. Manuel de Sousa, lavrador, disse que “ sabe por ser bem público que tivera lugar o roubo de que se trata no dia pela forma que nos autos se declara”. Timóteo José de Magalhães, lavrador, “ disse que sabe pelo ter ouvido ao povo que tivera lugar o roubo de que se fala nos autos”. Francisco Moreira da Cunha, lavrador, “ouviu dizer e ser público e notório que o réu José Teixeira e o irmão estavam para embarcar para o Brasil”.

Só um tiro sairia pela culatra à acusação. Francisco António de Carvalho, lavrador, afirmou que “ o Zé do Telhado pagava crimes que não tinha cometido e ouviu dizer que se havia combinado com o administrador do concelho para imputar os dois crimes de roubo ao Zé do Telhado”.

Os quadrilheiros nobres evadiram-se para o Brasil, como sucedeu com o padre Torcato, ou colaboraram com a acusação, a troco da ilibação. O historiador Campos Monteiro analisou os autos e emitiu um parecer a este respeito:

“ É de crer que nesta altura se movimentassem altas influências tendentes a ilibar estas parelhas de bandidos engravatados. O facto é que saíram em liberdade. E é natural que o administrador, ao mesmo tempo que os inocentava, procurasse aproveitá-los ”.

O caso da ilibação do Morgado da Magantinha está igualmente documentado nos autos. Após a fuga do padre Torcato, a acusação subornou a testemunha António Eliziário que, perante o juíz, afirmou saber que “Margantinha foi um dia convidado pelo padre Torcato a ir ter à capela de Santa Águeda e, indo ali, o encontrou com alguns membros da quadrilha e quatro bois roubados”, pedindo-lhe “ o padre que tomasse conta dos bois para os vender, mas o Margantinha recusou-se”.

A verdadeira história do mito Zé do Telhado está mal contada, a começar pela data de nascimento que lhe é atribuída – na campa aparece 1815, em vez de 1818 – e culminando no julgamento relâmpago que durou menos de dois dias úteis.

Foram subtraídas testemunhas indispensáveis, promovidas declarações falsas e adulterados os critérios de escolha dos jurados. Em vez do sorteio, foram escolhidos a dedo conhecidos inimigos de Zé do Telhado. Condenado ao degredo, José Teixeira da Silva desembarcou em Luanda, seguindo para Malange, onde viveu cerca de um ano.

Palmilhou cada légua das terras da Lunda.

Fez-se negociante de borracha, cera e marfim.

Casou-se com uma angolana, Conceição, de quem teve três filhos. Cresceu-lhe a barba, até ao umbigo.

Era, para os angolanos, o “quimuêzo” – homem de barbas grandes.

Viveu desafogado, financeiramente. As saudades da mulher e dos cinco filhos levaram-no mais cedo.

Morreu, moído de remorsos, aos 57 anos.

Sepultado na aldeia de Xissa, a meia centena de quilómetros de Malange, os negros ergueram-lhe um mausoléu.

Hoje, fazem-se romagens à campa do mito.

Os anciãos de Malange dizem que, embora fosse um homem austero, tinha um grande coração e nunca deixava cair um pobre.

P.S.1

O julgamento de Zé do Telhado iniciou-se em 25 de Abril de 1859, com acusação pública em 9 de Dezembro do mesmo ano. Foi condenado na pena de trabalhos públicos por toda a vida, na costa ocidental de África e no pagamento das custas. Esta pena foi mantida pelo Tribunal da Relação do Porto, cujo acórdão de sentença substituíu a expressão "costa ocidental de África", por "Ultramar".

Por acórdão da mesma instância, foi comutada a pena aplicada na de 15 anos de degredo para a África Ocidental, que contou desde a data de publicação do Decreto de 28 de Setembro de 1863.

A condenação deu como provados os seguintes crimes: tentativa de roubo, na forma tentada, em casa de António Patrício Lopes Monteiro, em Santa Marinha do Zêzere, comarca de Baião, homicídio na pessoa de João de Carvalho, criado de Ana Victória de Abreu e Vasconcelos, de Penha Longa, Baião, roubo na casa de referida senhora (Casa de Carrapatelo) de objectos de ouro e prata no valor de oitocentos mil e um conto de reis e algumas sacas com dinheiro, cujo valor a queixosa calculou em doze contos de reis, ainda que revelasse desconhecer os montantes visto que o dinheiro se encontrava na casa mortuária onde jazera, poucos dias antes, seu pai, e, após isso, ela ainda nem sequer lá voltara a entrar, roubo em casa do Padre Padre Albino José Teixeira, de Unhão, comarca de Felgueira, no valor de um conto e quatrocentos mil reis em dinheiro e ainda objectos de prata e outro, outro homicídio na pessoa de um correligionário, ferido num confronto com as autoridades.

Para além de outros crimes de roubo e de resistência à autoridade, foi também condenado como autor e chefe de associação de malfeitores e de tentativa de evasão do reino sem passaporte, com violação dos regulamentos policiais.

P.S.2

Este texto será publicado num semanário de circulação nacional, cujo director me autorizou que fosse dado em primeira mão a este jornal.

Na foto à direita, Zé do Telhado.
http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=1603
Imagem: http://a151.ac- images.myspacecdn.com/images01/11/m_606dedd5ab31f05831aa50dcb56f294e.jpg
Gil Gonçalves

Discursos Políticos (FIM). Agostinho Neto


Eu não fiquei contente, por exemplo, que nós estivéssemos a discutir problemas dos funcionários da OUA. Eu não gosto dos funcionários. Gosto mais dos combatentes. Mas o que é certo é que estivemos a discutir problemas dos funcionários. E isto foi um desprazer para muita gente, para muitos chefes de Estado.
Se nós continuarmos a consentir que o nosso Partido, o nosso Governo, tenha uma predominância de elementos da pequena burguesia, ou influenciados pela pequena burguesia, o que vai acontecer daqui a dois ou três anos? O que vai acontecer é que nós vamos mudar de orientação com as mesmas palavras de ordem, não cumprir aquilo que foi determinado pelo nosso Congresso e nós voltaremos a uma fase de capitalismo não confessado.
Nós não temos em Angola uma burguesia com poderes. Não temos, mas podemos ter no futuro, se não tomarmos cuidado.
Agostinho Neto. 27 De Julho de 1979. Discurso na cidade do Lubango.

Será que o Socialismo será manter populações sem habitação condigna, sem serem alfabetizadas, sem ter os liceus, os estádios, sem ter a possibilidade de desenvolvimento para as crianças, sem ter a necessária condição para a mulher poder trabalhar e criar os seus filhos?
Eu penso que ainda estamos muito longe do Socialismo. Socialismo para nós é uma intenção não é ainda uma realidade.
Quando não houver classes que se estejam a explorar umas às outras; quando não tivermos dentro do País um grupo ou vários grupos de pessoas a quererem ter mais vantagens do que os outros.
Nós diremos que estaremos a construir o Socialismo quando tivermos a paz. Quando for possível termos a paz.
E houve uma promessa de toda a população no sentido de acabar com o analfabetismo dentro do prazo o mais curto possível.
Isso é importante para a aquisição de ideias, para aprender as ciências, para aprender no futuro a governar o nosso País.
Nós não queremos cópias de outros países. Temos que organizar o nosso próprio País de acordo com as condições que aqui existem. Não queremos cópias, porque não podemos viver de cópias. Vamos, sim, aprender tudo aquilo que existe no Mundo e que seja útil para o nosso Povo. Vamos aprender todos os dias; pedir conselhos. Mas não copiar mecanicamente porque isso seria contraproducente.
Agostinho Neto. 18 De Agosto de 1979. Discurso em Malanje.

E a situação financeira depende de quê? Depende da nossa produção. Nós não podemos viver de importações, estar a importar sempre, pagando àqueles que nos vendem; precisamos nós de realizar os bens necessários para o nosso Povo.
Ainda temos problemas com a burocracia, com a burocracia que existe no nosso País e que se preocupa muito com os papéis – muitos papéis, muitos relatórios, muitas palavras e poucas obras. Temos de fazer com que o Partido corrija essa situação em cada província, em cada área do nosso País. Não podemos viver somente da burocracia, não podemos viver de papéis, de palavras, temos de viver dos actos!
E por não terem servido, eles foram afastados e o que acontece nessas situações é o seguinte: cada um que se sente afastado, pensa sempre na sua vingançazinha, pensa que é o homem ou a mulher mais importante do país e portanto pensa na sua vingançazinha.
A Revolução vai continuando, a revolução vai triunfar. Alguns de nós podem desaparecer. Alguns de nós podem ser liquidados na primeira esquina., mas a revolução vai continuar.
Agostinho Neto. 19 De Agosto de 1979. Discurso em Malanje.

Não se pode pensar na organização do País sem o Partido.
É evidente que nem todos podem pertencer ao Partido, nem todos têm a capacidade, nem a vontade e não é necessário obrigar cada um a pertencer ao Partido.
Agostinho Neto. 22 De Agosto de 1979. Discurso na cidade do Uíge.


Perguntam se o país é viável. Será? E o que é “um país viável?” Deveremos também perguntar se o seu povo é viável? Se os indivíduos desse povo são viáveis? Um índio é viável? Um americano é mais viável que um índio, ou que um negro? A República Sul-Africana é viável?
Trata-se de realidades e não de eventuais viabilidades. Os minúsculos Luxemburgo, Liechtenstein ou Mónaco são muito menores que a Guiné-Bissau, e existem, prosperam. O próprio conceito de viabilidade mostra a que ponto a economia como ciência e como sistema produtivo se distanciou de seus objectivos iniciais, que eram responder às necessidades da população.
Ladislau Dowbor Guiné-Bissau. A busca da independência económica. Editora Brasiliense-1983

Meditando. Angop


Angop-Agència AngolaPress


IV Conselho Consultivo

Inovar Para Melhor Servir

26 E 27 de Julho 2008

Gil Gonçalves

Pagãos


Os Petrofamintos finalizaram a inaptidão da religião da vida interior. Deus expandiu o céu e a terra, depois contratou o Demónio para criar o Homem. Por isso: os animais selvagens vivem nas cidades, os animais civilizados nas selvas. Aperfeiçoam utensílios, inventam, renovam descobertas. Surgem novas doenças, novas epidemias. Rematam-se cada vez mais, com novas armas.

Alarmado, certifico que não evoluímos: fabricamos os filhos conforme preceituado na antropologia física. Não alterámos: beijamo-nos e acariciamo-nos antropologicamente. Não há nada de novo no ovo cósmico.

Desbravadores do roubo e da morte, inicio e fim do idealismo subjectivo. Então, que utilidade tem o ser humano? Nascer, destruir, matar. Um louco manso apelidou-o Homo sapiens. O nome correcto é: Homo Credo quia absurdum, (Homem creio por ser absurdo).

Deus é a imaginação do Homem. Só existe quando necessário, aparece e desaparece. Sempre fomos e seremos pagãos. Falta-nos coragem para o confessar.
Gil Gonçalves

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Cultura Tradicional Bantu (IX)


Nalguns grupos, separam os que morreram de morte violenta, guerra, acidentes, homicídio, suicídio. Formam um grupo de antepassados muito poderoso. Deambulam pelas florestas e pelas margens dos rios. Os Bacongos chamam-lhes «bankita». Podem aparecer na forma de espectros brancos, embora também tomem a forma de morcegos e pássaros – moscas. Temem-nos e a sua missão é de mau agoiro.

Em alguns grupos, crêem que se podem transformar em génios com localização transitória nas águas ou nos bosques.
Certas tradições afirmam que, que, depois de um certo tampo, há uma selecção na aldeia dos mortos. É a segunda morte. Aqueles a quem os parentes deixaram de oferecer sacrifícios, cuja recordação se esfumou na memória dos homens e cujas obras não testemunham um passado glorioso, morrerão pela segunda vez e partirão para uma aldeia situada no mais profundo da terra…

Alguns grupos não-bantus do Senegal, os Sereres e os Diolas, crêem no renascimento dos mortos. «Depois duma permanência mais ou menos prolongada no além-túmulo, ou imediatamente depois da morte, ou inclusivamente antes de morrer… a alma reencarna numa criança ou num feto».
Os Dogons e Bambaras admitem a reencarnação admitem a reencarnação nas crianças, que recém o seu nome e divisa, e aos Saras do Chade não lhes repugna o avô reencarne no neto.
Na Rodésia, os mortos podem escolher reencarnar numa rapariga ou num rapaz. Assim, morrer é um meio de mudar de sexo para as almas desejosas de novas sensações».

J.S. Mbiti assegura que os Sondjos da Tanzânia são o único grupo negro-africano com uma noção sobre o fim histórico do mundo. Um mito escatológico afirma que, ao chegar esse momento, o Sol cobrir-se-á de trevas por efeito duma nuvem de pó, dum enxame de abelhas e dum bando de pássaros.
O fim chegará no mesmo instante em que dois sóis, surgidos do este e do oeste, se encontrarem no zénite. Então Khambagen, o herói do povo Sondjo, descerá à terra para salvar o seu povo. O resto da humanidade será aniquilada.
Ignora-se como este se tenha formado. Este autor assegura que «no estado actual das pesquisas não pode ser atribuído à influência cristã dos tempos modernos».

Os Bandas pensam que a pele dos antepassados é branca; daí a ideia, em certos países, de que os europeus eram antepassados. Segundo os Manjas, têm o corpo coberto de longos pêlos brancos, a cabeça como um punho, sem dentes, os olhos sobre o peito, a voz fanhosa; alguns só têm um pé e outros não têm cabeça».
Entre os bantus do Sudeste e Nordeste está muito espalhada a crença de que se transformam em serpentes; por isso, alimentam-se, nunca as matam e quem come a sua carne quebra um tabu. Os Kikuyus «têm verdadeiras associações de adoradores de serpentes relacionadas com a estação das chuvas e com o arco-íris. Os Massais crêem que só os ricos e os curandeiros sobrevivem sob a forma de serpentes que vêem visitar as crianças a casa e as alimentam com leite. Cada família conhece as suas próprias serpentes de cores diferentes».

Os Bacongos situam-nos em aldeias subterrâneas, maza». A cada aldeia de vivos corresponde outra de antepassados equiparada à que aqui deixaram. Falam dum «lugar, dum mundo inferior». Os ruandeses dividem o mundo em três andares: «O andar do meio é constituído pela terra que habitamos. Debaixo da terra, está o mundo abissal, habitat dos “bazimu”… Por cima da terra está situado o andar superior o andar superior ou Céu… habitat de Deus».
Outros grupos pensam que vivem em regiões inóspitas, nas selvas, em grutas ou num «lugar subterrâneo, sombrio e taciturno, sempre triste, onde não é agradável viver», embora de modo nenhum seja uma prisão, um lugar de castigo ou um cárcere, visto que podem visitar e até habitar bosques, estatuetas, cavernas, árvores, rochas, lagoas, colinas e pessoas.

Podem-se encontrar explicações naturais para tudo, mas é necessário encontrar também explicações de ordem sobrenatural. As pessoas precisam de bodes expiatórios para explicar os seus sofrimentos…
As frustrações, as desordens psíquicas, as tensões emocionais e outras manifestações da personalidade profunda são imediatamente exteriorizados e projectados num ser humano ou em circunstâncias que deitam as culpas sobre um agente exterior.

Na realidade, respondem à instituição e normas sociais e às aspirações do bantu, mas a causalidade mística deturpa e empobrece, tornando os «africanos brutais, demolidores e hostis».
Os bantus, como todos os humanos, são capazes do bem e do mal. Mas é pena que a causalidade mística e o poder omnímodo da magia impossibilitem de concretizar as aspirações de harmonia-paz que a cultura bantu persegue como o valor mais precioso.

In Cultura Tradicional bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Edições Paulinas
Gil Gonçalves
Imagem: http://www.macua.org/livros/olhar1np.html

Especuladores Imobiliários, Falsários


e Outros Empresários

É nacional, é neocolonizado, eu gosto!
Idi Amin… sempre presente!

Encaro com mágoa imensa
Neste mundo a excepção
Até nos cães há diferença
Uns vivem bem outros não
António Aleixo

Tantos e tantos partidos políticos para as eleições. Mais parece o mercado Roque Santeiro

Todos os aventureiros mundiais aprontaram as proas das suas naus e rumaram, neocolonizaram para estas praias deliciosamente petrolíferas. Francis Drake, Capitão Kid, Fernando Cortez, Francisco Pizarro, Capitão Morgan, Zé do Telhado e os seus comunistas/comodistas. Capitão do mato Lampião, a dinastia Fu-Manchu, a quadrilha Jesse James, Billy the Kid, Ponce de Leon. Mais chegarão, retornarão.

Já se juntaram, reuniram ao local Torquemada. Preparam uma saborosa ementa: ser humano no espeto e espetadas, estrondos à la Iraque, sobremesa à la Mugabe e corpos estufados à la Idi Amin. Todos no rodopio, na busca das misteriosas cidades perdidas do ouro negro.

E os idiotas locais já não são tratados como indígenas estrangeiros. Evoluíram… agora são índios. Para que a História se repita, e se respeite, estes índios serão, já são espoliados das suas terras e escravizados nas minas antes nacionais, agora internacionais, e finalmente exterminados. Estão agora na fase do esgotamento físico e psicológico. Levantam-se ás três, quatro da manhã, não dormem, e lá vão escravos neste mais que perfeito campo de concentração petrolífero.

Um comunista, não é, é comodista desses arribados, perguntou-me maliciosamente se não concordava que o Estado devia nacionalizar outra vez as empresas. Respondi-lhe que não, que já tínhamos passado por essa fase medieval. O homem voltou-me as costas com desprezo e desandou rápido. Nunca mais o revi.

Outro comunista, não é, é comodista arribado, repartia os bens só para si. Lá andou para a sua terra. Deixou-me o carro que lhe paguei, éramos amigos, ou parecíamos, mas o carro estava podre, bom para o lixo. Engraçado é que o gajo exercia funções de presidente de uma associação muito conhecida, a qual por ora omito o nome, por motivos de segurança pessoal.

Comunista/comodista é como a seita Testemunhas de Jeová. Comunista é o tipo de pessoa que complica, incendeia o já muito complicado. É como um exterminador de baratas. Mas, porque será que todos, ou quase que aqui naufragam são comunistas? Comodistas!
Gil Gonçalves


Uma das consequências da falta de liberdade é o subdesenvolvimento económico, científico, técnico e cultural. Os países explorados tornaram-se economicamente débeis e em muitos casos, lançados numa situação caótica que os obriga a retomar ou a continuar a sua dependência dos outros países mais desenvolvidos.
Libertar é transformar pela violência uma ordem social estabelecida por minorias. E por isso mesmo libertar uma sociedade, é fazer a revolução. É preciso libertar o Homem não só do esclavagismo colonial, mas ainda de qualquer forma de dominação social no interior de cada país. Nenhuma classe deve poder explorar outra.
Agostinho Neto. 20 De Janeiro de 1978. Discurso na Universidade de Ibadan, Nigéria


Imobiliário
Maianga e Ingombota são os bairros mais caros de Luanda
23.06.2008 - 18h51 Lusa
Os bairros da Maianga e Ingombota são os mais caros de Luanda, com preços por metro quadrado próximos de 5.760 dólares (3.715 euros) para apartamentos, revela um estudo da consultora imobiliária angolana Proprime.

O estudo, hoje publicado pelo Jornal de Angola, indica ainda que na Maianga o preço de um apartamento de cinco assoalhadas ascende a três milhões de dólares (1,94 milhões de euros), enquanto um de três assoalhadas situa-se entre 645 mil euros (220 metros quadrados) e 500 mil euros (165 metros quadrados).

No bairro da Ingombota, um apartamento de cinco assoalhadas (223 metros quadrados) custa 838 mil euros, enquanto um de duas assoalhadas (64 metros quadrados) ronda os 245 mil euros.

Já em Luanda Sul, o valor de mercado de um apartamento de duas assoalhadas (57 metros quadrados) ronda os 249 mil dólares (160 mil euros) e o preço de um de cinco assoalhadas situa-se acima do milhão de dólares (645 mil euros).

Em Viana e na Camama, um apartamento de duas assoalhadas custa pouco mais de 200 mil dólares (129 mil euros), com o preço a subir para 285 mil dólares (184 mil euros) tratando-se de três assoalhadas.

Enquanto na Ingombota o preço do metro quadrado atinge 5.760 dólares (3.715 euros), no Camama fica-se por 3.300 dólares (2.128 euros).

De acordo com o Jornal de Angola, o estudo indica que nalguns casos os apartamentos chegam a ser mais caros do que vivendas com a mesma área.

O governo angolano afirma que o mercado imobiliário do país está a ser afectado por especulação, que pretende combater com uma revisão legislativa e do sistema tributário e através de um programa de fomento habitacional.

Segundo um estudo recente da consultora imobiliária Worx, a subida de preços tem vindo a ser sustentada pela procura por parte de empresas e expatriados, devido ao intenso crescimento económico do país, conjugado com a escassez de espaços de qualidade e tendência para concentração na capital.

"Porém, ainda se verifica a inexistência de espaços de qualidade, embora já existam planos a curto e médio prazo para inverter esta situação", lê-se no estudo da Worx, que adianta ser o mercado de escritórios "ainda bastante especulativo".

No segmento industrial, "a procura por espaços tem aumentado, especificamente nas zonas contíguas a área portuária", para onde está planeada a construção de "elevado número de novos edifícios", e no mercado residencial "não têm sido desenvolvidos novos projectos, excepto os espaços destinados aos colaboradores das empresas relacionadas com o petróleo".

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23.06.2008 - 19h32 - vitor pereira, guimaraes
As pessoas devem andar loucas conheço Luanda cidade como as palmas das maos antes e após a indepêndencia, actualmente não tem nada a ver com as grandes cidades modernas do mundo como por Exp: o Dubai que felizmente também conheço prefeitamente as habitações classe média não custam um terço do que custam em Luanda já agora gostava de saber de que matéria prima são feitas as construções em luanda para valerem assim tanto dinheiro lembrem-se que o Dólar e o Euro não são Zuanzas só mesmo de loucos

In
http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1333322
Imagem: especulação imobiliária em Luanda.







Discursos Políticos (VIII). Agostinho Neto


Nós não temos ainda a garantia suficiente de alimentação para todos os trabalhadores, não temos ainda garantia suficiente de habitação para todos os trabalhadores.
Temos, por exemplo, um problema que – creio que todos o discutem hoje – que é a relação entre o salário e o custo de vida. O custo de vida está elevado. Os salários, por vezes, não cobrem o orçamento familiar e nestas circunstâncias há flutuações no trabalho. Nem sempre os trabalhadores se conservam no seu posto, porque procuram melhores condições, porque procuram viver cada vez melhor e é justo que assim seja.
Porque é que os preços são altos? Todos nós sabemos porquê. Há falta de géneros no mercado, há uma produção insuficiente e aqueles que detêm alguma coisa procuram ganhar o máximo. Isso obedece perfeitamente às leis da economia. Quando há falta os preços sobem.
Mas não é só isso. Há também a desonestidade de alguns, que não põem à venda tudo aquilo que têm para oferecer ao público, não oferecem ao comprador tudo aquilo que está no seu armazém. Fazem o seu açambarcamento para vender em locais especiais e a pessoas especiais. Este facto faz com que rareiem ainda mais os produtos no mercado.
Que cada província faça o possível para poder garantir a alimentação e o bem-estar dos cidadãos da sua província.
Estamos neste momento com problemas sérios quanto à educação das crianças, dos jovens e dos adultos e a questão é simples. É que não temos professores em número suficiente.
Temos que evitar que os jovens, em vez de trabalhar, irem – como direi – para as farras, em vez de estudar irem para as farras.
Mas não é só o desporto. É preciso pensar na construção ideológica do nosso Povo, na construção material, na construção económica e social do nosso Povo, porque sem isso nós estaremos a edificar qualquer coisa de falso, sem alicerces.
Eu tenho a certeza absoluta de que o nosso Povo, dentro de alguns anos, poderá gozar de condições melhores, muito melhores do que aquelas que nós temos hoje, apesar dos progressos já feitos.
Agostinho Neto. 1 De Maio de 1979. Discurso do acto central do 1º de Maio.

Medidas em que sentido? No sentido de nós podermos honestamente realizar a nossa Revolução. Honestamente! Não temos que enganar ninguém.
Camaradas, o que é que nós estamos aqui a fazer para a produção? O que estamos aqui a fazer para que o Povo tenha a comida, tenha medicamentos, tenha casas, tenha escolas, tenha assistência médica? O que é que nós estamos a fazer?
O nosso Governo e o nosso Partido precisam de dar mais atenção aos problemas do Kuando Kubango. Vamos trabalhar mais aqui. Alguns ministros do nosso Governo vão ter de aqui ficar para resolver os problemas das populações. Ficarão um, dois, três meses.
Nós não resolvemos os problemas das populações. Não há roupa, não há escolas, não há hospitais. Nós vamos até ao Rivungo e não há nada. Há mosca do sono.
Porque não é possível camaradas, trabalhar com uma segurança que oferece dúvidas acerca da protecção, aos nossos compatriotas e tem hesitações quanto à nossa política de clemência.
Quantas pessoas, hoje, se queixam da DISA? Justa ou injustamente… Mas queixam-se. Não há nenhuma semana que eu passe sem receber cartas de famílias a dizer que «o meu filho desapareceu». Depois, camaradas, eu não sei o que vou responder. O que é que eu hei-de dizer? Eu é que sou o responsável. Quando desaparece um filho, um pai, um avô, uma mulher, um cunhado, etc., eu é que sou o responsável. E o que é que eu vou dizer? Alguns que estão nas cadeias estão muito bem lá; é melhor estarem lá do que cá fora. Mas nem todos… Precisamos de resolver esta situação. Temos de ver bem como é que a nossa segurança vai trabalhar no futuro.
Pretendemos resolver a partir de Luanda muitos problemas mas não é de Luanda que nós podemos resolver os problemas do Kuando Kubango.
Agostinho Neto. 26 De Julho de 1979. Discurso na cidade do Menongue.
Gil Gonçalves

terça-feira, 24 de junho de 2008

Graça Campos








Graça Campos, jornalista e director do Semanário Angolense

Não é possível imaginar um mundo sem jornalistas. Eles criam, dão vida - e também a perdem - à informação.

Gil Gonçalves

Imagem rio Kwanza:
http://nkhululeko.blogspot.com/2006/06/rio-kwanza-varanda-do-mangais-angola.html

Imagem foto, Graça Campos, director do jornal Semanário Angolense.
http://www.multipress.info/viewnew.php?id=339

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Impressão Sol Nascente


Está tudo errado e contudo persiste-se no erro.

A tuberculose galopante inscreveu-se no quadro das epidemias. No hospital, os lugares disponíveis são indisponíveis.
Apesar de alguns novos focos, a cólera, dizia-se, já não assustava. A equipa médica afirmou que seria extinta nos próximos cinco anos.

Este, é mundo de dinossauros, seres de pedra com mentes de fontes incoerentes, que inutilizam a validade da luz natural, cerebral. Ocos de linha dura… anzolam-nos na sua demência. Prescrevem-se choques nos tecidos tenebrosos mas, os encéfalos teimam que dependemos da inutilidade deles… perfeccionistas da lei de Murphy. Carentes, crentes no poder vitalício permanecem esqueléticos até à morte, a desordenar. Desusam o sentimento de culpa, não antecipam formação de jovens substitutos. Enfadam-se na criação de empregos, nas oportunidades à massa cinzenta rejuvenescida. As pontes desabam, a do poder não.

O homem mais poderoso, e o homem mais fraco não têm a mesma importância. O homem mais fraco é mais importante, porque a qualquer momento derruba o homem mais poderoso.

O meu melhor amigo é o silêncio do odor da santidade florestal embalsamado, dos lamentos confessados, convictos. Os meus inimigos são os outros quatro cavaleiros do apocalipse: os especuladores imobiliários, o advogado, o médico, e o agente funerário. Mas, o meu maior receio é ser queimado por heresia.
Acreditamos, defendemos resoluções, revoluções, e depois deixamo-nos arrastar na correnteza da odienta pobreza

Educaram-me, ensinaram-me, reeducaram-me que a civilização Ocidental é superior. Mais tarde descobri com sorrisos solitários, o quanto estava lesado. Não produzi estátuas, ou outras obras de arte, porque a minha beleza, o purismo das minhas formas, são renascimentos para os artistas amantes dos superiores primitivismos. A minha civilização é inferior na tecnologia, mas é superior na minha impressão de sol nascente.

Gil Gonçalves
Imagem: Monet, Impressão Sol Nascente
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A Mulher Perfeita

In devaneios-adrianna.blogspot.com

sábado, 21 de junho de 2008

Lírio do Amazonas. Capoeira


Aqui no Brasil temos uma influência muito forte da cultura africana, de diversos grupos étnicos e pelo que li devemos ter também influência dos bantus – há alguns ritos que me lembram a umbanda (uma mistura de religião, ou crença, sei lá o que difere uma da outra...).

Eu bem tentei me infiltrar na cultura negra... fui fazer umas aulas de capoeira com um mestre para lá de exigente, também na intenção de dar aos meus filhos o convívio com a diversidade da nossa cultura. Dei o exemplo, participei de tudo, aquecimento, atabaques, berimbau (desajeitadamente), pandeiro, cantei meio insegura a repetitiva letra – quase um mantra africano para embalar a luta-dança.

No meio do caminho meus filhotes desertaram... envolvida pela roda de capoeira gesticulava para que entrassem novamente, me retorci toda em golpes jamais imaginados... e meus filhotes gritavam de fora da roda: “vai mamãe, não pode parar..." Fiquei duas semanas rindo com dor... sentia os músculos do meu corpo como se imaginasse que jamais existiriam... Desisti... nas demais vezes fui para assistir ao espetáculo de quem tem a capoeira no sangue!

Patrícia Martinelli






Cultura Tradicional Bantu (VIII)



Os cemitérios e as sepulturas ocupam um lugar central na vida comunitária. Os antepassados estão neles presentes, deles brota a causalidade mística que fortifica ou debilita; através deles se robustece a solidariedade vertical. São também lugares que inspiram temor, onde o receio e o mistério permanecem.
O luto pelos mortos começa depois do enterro. As mulheres costumem pintar a cara com riscas pretas, cortam o cabelo ou soltam o penteado e até rapam todo o cabelo.

O luto obriga sobretudo os cônjuges dos falecidos, que têm de despojar-se de vestidos luxuosos e cobrir-se de panos humildes. É normal que as mulheres tragam o tronco descoberto, porque se trouxessem um vestido normal, o defunto poderia reconhecê-las e atormentá-las. Para não sonhar com ele, nalguns lados, trazem dia e noite uma faca na mão.

Não podem acompanhar o cadáver à sepultura e ficam sujeitos a inúmeros tabus. Por exemplo, não podem tocar no fogo, fumar, cortar lenha, peneirar a farinha, acarretar água, ir para as lavras, comer com outros. Aquilo em que tocar tornar-se impuro e com o perigo do tabu.
A sua alimentação fica limitada e também os seus movimentos. Costumam ficar retirados onde recebem as visitas dos familiares e a comida.

Não podem cozinhar e as proibições sexuais são taxativas. Procuram evitar assim a contaminação impura do defunto, pois conservam, mais que qualquer outro, o «cheiro do morto».
Em certos grupos, a viúva, antes de se unir a um novo marido, o que pode demorar de um a três anos, deve limpar a sua impureza relacionando-se sexualmente com um parente próximo do marido falecido. Noutros grupos, tem de seduzir um desconhecido, que ignore o tabu, e carrega com a impureza da mulher. Se descobrir a cilada, o adivinho submetê-lo-á a ritos purificatórios.

Devem falar pouco, aparentar tristeza e chorar de vez em quando, até que o luto rigoroso termina com ritos purificatórios que começam com um banho lustral no rio. Entregam-lhes vestidos novos e os instrumentos para o trabalho. Costuma intervir o adivinho aspergindo-os.
Estes ritos conseguem «curar» os efeitos do contágio e fortificam a sua vitalidade talvez debilitada pelo contágio com o defunto. Simbolizam isso com uma fogueira acesa depois do banho, que «aquece» (revigora).
Quando regressam do rio, os parentes oferecem-lhes uma refeição que simboliza a certeza de que não intervieram na morte e, com o significado de um ágape, reintegram-nos na comunidade. A solidariedade entre os dois grupos, que selaram a aliança matrimonial, fica robustecida.

Os banhos lustrais pretendem também assegurar à viúva um futuro casamento feliz.
Entre os Humbis, a água lustral leva cinco ingredientes: uma unha de galinha, casca e pedaços de certos arbustos que darão ventura ao novo casamento, pés duma erva cuja interpretação seria: «O marido disse: fui-me embora; tu podes contrair novo matrimónio.» Por fim, outra casca de árvore que significa: «Esta pobre mulher teve pouca sorte; é preciso agora afugentar o mal que a atormentou.»
A adivinha, que ritualiza a purificação, entrega-lhe pequenos enfeites e uma enxada. Marca com giz branco a viúva desnudada no peito, frente, ventre e braços. Derrama-lhe água lustral e lava-lhe com ela o corpo, até a língua. Por fim, bebe uns goles enquanto a adivinha vai pronunciando palavras mágicas que vivificam o rito. Depois simula um acto sexual.

Por fim, a adivinha recolhe toda a imundície do corpo, depois de lho esfregar com pós vegetais, amassa com isso uma bola que enterra longe das casas. O luto e os tabus ficaram sepultados. A viúva pode recomeçar a vida.

Um dos mais típicos é o herói Lyangombe, venerado em muitos grupos da África Central, embora seja de criação ruandesa. Filho e herdeiro do rei Babinga e caçador apaixonado, saiu um dia à caça contra a opinião de sua mãe que tinha presságios funestos. De facto, morreu à luta com um búfalo. Antes, tinha encarregado o seu criado de comunicar a sua mãe que ia para os vulcões para reinar sobre os mortos como tinha reinado sobre os vivos. Transformou-se num herói a quem rendem intenso culto.

Os membros da seita «Ababandwa» intentam, por uma íntima comunhão com o herói entrar, «numa família divina, numa esfera superior ad aexistência… Pode-se assegurar que é um semideus, subordinado ao grande deus Imana».está no vértice da família real ruandesa.
In Cultura Tradicional Bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Edições Paulinas
Gil Gonçalves
Imagem: http://www.macua.org/livros/olhar1np.html

Discursos Políticos (VII). Agostinho Neto


É uma questão importantíssima porque nós pretendemos sempre agir em nome da justiça, agir em nome do progresso, mas nem sempre os nossos actos coincidem com a justiça e com o progresso. Ainda praticamos, aqui, muitas injustiças, ainda há homens, cidadãos do nosso país, que praticam a arbitrariedade. Precisamos de vigiar melhor o direito de cada um dos nossos compatriotas de gozar uma vida livre e uma vida em que se possa dizer realmente defendida pelo Estado e pelo Partido.

Hoje, em Luanda, não temos sapateiros, nem carpinteiros, nem marceneiros. Porquê? Porque todos foram para a função pública.
Bom, os camaradas bateram palmas, mas devem saber que não é fácil, não é nada fácil. É necessário ter princípios, ser-se coerente, honesto e modesto. É preciso reunir uma série de qualidades para se poder ser comunista.
Alguns dos nossos compatriotas poderão, talvez, ter o seu próprio carro, a sua camioneta, a sua carrinha para resolver os problemas do comércio e outros problemas.

A construção de habitação, por cada um, já não é proibida, hoje. Cada um pode construir a sua casa onde melhor lhe convém, obedecendo é claro, aos planos de urbanização.
Os homens e mulheres que vivem no campo, sofrem imenso, porque não podem comprar, porque não podem vender e, dificilmente, podem produzir.
Mas aqueles que podem resolver os problemas sozinhos, ou pensem que podem resolver os problemas sozinhos, vamos dar-lhes essa possibilidade de resolverem os seus problemas.
Agostinho Neto. 10 De Dezembro de 1978. Discurso no acto central do 10 de Dezembro.


Estamos a recorrer a técnicos estrangeiros. Teremos de recorrer sempre, porque não teremos a técnica durante este ano, não teremos a técnica dentro dos próximos dez anos. Vamos recorrer sempre à ajuda estrangeira.
Temos muitos analfabetos e as crianças, os homens, as mulheres devem aprender a ler e a escrever.

Vamos preocuparmo-nos com a formação de quadros para a agricultura. Os nossos jovens, quando se fala em formar técnicos agrícolas ou técnicos para apoio às empresas industriais, riem-se um pouco, dizem que isso não é ofício para uma pessoa que já sabe alguma coisa e querem ser advogados, médicos…

Formem-se os técnicos, mecânicos para a organização de uma secção de transportes, para a condução de tractores, para a utilização de tractores. Formem-se os técnicos que podem organizar os transportes, formem-se os técnicos para poder dirigir instalações eléctricas etc., porque aí está a base, está o futuro da nossa vida.
Temos energia eléctrica a instalar em várias províncias que ainda não têm energia eléctrica. Temos bairros em Luanda mal servidos de energia eléctrica.

Há pouco tempo os camaradas, pelo menos em Luanda, das Comissões Populares de Bairros, estiveram reunidos com o camarada ministro da Construção e habitação, para ver como é que vamos resolver o problema da habitação nesta cidade que está a crescer de dia para dia.
Bom, desde que se tratou este problema, já começaram as construções sem licença de ninguém.
Cada um apanha duas chapas de zinco, dois adobes, três pedras e faz a sua casa. E faz a sua casa de maneira a tapar a rua, tapar o acesso à população a determinados locais. Enfim está-se a fazer uma aplicação muito má do princípio que nós temos admitido, como uma probabilidade num futuro próximo. Quer dizer que não constroem com a licença do Comissariado Municipal, não constroem com a licença do Ministério da Construção e vamos tendo a cidade tapada em várias ruas. Não pode ser! Vamos construir sim, mas com a licença do Comissariado Municipal, com o acordo do Ministério da Construção em todo o País.

Quem tem os seus meios, quem tem material, pode construir, pode ter a sua casa para viver mas respeitando os planos de urbanização, os planos de organização de cada cidade dentro do País. Não vamos construir de uma maneira selvagem, de uma maneira anárquica. Temos de construir de maneira que tudo esteja ordenado, porque senão, bom, o tractor vai passar por cima. Não teremos outro remédio. Vamos pôr os tractores em cima dessas casas que estão a tapar as ruas e aqueles que já começaram é melhor parar.
Agostinho Neto. 4 De Fevereiro de 1979. Discurso no acto central do 4 Fevereiro.
Gil Gonçalves

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Figura da Semana. Robert Mugabe


Vou receber o feitiço no Mussulo e no Caxito.

Tudo é composto de instantes petrolíferos.

Ajustei o campo binocular. Um jornalista de fraqueza física, mas de espírito forte, tentava amainar um antagonista latagão. Discutiam-se e improperavam-se. O jornalista ao correr da pena, ecoava que apenas dera um leve toque na traseira da viatura do latagão. Estavam a ficar intransitáveis, porque o latagão não aquiescia. Ao contrário, publicitava que era formado em pugilismo pelos ringues mais violentos que ainda subsistem.

Sem pena, remexeu os toros musculados e desembainhou os punhos de aço natural. A bater o aço no intelecto do jornalista, que apenas conhecia defender-se com caneta e papel, ou computador portátil. As palavras desvaneciam-se na mente redactorial. Perdeu o sentido da vida. O latagão como animal enjaulado não despenava a vítima. Incansável como máquina metálica programada para matar. Braçais possantes conseguiram imobilizá-lo quando desligaram o disjuntor principal que alimentava a máquina desumana.

Sentiu-se plenamente realizado porque odiava jornalistas. Assassinou um jornalista por cinquenta dólares, que era o preço da batidela. Triunfante, basculante, inocentou-se que apenas usou as mãos.
Gil Gonçalves


Robert Mugabe
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Robert Mugabe é um político e actual presidente do Zimbabwe liderando o país desde 1980 primeiro como primeiro-ministro e desde 1986 como Presidente executivo.
Robert Gabriel Mugabe nasceu no dia
21 de Fevereiro do ano de 1924 na cidade de Kutama na Rodésia do Sul( actual Zimbabwe).
Pertencente à
etnia shona ,filho de um fazendeiro local, foi educado numa escola de jesuítas. Foi professor primário na antiga Rodésia, Zâmbia e Gana entre os anos 1942-1949 e 1955-1960. Possui diplomas de inglês, História e Educação nas mais prestigiadas universidades africanas e obteve a licenciatura de economia (por correspondência) na universidade de Londres.
Participou no movimento de
Joshua Nkromo, o ZAPU (Zimbabwe African People Union), em 1960 e três anos mais tarde funda o ZANU (Zimbabwe African National Union- União Nacional Africana do Zimbábue ). É preso em 1964 devido às suas actividades politicas sendo libertado em 1974 altura em que parte para Moçambique onde lidera uma guerrilha que se opõe ao Governo de minoria branca de Ian Smith. Com o acordo de paz de Lancaster House, assinado em Londres em 1979 após meses de negociações, Mugabe voltou para a ex-Rodésia e foi calorosamente recebido pela maioria negra. Torna-se primeiro-ministro da ex-Rodésia (já depois do fim do governo liderado por Ian Smith) em 1980 ao vencer eleições. Em Abril desse ano é declarada a independência do país que passou a ser designado por Zimbabwe.
Em 1982 passa a liderar o país sozinho, rompendo a coligação de Unidade nacional de dois anos com
Nkromo e pondo termo a uma ligação que imperava desde 1976 com a União do Povo Africano do Zimbábue (Zapu) de Joshua Nkomo, dominada pela etnia ndeble. Este processo de desunião despoletou violentos confrontos entre as duas facções originando uma onda de repressão contra os membros da Zapu. Passando a centralizar o poder e obtendo cada vez mais autoridade termina com o sistema parlamentar instaurando um sistema com um maior pendor presidencialista. É eleito presidente em 1984, 1990, 1996 e 2002 em eleições consideradas, por muitos, ilegais e fora do controlo democrático habitual de um estado de direito. A derrota no referendo de 2000, que possibilitaria uma revisão constitucional , foi um dos únicos reveses do regime ditatorial de Robet Mugabe contudo isso não impediu o seu governo de concretizar em pleno os seus objectivos de Reforma Agrária por ele preconizados. Actualmente, estima-se que Zimbabwe seja o país com maior número de pessoas a viverem abaixo do limiar de pobreza.
Nos anos dos seus mandato, Mugabe embora sendo um
marxista que se afastou ligeiramente dos seus ideais com o fim da URSS , deu seguimento a um conjunto de politicas de carácter socializante , nacionalizando várias industrias ao mesmo tempo que expropriava várias terras dos seus proprietários originais e seguia os seus planos de aumento de impostos e de controlo de preços alastrando assim o controle do estado sobre os diversos setores da economia. Com o grave declínio da economia e o descontentamento da população, severamente afetada pelo desemprego, pela fome e pela Sida, a oposição ao regime de Mugabe cresce consideravelmente. Surgem vários casos de violência e de intimidação perpetuados contras os opositores políticos de Rober Mugabe. Seu governo é considerado um dos mais corruptos de todo o continente africano, sendo suspeito de vários esquemas paralelos de venda de diamantes e outros minerais do país. Governando um regime de caráter autoritário e antidemocrático, Robert Mugabe, um exacerbado nacionalista, é responsabilizado por aprovar polêmicas restrições ao direito de voto e uma lei que permite o afastamento dos observadores independentes, além de uma severa perseguição à imprensa interna. Da mesma forma, limita os direitos civis dos cidadãos do seu país.
Robet Mugabe, no poder há 27 anos, já anunciou a sua intenção de se recandidatar a uma nova eleição, que está prevista para o ano de
2008.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Robert_Mugabe

Imagem: http://images.google.com/imgres?imgurl=http://www.africancrisis.org/images/mugabe1.