num contexto de diminuição generalizada
de recursos financeiros (2.ª parte)
ALVES ROCHA
Estudos empíricos sobre casos de sucesso
de diversificação da economia em situações de posição económica relevante de
recursos naturais renováveis existem desde há muito tempo.
Alan Gelb e Sina Grasmann (1), do
Departamento de Economia do Banco Mundial, estudaram uma amostra de países onde
as exportações de produtos primários, portanto com fraco índice de valor
agregado interno, representavam mais de 60% do total das exportações em 1971.
Cinco países com uma média de
exportação/PIB acima do limiar estabelecido como referência do estudo -
Malásia, Tailândia, Chile, Indonésia e Sri Lanka - tiveram sucessos claros nos
processos de incremento do peso relativo do sector manufactureiro no PIB e,
entre 1975 e 2001, a taxa média anual de aumento do PIB por habitante foi de
3,5%. No caso do Chile, a diversificação centrada na indústria transformadora
apresentou a particularidade de o país ter desenvolvido a produção de muitos
produtos sofisticados, graças a políticas sustentadas de inovação e
investigação científica.
Estes e outros autores (2) comprovaram
também que os processos de diversificação foram bem mais lentos, mais caros e
menos bem-sucedidos nos países com uma proporção elevada de exportações de
recursos naturais não renováveis, como o petróleo, os diamantes e outros
minérios, devido aos já citados fenómenos de rent-seeking e doença holandesa.
Verificou-se, igualmente, que uma das
razões para a lentidão dos processos de diversificação económica e incremento
do peso das actividades de transformação se deveu à implementação de políticas
exageradas de protecção às indústrias (em tempo de duração, instrumentos de
protecção causadores de distorções nos preços e na afectação eficiente dos
factores de produção), que retardaram a maturidade da indústria transformadora.
Nesses países, ainda hoje se apresenta um sector transformador com muitas
dificuldades de competir com as importações e de disputar franjas dos difíceis
mercados externos.
Na Malásia - abundante em borracha, óleo
de palma, estanho e produtos florestais e só mais tarde petróleo -, a
estratégia foi a da constituição de uma poderosa poupança interna na base dos
rendimentos de exportação dos recursos naturais não renováveis, à custa da qual
se financiaram os pesados investimentos em tecnologia, infra-estruturas,
energia, comunicações e transportes, de que resultaram reduções significativas
nos custos de produção e incrementos consideráveis na produtividade geral da
economia (com reflexos na competitividade geral do país).
Desde 2001, o país abandonou por completo
a política de protecção industrial - que vigorou apenas durante seis anos - e
hoje é uma economia com elevados índices de desenvolvimento humano, ocupando a
62.ª posição no ranking mundial do PNUD de 2014, integrando o grupo de
rendimento elevado, com uma esperança média de vida de 75 anos e uma média de
escolaridade de 10 anos (3).
Paul Collier, numa conferência realizada
em Luanda conjuntamente pelo FMI/Banco Mundial/Ministério das Finanças em Maio
de 2005, em comemoração dos 20 anos de independência nacional, deixou mensagens
e recados claros sobre como Angola poderia ser, nos próximos 30 anos, um país
como a Malásia, evitando ser como a Nigéria (4).
Infelizmente, não foi ouvido. O Chile
oferece exemplos concretos de políticas públicas direccionadas para o apoio à
diversificação da sua economia, muito dependente, nos primeiros tempos, da
exploração do cobre.
As indústrias do vinho e do salmão são
dois casos de evidente sucesso no seu processo de diversificação com
industrialização de muitos produtos agrícolas e pecuários. As políticas
públicas usadas foram: fomento e adaptação do desenvolvimento tecnológico (um
pouco à japonesa, que, nos primeiros anos da sua fantástica e rápida
reindustrialização pós-II Guerra Mundial, usou a espionagem industrial e a cópia
e adaptação de protótipos estrangeiros para os aplicar às suas necessidades de
crescimento e diversificação (5) ), construção de infra-estruturas económicas
de qualidade nos diferentes domínios, reforço do capital humano e
apadrinhamento de parcerias público-privadas em áreas e sectores de actividade
de seguros rendimentos de retorno a médio prazo.
Abertura da economia e gestão das
variáveis reais e monetárias de competitividade completaram o quadro de
políticas públicas viradas para a diversificação. A Indonésia parece ser o mais
interessante exemplo de como colocar os recursos financeiros da exportação de
petróleo a favor do desenvolvimento da agricultura.
Mesmo tratando-se de um país com graves
problemas religiosos, a aposta nacional determinada em se resistir aos efeitos
do dutch disease e se desenvolver, em bases extensivas, a cultura e
industrialização das diferentes variedades de arroz, deu certo e aparentemente
está preparada para sair da fase de economia do petróleo que a caracterizou
durante algum tempo.
Foi graças a ter-se evitado os efeitos
nefastos da doença holandesa, através de uma política económica global e bem
coordenada pelo Estado - ao contrário, por exemplo, de Angola, onde a política
económica está departamentalizada e cada responsável a executa sem perscrutar
os efeitos (positivos e nefastos) sobre outros domínios económicos e sociais -
que permitiu aplicar uma visão estratégica de desenvolvimento, tendo-se
investido os ganhos do petróleo na exploração do gás usado abundantemente na produção
de fertilizantes para uso doméstico e exportação (Japão).
A política cambial foi sempre usada com
critério extremo, com a finalidade de se evitar o afastamento da taxa de câmbio
de limites considerados incentivadores da diversificação e do crescimento
económico. São leituras que a política e a história económica consideram como
passíveis de serem replicadas, mormente em países altamente dotados de recursos
não renováveis, evidentemente com as devidas e pertinentes adaptações (6).
Obviamente que o potencial de
diversificação das economias é afectado por vários factores, onde se incluem a
disponibilidade de recursos financeiros - sob todas as suas formas -, as
capacidades técnicas e profissionais da população e a qualidade da governação.
Alguns países, como o Botsuana,
apresentam altos desempenhos em diferentes dimensões do seu desenvolvimento
económico - por exemplo, é o segundo melhor país africano subsariano, depois
das Seicheles, em desenvolvimento humano, com um IDH de 0,683 em 2014 -, mas
enfrentam restrições geográficas, ecológicas e de dotação de capital humano que
têm tornado bastante difícil a implantação de um sistema produtivo
diversificado e competitivo.
Não se sabe em quanto o processo de
diversificação da economia nacional foi prejudicado pelo controlo da taxa de
inflação pela via da âncora cambial. Do ponto de vista das experiências
exitosas de diversificação, a desvalorização cambial é uma medida presente nas
estratégias e políticas nacionais, não apenas nos países ricos em petróleo e outros
recursos naturais irrenováveis, como naqueles em que a dependência externa se
concentra na exportação de matérias-primas e bens alimentares.
A diversificação é também um processo de
gestão e provocação de expectativas que levem os investidores privados, dentro
das condições e factores anteriormente apontados, a aplicarem as suas e as
alheias poupanças em actividades de elevado potencial de competição externa.
A acomodação dos empresários nacionais
aos modelos proteccionistas cuja implementação eles próprios solicitam aos seus
governos e a falsa-ideia-clara de que a diversificação é apenas interna, para
substituir simplesmente o que é importado, tem adiado estes processos em muitas
economias emergentes e em desenvolvimento, ricas ou não em petróleo e outros
produtos de base.
(1)- Citados em Population and Natural
Resources, Agence Française de Développement, 2009.
(2) - Como R. Auty (Resource-based
industrialization: Sowing the oil in eight developing countries, 1990 e
Resource Abundance and Economic Development, Oxford University Press 2001), M.
Abidin (Competitive Industrialization with Natural Resource Abundance:
Malaysia, 2001).
(3) - UNDP, Human Development Report
2014.
(4) - Collier, Paul - Angola: Options
for Prosperity, 2005.
(5) - Sakaya, Taichi - Japão: As Duas
Faces do Gigante, Difusão Cultural, 1995.
(6) - Possivelmente dando-se razão a
quem, em Angola, considera como uma bênção a queda do preço do petróleo e como
também já publicamente escrevi que agora é que temos de pensar seriamente na
diversificação, procurando novas e mais reprodutíveis fontes para o seu
financiamento.
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