terça-feira, 19 de junho de 2012

Monarquia Guebuziana. Editorial



Maputo (Canalmoz) – Nas hostes do partido Frelimo não se fala de outra coisa que não seja de “Guebuza”; do ADN de Guebuza; de quem vai continuar no poder, de quem vai servir Guebuza para ele continuar a mandar na sombra; de quem se vai servir Guebuza; se no X Congresso vai ou não ser eleito um outro membro para o cargo de presidente do partido; se no congresso de Pemba vai ou não ser anunciado o candidato da Frelimo às presidenciais de 2014; se o candidato vai ser o actual secretário-geral; se o candidato à Presidência da República irá passar a ser o próximo secretário-geral; se o Congresso irá remeter para decisão do Comité Central que será eleito em Pemba a escolha do candidato a PR nas presidenciais de 2014, enfim… São imensas as variáveis. Uma, no entanto, parece irrebatível: a vontade de Armando Guebuza se tornar uma espécie de monarca e não permitir a deslocação do poder para outras coordenadas do País, perante um quadro de investimentos altamente apetitoso, na sua esmagadora maioria entre o rio Save, na confluência das províncias de Sofala e Inhambane, e o rio Rovuma, que faz fronteira com a República Unida da Tanzania.
As personalidades que conhecem a história de Armando Guebuza na sua trajectória política são de opinião que está tudo em aberto, mas seguramente que Guebuza já tem tudo planeado ao pormenor. Todos eles são ainda da opinião que os que se sentem enganados por Guebuza, os que o levaram ao mais alto posto no partido e a ser candidato à Presidência da República e depois a fazer com que ele lá tenha chegado e por lá se tenha mantido à custa das artimanhas que se conhecem, não terão hoje o mesmo poder para acabar com as suas veleidades que tiveram para afastar Joaquim Chissano daquela forma desprestigiante de que aqueles com um pouco de memória ainda se lembrarão. Sim, desprestigiante…foi empurrado ou não é verdade?! Tentou também ficar por lá mas acabou por ser traído. Deram-lhe depois o cargo de presidente Honorário do partido, mas para não poder andar por aí a choramingar que o puseram desfocado na fotografia…
O actual chefe de Estado não pode, por força da Constituição da República de Moçambique, continuar na mais alta magistratura do Estado, porque o cargo de Presidente da República a que é inerente o cargo de chefe do Governo, está limitado a dois mandatos.
O Artigo 146 da Constituição da República de Moçambique (CRM) define que o Presidente da República é o chefe de Estado, e o Presidente da República é o chefe do Governo. Já o Artigo 147 define que o Presidente da República só pode ser reeleito uma vez e o Presidente da República que tenha sido eleito duas vezes consecutivas só pode candidatar-se a eleições presidenciais cinco anos após o último mandato.
Da apreciação desses dois artigos sobra matéria para se perguntar se Armando Guebuza, não podendo ser o candidato do partido Frelimo em 2014, porque mesmo que haja uma Constituição nova seria suposto que Guebuza não pode sequer candidatar-se sendo a actual ainda que vigora, assim ele poderia ser designado Primeiro-Ministro, pelo próximo presidente da República eleito, tendo ele sido chefe do Governo ao abrigo do artigo 146 da CRM?
Filipe Paúnde, secretário-geral da Frelimo, já veio mandar passear todos os membros do partido que supunham que poderiam ter alguma coisa a dizer no próximo Congresso, em Setembro próximo, em Pemba. Para Paúnde é um dado assente que Guebuza vai continuar a ser o presidente do partido de ambos.
Fica também por se saber se no X Congresso vai ser eleito o candidato do Partido Frelimo às próximas eleições para Presidente da República.
De dentro do partido Frelimo saem vozes a alegar que Guebuza tem os seus apoiantes em campo a comprar delegados ao Congresso para que tudo lhe saia de feição em Pemba.
Nesse contexto, recordam-se os que bem o conhecem que “o ADN de Guebuza” não lhe permite deixar as coisas fluírem livremente. “Ele prevê tudo até ao detalhe”. Daí se pode crer que Filipe Paúnde está instruído para vir a público dizer que Guebuza vai continuar presidente do partido e ponto final!.. Democracias à parte, é assim é assim!...
Mas a afirmação de Paúnde não foi bem aceite por todas as alas do partido Frelimo, daí se antevendo que mesmo que tudo possa parecer sereno, no quadro do cinismo político é de prever que os tempos mais próximos no País não vão ser pacíficos e daqui para a frente estará mais presente a luta pelo poder do que a governação.
Agora então com o dinheiro dos recursos minerais a servirem de atracção, que “marrabenta” se irá dançar?
Guebuza estará a preparar-se para como presidente do partido Frelimo continuar a mandar na bancada da Assembleia da República, a mandar no Presidente da República, e a mandar no Primeiro-Ministro se não se fizer ele mesmo ao cargo, impondo-se.
Teríamos um Armando Guebuza presidente da Frelimo e Primeiro-Ministro se a Frelimo hipoteticamente ganhasse as próximas eleições legislativas e presidenciais. É um quadro que nos aconselham a não subestimar.
Sendo pouco provável que Guebuza alguma vez aceitasse parecer de algum modo subordinado de um eventual próximo presidente da República do seu partido, na qualidade de primeiro-ministro – para todos os efeitos o primeiro dos ministros e não propriamente o chefe do Governo –, o mais provável seria que ele se contentasse em ficar como presidente da Frelimo apenas.
Se Guebuza não continuar como presidente da Frelimo acaba a sua carreira política ou pelo menos passa para a segunda divisão durante uns anos se não for definitivamente. A sua idade não ajuda a retornos e muito menos se acredita que a história de Moçambique se possa vir a escrever de frente para trás só para acomodar um cidadão com aspirações monárquicas. Se Guebuza se retira não deve voltar em 2019. Já não tem saúde para isso. E idade…
A acontecer o cenário de que aqui hoje traçamos um esboço, isto é, a hipótese de Guebuza manter-se como presidente do seu partido, este cidadão seria o primeiro empresário a mandar no País e nas suas instituições caso nas eleições a parte que ele não pode fazer sozinho lhe saísse a gosto. Moçambique deixaria de ter Estado. Passaria a ser dirigido por uma associação de direito privado que persegue fins políticos – o partido Frelimo.
Moçambique deixaria definitivamente de ter Estado.
O ADN de Armando Guebuza permite tais sonhos. Ficar em posição de promover a demissão do Primeiro-Ministro e de ministros que não lhe obedeçam; Estar em posição que permita mudar as pedras na bancada da Frelimo na Assembleia da República sempre que suspeite de alguma contrariedade; Estar capaz de usar o poder para inclusivamente patrocinar o “impeachment” do próprio PR na eventualidade de ser um do seu próprio partido, ou até de um PR de outro partido ou coligação, caso o partido Frelimo conseguisse continuar a ter maioria absoluta no Parlamento, não é nada que o Senhor Guebuza não possa ter arquitectado.
Por todas essas hipóteses e mais que aqui não dissemos, mais do que eleger um presidente da República e eleger deputados nas próximas Eleições Gerais (Presidenciais e Legislativas) de 2014, por este andar da carruagem no seio do Partido Frelimo o País poderá ter de optar entre um cidadão que se guindará a Rei pondo e dispondo a seu bel-prazer de nós todos e das riquezas do País, ou dizer definitivamente aos políticos que quem manda em Moçambique é o povo em quem reside a soberania.
Falando-se ultimamente de Filipe Nhussi como o homem que poderá ser o candidato à Presidência da República pelo Partido Frelimo como figura de charneira entre as pretensões de Guebuza e a ala maconde dos veteranos Chipande e Pachinuapa, não sendo ele o presidente do partido, o que se poderá esperar caso atinja a chefia do Estado?
Que papel irão jogar os “camaradas” de Cabo Delgado e do Centro e Norte do país com as minas e tanta coisa mais a aflorar por aquelas bandas? Vão deixar passar a banda ou vão-se impor? O que dirão os eleitores nas eleições de 2014 que no que respeita às questões internas do partido Frelimo não são pessoas a levar em conta?
Para esse momento até pode ser que os “camaradas” vencidos ajudem um candidato da actual oposição a chegar à Presidência da República. Já se viu disso em autarquias…Mas isso é coisa que não entra para já na equação que se cinge ao jogo para o X Congresso…
Se Guebuza se mantiver como presidente do partido Frelimo, Filipe Paúnde terá o seu quinhão assegurado e talvez por ver essa hipótese no horizonte esteja a ser tão prestável a certos papéis. É inclusivamente da terra da pretendente a “rainha”, a muito activa Primeira Dama. Tão pretendente que até há quem ponha a hipótese de Guebuza ter na manga uma jogada peronista.
“Não há nada que Armando Guebuza não seja capaz de fazer”. Pena que Samora já cá não está para contar e tirar a quem as tiver certas dúvidas…
Resta saber até que pondo o partido Frelimo em si acabará por admitir tornar-se um reduto monárquico, a holding de Armando Guebuza.
O tempo o dirá… (Canalmoz / Canal de Moçambique)
Imagem: Charge de Dom Pedro, às vésperas Independência do Brasil.
mestresdahistoria.blogspot.com

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