quinta-feira, 21 de junho de 2012

Desmobilizados Dispersos a Tiro. Por Rafael Marques de Morais


Centenas de desmobilizados realizaram na manhã de hoje, Junho 20, uma manifestação de protesto, em Luanda, que causou pânico na cidade. Os antigos combatentes reclamam o pagamento das suas pensões, muitas das quais em atraso desde há 20 anos.
Junto ao largo da Maianga, para onde convergiu o grupo, que tencionava marchar para o Palácio Presidencial, um forte aparato da Polícia de Intervenção Rápida e da Polícia Militar dispersou os manifestantes a cassetete e com gás lacrimogéneo. Vários ex-militares apedrejaram as autoridades. Perto de 50 viúvas de guerra juntaram-se também ao protesto para exigir as pensões que lhes são devidas.
Outro grupo marchou em direcção à Embaixada Americana, tendo sido repelido no largo do Cemitério do Alto das Cruzes, também com uso de gás lacrimogéneo e cassetetes. As autoridades recorreram também ao uso da cavalaria e da brigada canina, canhões de água, entre outros meios de prevenção anti-motim.
Como medida preventiva, a guarda presidencial reforçou o cordão de segurança à volta do Palácio Presidencial tendo para o efeito encerrado, por algumas horas, o trânsito nas vias de acesso. Durante a noite, é visível o estado de alerta da Polícia Nacional, na cidade, e da Guarda Presidencial no perímetro do palácio.
Há cerca de duas semanas, a 7 de Junho, os desmobilizados surpreenderam as autoridades ao realizarem uma manifestação defronte do Ministério da Defesa, que se situa no perímetro do Palácio Presidencial. O chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas (FAA), general Geraldo Sachipengo Nunda, dialogou com uma comissão dos ex-desmobilizados e deu garantias de resolução dos seus problemas na semana seguinte.
No mesmo dia, à noite, o Ministério da Defesa e o Estado-Maior General das FAA emitiram um comunicado conjunto em que assumiam o compromisso de pagar os subsídios dos ex-militares “tão breve quanto possível, através do sistema bancário nacional”. No referido comunicado, o exército apelava “à calma e compreensão de todos os ex-militares, porque já foram tomadas as medidas necessárias para resolver a situação”.
Eurico Jeremias, de 54 anos, está à espera dos seus subsídios desde há 20 anos. Foi desmobilizado em 1987, após 16 anos de serviço militar, após ter perdido o olho direito numa batalha. “Vimos manifestar-nos frente à embaixada americana, porque o nosso governo não nos ouve. Aqui, fomos travados pela cavalaria, a brigada canina e o gás lacrimogéneo que atiraram contra nós”, disse o manifestante.
Na confusão gerada, vários manifestantes reportaram alguns feridos e um morto. No entanto, o porta-voz do Comando Provincial da Polícia Nacional, Nestor Goubel, garantiu que não houve quaisquer vítimas mortais.
Os manifestantes, dispersos também da zona do Cruzeiro, junto da Embaixada Americana, marcharam para o Comando do Regimento de Transmissões do Exército, no Bairro Mártires de Kifangondo, conforme aconselhamento prestado por altos oficiais que se encontravam no local. É no referido comando que decorre a organização do processo administrativo para o pagamento dos subsídios dos ex-militares.
O ex-soldado Ruben, de 42 anos, até às 17h00, encontrava-se no interior da unidade, com mais de 200 companheiros seus. “Aqui nós só queremos uma solução. Ou pagam ou não pagam. Estamos fartos de conversa”, disse Ruben por via telefónica. O veterano de guerra disse também que dentro da unidade se encontravam cercados e com os portões encerrados, impedindo a sua saída ou a entrada de outros companheiros seus.
Até ao momento de publicação deste texto, um forte aparato conjunto da Polícia de Intervenção Rápida e da Polícia Militar, continuava a dispersar centenas de descontentes no exterior da unidade.

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