1. O
público leitor de jornais e, também, todos quantos seguem atentamente os
noticiários depararam-se com informações alarmantes a respeito de uma das
instituições bancárias tidas como das mais robustas e melhor cotadas no nosso
mercado financeiro – o BESA. Já antes, e não há muito tempo, tínhamos sido surpreendidos
com o desmoronamento da seguradora nacional “AAA”, o que, pela certa, terá
causado dano em muitos dos que nela confiaram. Que eu saiba, as verdadeiras
razões do desmoronamento da “AAA” ficaram como que no chamado “segredo dos
deuses”. Por isso, no grande público permanecem ainda imensas dúvidas, face ao
comportamento sigiloso de quem tem a obrigação de gerir a sociedade com grande
transparência.
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2. Veio ao
de cima agora o chamado “Caso BESA”, cujo desenvolvimento terá ajudado a
despoletar o ainda mais complexo “Caso BES”, que envolve um dos grupos
familiares mais mediáticos no panorama financeiro português, com fortes
ramificações no nosso país.
3. Há
muito que se espalhavam pequenos sinais de que o Grupo Espírito Santo estava
envolvido em actos pouco claros e nada transparentes. Alguns dos seus tentáculos internacionais passaram
por vistorias policiais e periciais que indiciavam que algo não corria bem no
seu seio. Porém, o alerta mais estridente soou com a informação do iminente
colapso do BESA – veiculada pela comunicação social portuguesa – resultante do
desconhecimento do paradeiro de cerca de 5,7 mil milhões de dólares
norte-americanos atribuídos por aquele banco a clientes “supostamente” desconhecidos.
Quase em simultâneo, foi também veiculada a notícia de que o Presidente da
República decidira conceder uma garantia soberana ao BESA, para cobrir os
eventuais danos causados pelo crédito malparado causado pela atribuição de
dinheiros a figuras principalmente ligadas à nomenklatura que orbita em torno
do partido no poder.
4. Esse
“suposto” desconhecimento da identidade dos beneficiários dos aludidos fundos é
um facto demasiado grave, pois, qualquer instituição bancária que se preze – e,
com maioria de razão, uma entidade com o histórico bancário herdado do BES –
não pode ter facultado tão elevados recursos a “desconhecidos”. Muito menos
deveria prestar tal benefício a quem não provou possuir garantias reais capazes
de servir de respaldo ao crédito, em caso de incumprimento das respectivas
obrigações.
5. Corre
ainda a notícia de que um dos que mais proveito retirou dessa forma perdulária
de aceder ao crédito bancário, terá sido o próprio Presidente da Comissão
Executiva do BESA, na altura, Álvaro Sobrinho, o que configura uma clara
prática de improbidade e de enorme promiscuidade: ser juiz em causa própria.
6. A
alegada conexão do anterior PCE do BESA com altas figuras do regime
beneficiárias dos créditos – hoje tidos como “activos tóxicos” – que provocaram
o desmoronamento do BESA, terá sido facilitada por entidades de proa da ESCOM
(Espírito Santo Commerce), uma das mais complexas alavancas dos interesses do
Grupo Espírito Santo no nosso país.
7. O BES,
com mais de 50% do capital é ainda, até agora, o principal accionista do BESA,
tendo como parceiros a Portmill (24%), o Grupo Geni (18,99%), e uma pequena
percentagem do seu capital está distribuída por accionistas individuais.
8. À
Portmill estarão ligados altas figuras da política nacional, como o actual
Vice-Presidente da República, Manuel Vicente, “Kopelipa” e o General Dino. À
Geni estará ligada à filha mais velha do Presidente da República, Isabel dos
Santos.
9. Em
Portugal, o BES foi desmantelado, por determinação do Banco de Portugal,
atirando os chamados “activos tóxicos” para o agora chamado “Banco Mau”, entre
os quais o BESA. O Banco de Portugal constituiu também um “Banco Bom”, com o
nome provisório de “Novo Banco”. Ao tomarem conhecimento dessa decisão, as
autoridades angolanas retiraram a garantia soberana anteriormente concedida
pelo Presidente da República, sem a qual o BESA ficou exposto às contingências
do mercado.
10.
Sabe-se que o governo de Angola pretende dar um novo rumo ao BESA, remodelando
a sua estrutura accionista. Para isso, colocam-se alternativas, uma das quais
seria a sua distribuição por entidades bancárias estatais, o BPC e o BCI.
Talvez não seja essa a melhor, dado que se trata de entidades bancárias cuja
“saúde” suscita muitas dúvidas. E onde mais facilmente se poderiam repetir os
erros de avaliação do risco de crédito cometidos pelo BESA…
11.
O tratamento a dar ao “Caso BESA” tem que ser devidamente ponderado, pois terá
implicações em diversas áreas de actividade. Por exemplo, o BESA detém 62% do
capital social do BESAACTIF, uma sociedade gestora de fundos de investimentos.
Dos restantes, 35% pertencem à ESAF – Espírito Santo Participações
Internacionais – uma das maiores sociedades gestoras de fundos de investimento
portuguesas. E os 3% residuais são detidos por pequenos investidores.
12.
A ESCOM, maioritariamente participada pelo Grupo Espírito Santo, desenvolve
múltiplas funções no nosso país, nomeadamente, mineração, imobiliário, energia,
obras públicas, cimentos, oil & gás, etc. Uma eventual falência que se
venha a verificar na ESCOM porá em causa um número bastante grande de
interesses, gerando, inclusive, um significativo aumento no nível do
desemprego.
13.
Tudo isso me leva a pensar que seria aconselhável as autoridades angolanas
adoptarem uma atitude mais transparente na gestão do “Dossier BESA”, como forma
de dissipar as fundadas suspeitas que sobre elas recaem, de estarem mais
preocupadas em proteger os interesses particulares da sua nomenklatura.
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