quinta-feira, 24 de abril de 2008

Phillis Wheatley


A saudade dói, é uma ferida, ao lembrar o valor da amizade de uma amiga
Um caçador de escravos privou-a da liberdade com apenas oito anos
Obrigaram-na a não apanhar mais mangas, abacaxis, bananas
As frutas dos selvagens!
Perdeu para sempre o interior, os segredos do feitiço da sua Mãe
A selva africana. Embarcou órfã na mãe negreira
Oh! Não me façam mal! Prometo nunca mais fugir dos Brancos
Não subirei mais às costas das palmeiras. Não mais me refrescarei
Saciarei, na água dos cocos. Porque não mais os verei, comerei
Os meus pais, irmãos, amigas recordarei. As marés nas areias não abraçarei
A manhã está tão cercada, sombreada irreal
Desnudou-se para me saudar. Vejo a proa do navio negreiro
Que me há-de levar, a deslizar. Não há, não vejo, não vem ninguém
Para me apoiar, ajudar a salvar
A margem afasta-se, acho que me envia um sorriso
Já estamos longe. Não sabia que o mar era assim grande
Tão imenso. Ainda bem que o navio negreiro não tem medo dele
Parecem tão amigos. Deve ter muitas mãos que o seguram
Senão afundava-se. Sinto medo desta grandeza e desato a chorar
O traficante de escravos grita-me. A sua voz é tão potente
Que o oceano treme. «Ó especiaria, recolhe-te no cubículo!»
Gravou na memória os sulcos da proa negreira que rompia avidamente
As correntes marítimas. As vagas revoltadas acompanhavam a pressa
Da chegada sem destino. De tão longe conhecida
Aportou em Boston, um Novo Mundo desconhecido
Alguns dos modernos navios negreiros que refazem a rota
Antes africanizada, juram com pavor
Que viram um navio fantasma, o Wheatley voador
Um comerciante rico comprou-a, ofertou-a como criada para a sua esposa
O senhor dos escravos nunca poderia saber
Que importou, comprou uma poetisa, um condor
As plantações das ilusões escravizam-nos, como multidões
A senhora deu-lhe a estudar geografia, história, e latim. Se todos estudassem…
Aos treze anos demonstrou afamada poesia
Com vinte anos na Inglaterra publicou-a
Exótica africana com escala no Novo Mundo
Phillis Wheatley acabou na lei da selva. Trinta e um anos de fervor cristianizado
Longe do calor silencioso, da brisa acariciante, selvagem terna
Dos rios engolidos pelos vales da poesia negra. Apagada, desconhecida
Viva no seu coração negro, conhecida nos seus pensamentos
De muito claros movimentos


Gil Gonçalves

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