Despejos em Luanda
Corre nos bastidores a análise segundo a qual a
recente nomeação presidencial do general Higino Carneiro para governador de
Luanda visa, na verdade, dar cobertura formal ao cargo que, na prática, passa
para Isabel dos Santos.
Rafael Marques de Morais
MAKAANGOLA
Em Dezembro passado, Isabel dos Santos
apresentou o Plano
Director Geral Metropolitano de Luanda, a ser implementado num
período de 15 anos. Como não podia deixar de ser, coube à Presidência da
República organizar o evento, para a promoção da filha do presidente. O nepotismo
tornou-se “lei” nos actos de José Eduardo dos Santos, para benefício
da sua família. E para manter este estado de coisas, promove a generosidade,
para com os seus fiéis, a quem permite que sigam a mesma prática.
Note-se que inicialmente
o Plano Director fora lançado pelo Governo Provincial de Luanda, mas
passado dois anos tornou-se uma iniciativa conjunta da Presidência e de Isabel
dos Santos.
A filha do presidente não está interessada nos
problemas sociais, de gestão ou das infra-estruturas de Luanda, mas sim nas
oportunidades exclusivas de negócio que o pai mais uma vez lhe oferece. Com um
orçamento previsto de US $15
biliões para a implementação do Plano, a cobiça pelo erário
público fala mais alto. Higino Carneiro tem a mesma visão do poder, e por onde
passa deixa a sua marca de negociante, não de servidor público.
Por ser um dos governantes favoritos do
presidente - satisfazendo-lhe os interesses particulares e mantendo boa relação
com Isabel dos Santos -, o general é a escolha mais acertada para governar
Luanda.
Por exemplo, em 2006, na qualidade de ministro
das Obras Públicas, Higino
Carneiro procedeu à aquisição, em nome do Estado angolano e por US $74 milhões,
de 49 por cento das acções que a Cimpor portuguesa detinha na Nova Cimangola.
No dia seguinte, essas acções foram transferidas para Isabel dos Santos.
Como nota um jornalista veterano, “o Higino é
muito vivo. Sabe antecipar-se ao que o chefe quer e satisfazê-lo. Sabe
distribuir e gosta de dividir o que ganha nos seus cargos”.
Na sua tomada de posse, o general, como era de
esperar, destacou, entre as suas prioridades, o Plano
Director Geral Metropolitano de Luanda, liderado por Isabel dos Santos, como
“necessidade urgente”. A recolha do lixo na cidade e o reforço da
sua segurança também foram apontados como prioridades.
Astuto, o general é bastante aberto. Sabe
difundir autoridade e promover uma auto-imagem benigna, mesmo quando nada faz
para o bem público. Há já até quem acredite que ele vai resolver o problema do
lixo, sob o qual se afunda a periferia de Luanda.
No seu currículo, o governador conta com passagens por três governos provinciais, incluindo como presidente da Comissão de Gestão de Luanda, em 2004.
No seu currículo, o governador conta com passagens por três governos provinciais, incluindo como presidente da Comissão de Gestão de Luanda, em 2004.
Vale a pena uma breve resenha sobre as suas
obras enquanto governador.
No Kwanza-Sul (1999-2002), para além de ter sido
aplaudido por introduzir o ensino superior na província, mereceu louvores
por ter inaugurado o Festival do Sumbe (FestiSumbe) em 2001, pela criação da
Feira Agro-Pecuária, a reabilitação da Marginal e o Jardim das Misses. No
entanto, conta-se como a sua maior realização o estabelecimento da sua própria
fazenda, em Calulo, entre outros projectos empresariais pessoais.
Já no Kuando-Kubango (2012-Jan. 2016), o seu
mais recente cargo, o governador deu maior visibilidade pública às terras do
fim do mundo, como é conhecida a província.
Nos seus anos de gestão, são-lhe creditadas,
como obras de vulto, a reabilitação das duas pontes que interligam a cidade, e
a construção de uma ponte de ligação entre a província e a Namíbia, pelo Calai.
Recebeu boa nota por ter providenciado habitação e viaturas a alguns
funcionários relevantes da província, como parte da sua política de valorização
de quadros. Foi durante a sua gestão que se estabeleceu a abertura da
Universidade do Cuito-Cuanavale, assim como a construção da central térmica do
município com o mesmo nome.
O empresariado local foi praticamente
erradicado. As empresas ligadas ao general tomaram conta dos grandes negócios
envolvendo o erário público. Projectos turísticos de luxo, alguns ligados à
caça de elefantes e leões, passaram a ser do seu domínio particular. O garimpo
de diamantes no Luiana, na zona do Rivungo, ganhou grande dimensão no seu
consulado. Os serviços administrativos deterioraram-se.
Contrariamente ao que esperam os luandenses, no
Kuando-Kubango, o general deixou bastante lixo. O saneamento básico e a limpeza
da cidade capital da província, Menongue, está pior. Os funcionários da empresa
Sopolang, encarregada da limpeza da cidade, estão sem salários há seis meses,
porque o governo provincial não paga.
No hospital pediátrico local morrem, em média,
duas crianças por dia, devido à falta de medicamentos básicos e de atendimento
adequado. Na maternidade local, são realizadas cirurgias à luz de velas.
Portanto, estamos bem servidos. O país é deles
Sem comentários:
Enviar um comentário