Não houve uma declaração séria sobre o crescimento inclusivo ou
inclusão na divisão de renda proveniente da exploração dos recursos naturais. É
um ponto que interessava à sociedade civil, principalmente dos países pobres
Rio
de Janeiro (Canalmoz) – Fracasso: é a palavra mais usada aqui no Brasil e pelo
mundo fora para classificar a Conferência das Nações Unidas sobre o
Desenvolvimento Sustentável, que terminou na última sexta-feira, no Rio de
Janeiro e que juntou perto de 193 chefes de Estado e de Governo. Fracasso por
duas razões: a primeira porque não foi a cimeira que se esperava ao nível de
comprometimento e participação dos chamados “grandes” (EUA, Alemanha e
Inglaterra). Segundo porque mesmo sem os grandes, o texto final foi feito a
escopo e martelo e entregue sob pressão e elevado stress, o que precipitou que
muitos assuntos considerados “chave”, fossem empurrados para o futuro.
Claro
que por outro lado estão os organizadores como Ban kin-moon e a presidente do Brasil
Dilma Rousseff à frente do batalhão de um conjunto de Chefes de Estado que por
força da “boa imagem” e “diplomacia de convencimento” estão a defender que foi
um sucesso porque se alcançou os objectivos traçados, pois em única voz dizem
que o evento “serviu para traçar uma agenda comum no desenvolvimento
sustentável”.
Quem
não teve papas na língua para chamar o fracasso pelo seu próprio nome, foi o
presidente do Equador Rafael Correa. Aquele estadista foi um dos poucos que
exteriorizou o seu desapontamento com o evento. “A cimeira foi um autêntico
fracasso” disse para depois explicar que a cimeira não trouxe nada de novo pois
não houve acções concretas. “A reunião foi um fracasso, o documento final foi
lírico, não há concretizações, compromissos concretos, mensuráveis ou
controláveis portanto tudo continuará igual”. Eis a radiografia feita pelo
chefe do Estado equatoriano, que aliás torna-se uma espécie de cereja no topo
do bolo quando aliado aos discursos das organizações da sociedade civil que de
resto foram os principais protagonistas da cimeira, ao fazerem o Brasil
transpirar na elaboração, entrega e correcção do documento final.
Até
porque o explícito desapontamento do Equador tem alguma razão, se se tiver em
conta que aquele País trazia um ponto para ser incluído no texto final que não
chegou a acontecer. Porque simplesmente foi rejeitado. O Equador tinha pedido a
flexibilização das regras de propriedade intelectual para as chamadas
“tecnologias amigas do meio ambiente”. O lobby para inclusão deste ponto não
funcionou.
Os pontos que corporizam o mega-fracasso
Recorde-se
que o texto distribuído na última terça-feira, pelo Brasil, a chamada
declaração final da Rio+20, é intitulado “o Futuro que Queremos”. E como os
brasileiros (críticos) não brincam quando o assunto é apelidar coisas, já
chamam ao texto de “o Futuro que não queremos”. O texto mantém em sua redacção
um ponto considerado polémico, contestado pelos países ricos, mas considerado
inegociável pelos em desenvolvimento: o princípio das responsabilidades comuns,
mas diferenciadas.
O
princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas refere que os países
mais ricos devem arcar com a maior parte dos custos ambientais por terem-se
desenvolvido às custas de energias poluentes. É uma directriz da política
internacional acordada na Rio92. Apesar de se ter mantido o ponto, os países
ricos já deixaram claro que o assunto ficará mesmo pelo papel. Não há dinheiro!
Sobre
o financiamento de projectos de desenvolvimento sustentável, os países ricos,
tradicionais financiadores de programas ambientais e os mais afectados pela
crise internacional, rejeitaram comprometer-se com novos fardos de ajuda
financeira.
A
criação de um fundo de 30 mil milhões de dólares para o financiamento de acções
voltadas à sustentabilidade, proposta pelo G77 – grupo que reúne os países em
desenvolvimento, incluindo China e Brasil – foi excluída do texto final, sinal
claro da desistência dos países desenvolvidos em carregar o fardo dos pobres.
No documento foi incluída uma “cesta” de formas de financiamento para as
acções, com fontes privadas e instituições financeiras. Também está tremida.
O
texto final também lança os “Objectivos de Desenvolvimento Sustentável”, que
comprometerão todos os países com metas sócio ambientais e substituirão os
Objectivos do Milénio da ONU, que expiram em 2015. Dito em outras palavras,
todas as decisões consideradas cruciais foram adiadas.
Hiraly Clinton chegou, falou e partiu
Com
a já anunciada ausência de Barack Obama, esperava-se uma outra representação
dos Estados Unidos, um dos principais se não o mais influente player quando os
assuntos são de escala mundial, como foi o caso da cimeira. No lugar de Obama
foi à Cidade Maravilhosa, a secretária de Estado americana, Hilary Clinton.
Chegou no último dia com o habitual e incomum aparato de segurança e fez um
discurso à altura do fracasso que já havia sido anunciado. Hilary defendeu os
direitos reprodutivos da mulher e uma economia de inclusão como garantia de
prosperidade. O recado era para os países pobres que albergam dirigentes
faustos que perfilam nas paradas internacionais de fortuna “individual”.
A vizinhança que tramou o Brasil
A
praga para que o Rio +20 desse no que deu, não veio só da sociedade civil que
esteve em peso na Cidade Maravilhosa. É que o evento aconteceu numa altura em
que a concentração máxima era requerida em outros países bem aí ao lado da
terra do samba. Primeiro os países ricos ou em via de, incluindo o próprio
Brasil, decidiram acampar até um dia antes da Rio +20, no vizinho México, mais
concretamente na cidade de Los Cabos para discutir a saída para a crise que até
aqui já criou vítimas políticos (Grécia, Itália, França, Portugal, Irlanda
entre outros). Todas as atenções estiveram viradas para lá. Obama, Merkel, Cameron
estiveram no México mas não foram ao Brasil. Por cansaço? Ninguém sabe.
Enquanto
se digeria a cimeira, em tom de que deveria ter acontecido em outro lugar e
numa outra data para não ofuscar a Rio+20, no vizinho Paraguai a classe
política roubava atenções do mundo. O parlamento marcava um decisivo passo rumo
ao impeachment sem violência que derrubava o presidente paraguaio Fernando
Lugo. Mais uma vez os líderes deixaram de pensar na Rio +20 para elaborar
discursos de reacção àquele acontecimento político.
Guebuza fala de acordo possível
Quem
também não escondeu o seu desejo de “um encontro mais decisivo e concreto”, se
bem que de forma muito cautelosa, foi o Presidente da República de Moçambique,
Armando Guebuza, que também esteve no Rio de Janeiro. Guebuza descreveu como
“possível” o acordo alcançado entre os chefes de Estado e fez uma avaliação
positiva da cimeira.
Refira-se
que o Estado moçambicano, procedeu no Rio de Janeiro ao lançamento do Roteiro
nacional para a economia verde. É basicamente a estratégia de Moçambique a
curto e longo prazo para a preservação do meio ambiente. (Matias
Guente, nosso enviado ao Rio de Janeiro)
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