terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Banco Keve: A Nadar Sem Calções de Banho. Rui Verde, doutor em Direito


O banco português BPI tem de abandonar de alguma maneira a sua participação no Banco de Fomento de Angola (BFA) porque o Banco Central Europeu considera que a exposição daquele banco a Angola é um grande risco. A filha do presidente José Eduardo dos Santos, que detém metade do capital do BFA, não aceita. Sem a credibilidade de um banco internacional como o BPI, como Pessoa Exposta Politicamente, Isabel dos Santos perde autoridade junto do sistema financeiro internacional.

MAKAANGOLA

O Bank of America, o principal fornecedor de dólares a Angola,  decidiu suspender a venda de dólares a bancos sediados no país, devido à sistemática violação das regras de regulação internacional do sector. Na base desta suspensão também terão estado práticas de branqueamento de capitais, envolvendo somas anuais de milhões de dólares.
Estas informações provêm de fontes reputadas do jornalismo de negócios internacional. Não são invenções maldosas de frustrados jovens opositores do regime.
Portanto, a situação bancária e monetária em Angola está sob suspeita internacional. No âmbito desta suspeita não pode deixar de ser referido o Banco Keve, não por ter feito, à partida, algo ilegal, mas pelo facto de o seu corpo accionista ser composto por Pessoas Expostas Politicamente e por isso poder estar sujeito a severas restrições na finança internacional.
Constam da lista dos accionistas do Keve: general Higino Lopes Carneiro, general governador do Kuando Kubango, e esposa Ana Maria Isaac - maiores accionistas, com 9,02%; general Manuel Hélder Vieira Dias ”Kopelipa”, chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, com 2,57%; general Carlos Hendrik Vaal da Silva, inspector-geral das FAA, com 2,57%; André Luís Brandão, secretário do presidente para os Assuntos da Contratação Pública, com 2,57%; Ivan Leite de Morais, filho do governador do Banco Nacional de Angola, com 2,57%; José Amaro Tati, secretário de Estado da Agricultura, com 1,48%; Francisco José Ramos da Cruz, deputado do MPLA, com 1,39%; general Salviano de Jesus Sequeira "Kianda", secretário de Estado da Defesa para os Recursos Materiais e Infra-estruturas, com 1,04%; general Armando da Cruz Neto, deputado do MPLA, com 1,04%; general António dos Santos França "Ndalu", deputado do MPLA, com 1,04%; António André Lopes, ainda recentemente vice-governador do Banco Nacional de Angola, com 1,04%. Estes são alguns exemplos do núcleo duro do Banco. São, genericamente, Pessoas Expostas Politicamente.
Segundo as normas internacionais, as Pessoas Expostas Politicamente são os agentes públicos que desempenham ou desempenharam em período anterior (geralmente 5 anos), cargos, empregos ou funções públicas relevantes, assim como os seus representantes, familiares e outras pessoas do seu relacionamento próximo (“familiares” abrange os parentes da pessoa politicamente exposta, em linha directa, até o primeiro grau e, também, o cônjuge, o companheiro, a companheira, o enteado e a enteada).
Ora, todas as individualidades acima referidas, pela qualidade dos cargos que ocupam/ocuparam, são PEPs. Sendo assim, estão sujeitas às regras internacionais recomendadas pela FATF (Financial Action Task Force), organismo intergovernamental internacional que tem como função proteger o sistema global financeiro contra a lavagem de dinheiro.
As suas recomendações incluem: Tomar medidas razoáveis para identificar a fonte da riqueza e dos fundos dos PEPs que intervêm no mercado financeiro internacional; ou reunir suficiente informação sobre os bancos estrangeiros correspondentes, estabelecendo a sua reputação e natureza dos negócios.
O problema que levanta um Banco dominado por PEPs é que tem muita dificuldade em operar no mercado financeiro internacional, havendo uma forte propensão do sistema para criar mecanismos que recusem ou limitem as actividades desses bancos.
Esta não é uma afirmação especulativa, daí que este texto tenha começado com a história do BPI/BFA. O BFA é um banco tradicional angolano, que não suscitaria à partida quaisquer problemas de exposição política (embora as evoluções na sua estrutura accionista já possam apontar para isso). E, no entanto, o Banco Central Europeu obrigou o BPI a reduzir a participação no BFA, por sinal a fonte dos seus lucros…
No actual quadro financeiro mundial, torna-se muito complicado misturar política e finanças. É bom que o Banco Keve tome nota do enquadramento mundial para fazer as necessárias adaptações. As possibilidades de ter um banco sólido a operar no mercado financeiro internacional dependem cada vez mais da transparência, sendo que as condições genéticas do Banco Keve podem conduzir à sua transformação em mais um pária no sistema financeiro internacional. E não se duvide de que um dos desafios futuros de Angola será encontrar crédito privado nos mercados internacionais, o que será impossível com a actual estrutura politizada da finança nacional.
Voltemos então ao princípio deste texto: a falta de due diligence rigorosa é um dos problemas essenciais com que se defronta a finança e os investimentos angolanos. O país vai ficando sem credibilidade externa nem fontes de financiamento externos, porque os mercados não confiam nele, uma vez que não sabem, ou suspeitam, de onde vem o dinheiro. Assim, seja no Banco Keve, seja nos investimentos de Isabel dos Santos, o problema é sempre o mesmo. São Pessoas Expostas Politicamente cujas acções implicam uma due diligence reforçada.


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