terça-feira, 27 de outubro de 2015

Conselho Unânime ao Presidente: Liberdade, Já. Rafael Marques de Morais




Neste momento, amigos e inimigos do presidente José Eduardo dos Santos terão um mesmo conselho para lhe dar: que liberte de imediato os jovens activistas detidos.
Tanto em Angola como no resto do mundo, a libertação destes jovens é para muitos um dever humanitário, tanto mais urgente quanto a vida de Luaty Beirão se torna cada vez mais frágil.

MAKAANGOLA

Mas também para aqueles que são mais próximos do presidente - pelo menos para aqueles que têm visão política e querem de facto proteger a posição de JES – a única saída benéfica para o presidente é a libertação imediata.
Se Luaty morrer, ele não será apenas um mártir, será também o catalisador da força e do poder da juventude, que se virará contra o presidente de forma virulenta. E desta vez o mundo estará do lado certo, ao lado da liberdade de consciência e dos angolanos de bem.
Têm surgido ultimamente argumentos segundo os quais não cabe ao presidente tomar uma decisão neste caso, tendo em conta a suposta independência do sistema judicial. Esse argumento não tem substância legal, como se verá já de seguida, nem substância material, tendo em conta que a ingerência do poder presidencial em assuntos jurídicos é uma constante na vida nacional.
Aliás, este caso, como tantos outros casos de detenções ilegais, é em primeiro lugar e acima de tudo um caso político.
Desde logo, a Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República de Angola estabelece, no seu artigo 8º, 1º (sobre nomeação e mandatos), que “o Procurador-Geral da República [PGR] recebe instruções directas do Presidente da República, no âmbito da representação do Estado”.
Assim se percebe que o procurador-geral da República, quando acusou os 15 activistas de rebelião e atentado contra o presidente da República, agiu sob instruções directas de José Eduardo dos Santos.
É portanto seguro afirmar que, tal como coube ao presidente ordenar a detenção irresponsável e mirabolante dos jovens, cabe também ao presidente ordenar a sua libertação.
Quanto mais se prolonga a perseverante e intransigente greve de fome de Luaty Beirão, através da qual reivindica a sua libertação e a dos seus companheiros, mais se revela a insensibilidade humana do presidente. Um cidadão intransigente luta contra um presidente obcecado pelo poder.
Dos 15 activistas presos, Albano Bingobingo, Arante Kivuvu, Mbanza Hamza, Nito Alves, Fernando Tomás “Nicola Radical”, Luaty Beirão, contam com dezenas de actos de tortura às mãos da polícia e das forças de segurança, bem como inúmeras detenções arbitrárias. A procuradoria e os tribunais sempre agiram contra os direitos humanos, procurando apenas respeitar as “ordens superiores” dos que governam e sobretudo de quem os instrui directamente: o presidente da República.
Sabe-se, à partida, que a trama inicial de acusar os jovens de preparação de golpe de Estado, como afirmou publicamente o procurador-geral, general João Maria de Sousa, partiu do Serviço de Inteligência e Segurança Militar (SISM). O Maka Angola soube também que o chefe da Direcção Principal de Contra-Inteligência Militar, tenente-general José Afonso Peres "Filó", terá pedido demissão por ter sentido a falta de apoio do chefe do SISM, general Zé Maria, com o fracasso da operação. A detenção dos jovens expôs o presidente ao ridículo internacional.
Com humildade, no âmbito dos seus poderes legais, o presidente pode e deve ordenar directamente ao procurador-geral que retire as acusações contra os jovens e assim salvar a vida de Luaty Beirão. O presidente só tem a perder com a morte de Luaty Beirão, porque esta terá como consequência a sua morte política.
É possível que José Eduardo dos Santos decida continuar a ignorar os apelos nacionais e internacionais sobre o caso. Afinal de contas, tem o exemplo do activista político Manuel Hilberto de Carvalho Ganga, assassinado por um membro da Unidade de Segurança Presidencial (USP) e hoje praticamente esquecido, salvo entre a família e os amigos. Passados dois anos, o presidente não instruiu os órgãos judiciais para que julgassem o seu guarda, que matou o indefeso e pacifico Ganga com dois tiros. Recorde-se que o jovem morreu quando supervisionava a colagem de cartazes no Estádio dos Coqueiros. Os cartazes exigiam justiça para o caso dos activistas Alves Kamulingue e Isaías Cassule, assassinados por forças policiais e de segurança a 27 e 29 de Maio de 2012, por terem mobilizado ex-guardas presidenciais para uma manifestação de desmobilizados que reivindicavam pensões.
O presidente pode ainda pensar que o massacre do Monte Sumi, cometido pelas forças policiais e militares contra os peregrinos da Seita de Kalupeteka, a 16 de Abril passado, já está esquecido na memória dos angolanos.
O caso dos 15 é o somatório de todos os casos em que o presidente maltratou e desprezou a força e o poder da juventude. E isto o senhor presidente parece não compreender: este caso não é como outros. Este caso é o fim da linha. Se morrer, Luaty Beirão não será esquecido.
Os conselheiros do presidente têm agora de ser rápidos a inverter caminho. Usem da inteligência táctica e de algum sentido humanitário que lhes reste, e digam o que é preciso dizer ao presidente: que os jovens têm de ser libertados imediatamente.
Caso o presidente não oiça os seus conselheiros, então que se cheguem à frente os filhos. Isabel dos Santos, José Filomeno dos Santos (Zenú), Welwitchia José dos Santos (Tchizé), José Paulino dos Santos (Coréon Du): aconselhem o vosso pai a ser pai, a ser humano e a ceder, demonstrando aos cidadãos de todos os países que consegue vencer a sua própria obstinação.
Senhor presidente: liberte os jovens, junte-os todos numa casa de passagem, por mais umas semanas, para que possam recuperar, acalmar, conviver entre si e com os seus familiares. Será uma boa saída antes de regressarem às suas casas e às suas vidas, tão injustamente interrompidas pelas forças do MPLA.
Manter obstinadamente esta luta desigual com um “miúdo” igualmente obstinado como Luaty Beirão é, para além de injusto e cruel, um verdadeiro suicídio político.
O poder judicial é seu. Você decide


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