Angola. Um comunicado ou uma insensatez
Em
1965, no Congo - Brazzaville na base do Movimento, por orientação de Agostinho
Neto, o ex-vice-presidente do MPLA, Matias Miguéis, foi enterrado vivo, tendo
ficado a cabeça por dois dias de fora, para receber todo tipo de humilhações
até sucumbir. O actual bp do MPLA sabe, quantas crianças soldados e
guerrilheiros assistiram aquela barbárie?
Em
1975 em Luanda fiz parte do grupo de contra-informação, que “invadiu” o então
hospital universitário de Luanda (actual Américo Boavida) e de lá retiraram,
crianças mortas, corações, fígados e outros órgãos humanos, que serviam de
objecto de estudo, aos alunos do curso de medicina, para os colocar nas Casas
do Povo da FNLA, acusando-os de canibalismo e de comerem pessoas. Tese que
vingou e perdura por muitos anos. Será que o actual bp do MPLA já pediu
desculpa aos angolanos e a FNLA, sobre essa mentira? Eu penitenciei-me, ainda
Holden Roberto estava em vida e junto da actual direcção da FNLA. Ngola Kabangu
e pares podem confirmar?
Maputo
(Canalmoz) – Esta peça é da autoria do jornalista angolano William Tonet,
director do semanário “Folha 8”. Publicamo-la com a devida vénia:
“Hoje
sou forçado a reconhecer, o país está sem rumo, porque os actuais timoneiros
estão sem norte.
Tudo
por se esquecerem ser a “política uma navegação”, e por assim ser, não faz
sentido o extremar de posições, para responder a um arrazoado de insensatez,
condensada num denominado comunicado público do bureau político do MPLA do dia
20.06.2012.
No
espaço mental de um povo, carregador do seu destino e de muitas agruras, não
colhem o tempo todo, o impingir de mentiras, insultos e imprecisões, por mais
refinadas que sejam.
Quando
um bureau político, órgão executivo de um partido se reúne, em momento de
crise, não pode fazê-lo, para atender, exclusivamente, uma personalidade, que
considera banal, irreferenciável e que nunca fez parte da estrutura dos seus
quadros que se bateram pela independência nacional etc., sob pena de não ser
levado a sério, tantos são os candentes problemas do país.
As
ideias percursoras e orientadoras seguem rotas projectadas com segurança,
susceptíveis, porém, das correcções que os dados circunstanciais aconselhem ou
obriguem.
Não
me compete, enquanto cidadão (William Tonet), provar nada, o inverso é que é
verdadeiro, mas ainda assim vamos ver quem mais facilmente se coloca na pele da
mentira.
O
actual MPLA diz ter sido fundado em 1956, mas os dados não conseguem demonstrar
a existência, naquele ano de nenhum partido ou movimento de libertação com esse
nome, tão pouco existe registo e aposição de assinaturas dos seus subscritores
na constituição.
É
possível existir um filho sem pai e mãe? Quem foram afinal os fundadores?
Quem
fabrica uma data de nascimento e persiste nela, mesmo tendo-se alterado o
quadro inicialmente motivador, faz o quê?
Em
1965, no Congo - Brazzaville na base do Movimento, por orientação de Agostinho
Neto, o ex-vice-presidente do MPLA, Matias Miguéis, foi enterrado vivo, tendo
ficado a cabeça por dois dias de fora, para receber todo tipo de humilhações
até sucumbir. O actual bp do MPLA sabe, quantas crianças soldados e
guerrilheiros assistiram aquela barbárie?
Em
1966, foi queimado numa fogueira, logo barbaramente, assassinado, na Frente
Leste o abnegado e valoroso comandante Paganini e mais seis outras pessoas,
acusados de feitiçaria e tentativa de golpe à direcção de Agostinho Neto, em
Brazzaville. Quem passados 38 anos depois da proclamação da independência,
omite isso na sua história faz o quê?
Continuemos.
a) Consta dos arquivos
da PIDE, que repousam na Torre do Tombo, em Lisboa, que Guilherme Tonet (meu
finado pai), fundou, em 1960, a FPLA (Frente Popular de Libertação de Angola),
partido responsável pela manutenção dos núcleos de guerrilha em Luanda depois
da sublevação do 4 de Fevereiro de 1961 e ainda o criador de uma região
militar, na zona dos Dembos e Piri, que viria posteriormente a converter-se na
1.ª Região Político Militar do MPLA. Guilherme Tonet partiu, consta, também,
para os húmus libertários, com seu filho primogénito (William Tonet), então com
três anos de idade.
b) O cartão de pioneiro
n.º 485, atesta WT como sendo natural da 1.ª região político - militar do
MPLA. Nas matas, as crianças não andavam a brincar a cabra seca, eram
“guerrilheiros-mirins”, servindo de antenas e carregadores dos guerrilheiros.
Desde os sete anos de idade que acompanhava o comunicador, vulgo radista,
especialidade em que me viria a notabilizar. Fui criança soldado…
c) Na tentativa de
abertura de mais uma frente, no Planalto Central, em 1968, o grupo de
guerrilheiros foi preso, dentre eles o meu pai, que viria a ser desterrado para
a cadeia de São Nicolau. Lá encontrei, estudei e convivi, com um dos actuais
membros do bp do MPLA, Bornito de Sousa. Ele pode dizer quem mente e o que
fazíamos no campo…
Por
tudo isso, brada aos céus a presunção de monopólio, do actual bp do MPLA, de
todos quantos se bateram pela independência durante a luta de libertação,
principalmente por parte de uma direcção que estava instalada em Brazzaville,
quando afirma: “o cidadão William Tonet nunca pertenceu ao movimento
guerrilheiro, dirigido pelo MPLA, no período de luta pela independência
nacional de Angola, nem integrou qualquer estrutura ou força governamental, que
se tivesse envolvido directamente, na luta pela preservação da independência ou
pela defesa da integridade do solo pátrio”, lê-se no comunicado. Entretanto o
membro do actual bp, Dino Matross, tem conhecimento que o meu cartão de
militante do MPLA tem o n.º 1.135, cujo processo, disse o dr. Lau, presente na
audiência, ter desaparecido, quando transportavam, em carrinha caixa aberta, os
ficheiros de alguns militantes da Segurança de Estado, para a sede do MPLA.
Isto foi tudo discutido em 2004, no gabinete do actual secretário geral do
“EME”, que me solicitou fotos, para a reconstituição do processo. E se dúvidas
houver, João Paulo Nganga estava presente nesta reunião.
O
actual bp do MPLA esqueceu-se que determinar a posição na linha de pensamento e
inflectir segundo as conveniências de momento são recursos que o mais
experimentado navegador não despreza e de que se vale em determinados momentos.
Alcançar o objectivo depende do modo e jeito de persegui-lo.
O
desnorte é mau conselheiro, porque os dados assim o desmentem. Quem não tem
noção da ponderação necessária em política, nos momentos de crise, pode
reduzir-se ao ridículo.
Vejamos:
a) Lembra-se o actual bp
do MPLA, de todos os membros que estiveram na comissão de redacção do congresso
de Lusaka de 1974? Eu sim! Quem mente?
b) Sabe o actual bp do
MPLA, dos nomes dos guerrilheiros que vieram, em 1975, no primeiro navio de
cimento a partir de Cabinda? O MPLA deve assumir se tinha ou não nas suas
fileiras crianças-soldados, antes e depois da independência. Isto para se
aferir quem mente…
c) Em 1975 em Luanda fiz
parte do grupo de contra-informação, que “invadiu” o então hospital
universitário de Luanda (actual Américo Boavida) e de lá retiraram, crianças
mortas, corações, fígados e outros órgãos humanos, que serviam de objecto de
estudo, aos alunos do curso de medicina, para os colocar nas Casas do Povo da
FNLA, acusando-os de canibalismo e de comerem pessoas. Tese que vingou e
perdura por muitos anos. Será que o actual bp do MPLA já pediu desculpa aos
angolanos e a FNLA, sobre essa mentira? Eu penitenciei-me, ainda Holden Roberto
estava em vida e junto da actual direcção da FNLA. Ngola Kabangu e pares podem
confirmar?
d) Ainda em Luanda, no
bairro Vila Alice, no quadro das actividades dos “Comités Ginga”, em 1975,
antes da proclamação da nossa Independência, sob coordenação do nacionalista
Guilherme Tonet, que organizava e ministrava cursos de formação de activistas
pró-MPLA, dos quais se salienta o Curso de Monitores Político - Militares, em
que participaram uma pléiade de jovens que mais tarde desenvolveram acções de
realce em prol da construção da Pátria angolana. O espaço reservado para as
referidas aulas situava-se na residência do saudoso Guilherme Tonet, que na sua
acção formativa contou com o apoio do seu filho primogénito William Tonet, cuja
missão primordial se centrava na produção, impressão e distribuição dos
materiais que serviram de apoio aos formandos. Eis alguns nomes dos participantes
nas actividades formativas levadas a cabo por Tonet:
Ana
Dias Lourenço - actual Ministra do Plano
Luís
Carneiro “Luisinho” - Administrador do Município do Libolo (Kwanza Sul)
Evelize
Fresta - Vice Ministra da Saúde
Mariana
Afonso Paulo - médica e Deputada à Assembleia Nacional pelo MPLA
Ana
Maria de Sousa Santos “Nani” - Secretária Adjunta do Conselho de Ministros
Pedro
de Almeida - Médico e ex-Jornalista
Fernanda
Dias - Médica e empresária da Empresa Cemedic
Artur
Nunes - músico, desaparecido na sequência do fatídico 27 de Maio de 1977
Sara
Bernardete Barradas e Maria da Conceição Guimarães, ex-jornalistas.
Estes
são alguns nomes dos muitos jovens que receberam formação política em prol do
MPLA no período que antecedeu à proclamação da Independência Nacional e que
integraram os múltiplos Comités de Auto-Defesa (braço armado embrionário do
MPLA na cidade de Luanda) sob
tutela
dos Comités Ginga espalhados nos bairros como Sambizanga, Prenda, Golfe,
Cazenga, Marçal, Rangel, Bairro Popular, Ilha de Luanda, Ingombota, etc.
e) WTonet, foi um dos
comandantes que levou pioneiros de Luanda, ao Largo 1.ºde Maio, afim de
servirem de porta bandeira, na noite de 11 de Novembro de 1975, data da
proclamação da Independência. Um destes pioneiros, dentre outros, foi Toninho
Van - Dúnem, ex-secretário do Conselho de Ministros.
f) Em 1976, era um do
estado-maior das Comunicações da 9.ª Brigada das FAPLA, tendo sido nessa
condição, colocado, por orientação da Comissão Executiva do MPLA, no gabinete
do Comandante Nito Alves, para a área juvenil e de mobilização em Luanda.
Participou nas várias reuniões preparatórias e electivas, dos membros das
Comissões Populares de Bairro. Foi autor, na campanha de diabolização do
adversário político, mais temeroso da altura, da expressão, que viria a ser
musicalizada: “Holden é como camaleão”! “Ele é lacaio do imperialismo
internacional”, num dos comícios no campo de São Paulo, em Luanda! O actual bp
do MPLA pode desmentir isso?
g) Em 1977, por ocasião
do 27 de Maio foi preso, sem culpa formada, pelo agente da DISA, Carlos Jorge,
– tcp –(também conhecido por), Cajó, acusado de fraccionismo, na companhia de
seu pai, Guilherme Tonet, mais dois tios, que viriam a ser enterrados vivos.
Cajó, famoso algoz, continua vivo e é uma referência deste MPLA.
h)
William Tonet está registado com o n.º 5369/86, como Antigo Combatente (vide
cartão), emitido no período de partido único, onde o rigor de pendor comunista
era mais acentuado. O processo foi constituído e repousa nos arquivos da então
Secretaria de Estado dos Antigos Combatentes, tendo sido emitido aos 28 de
Agosto de 1986, Ano da Defesa da Revolução Popular?
i) Nos anos 80 foi
delegado da TPA (Televisão Popular de Angola) em Benguela. Trabalhou ainda a
nível da JMPLA com a deputada do MPLA, Angela Bragança e com o actual
Presidente do Tribunal Constitucional, Rui Ferreira.
j) Na qualidade de
oficial de comunicações, especialista em interseção militar, foi requisitado em
nome do governo e na sua condição, para trabalhar, em diversas ocasiões com os
generais Kundy Pahiama, Fernando da Piedade Dias dos Santos “Nandó” (ambos
membros do actual bp do MPLA) e Fernando Garcia Miala, então chefe da Casa
Militar da Presidência da República. Reservo-me a não revelar mais segredos de
Estado, por hora.
k) Ainda na qualidade de
oficial e estado maior de comunicações militares, sua especialidade, trabalhou,
entre os anos 80 e 90, em muitas das grandes operações militares das FAPLA, nas
regiões Sul, Norte, Leste e Sudoeste, na criação de linhas de interseção, com
os generais, Ngueto, Faceira, João de Matos, Armando da Cruz Neto, Jorge
Sukissa, entre outros. Aliás nessa condição, com conhecimento do general João
de Matos, foi impedido, por ordem militar do comandante-em-chefe, José Eduardo
dos Santos de se retirar da Frente Centro. É estranho que o actual bp do MPLA,
desconheça esse pormenor, pois existem provas materiais.
l) Diz o comunicado do
actual bp do MPLA, que, repito, não acredito tenha sido subscrito por todos os
seus membros, que WT nunca “integrou qualquer estrutura ou força governamental,
que se tivesse envolvido directamente, na luta pela preservação da
independência ou pela defesa da integridade do solo pátrio”, fim de citação. O
acima exposto mostra isso? Para quê comentar.
m) Em 19 de Maio de
1991, após quatro dias de negociações directas entre William Tonet e os líderes
do MPLA e da UNITA, respectivamente José Eduardo dos Santos e Jonas Malheiro
Savimbi, foi assinado no Alto Cauango, Luena-Moxico, o Primeiro Acordo de Paz
de Angola, pondo fim a uma guerra de 57 dias, entre as tropas militares das
FAPLA/MPLA e FALA/UNITA, mediado por um angolano, William Tonet. Alguns dos
subscritores ainda estão vivos, os generais, Higino Carneiro, Nelumba Sanjar,
Chilingutila, Mackenzi, entre outros. Ou será que este acordo não existiu e foi
uma invenção minha, tal como a audiência concedida, logo depois no palácio
presidencial, no Futungo de Belas, por José Eduardo dos Santos?
n) A WT-MUNDOVÍDEO,
empresa que dirijo realizou várias acções e obras por orientação e solicitação
da Presidência da República, no Leste de Angola em 1991, nomeadamente no
fornecimento de combustível e medicamentos para as unidades militares e civis,
reparação da pista de aviação do Luena, de escola e do hospital. Foram
ordenantes o dr. José Leitão e Fernando Garcia Miala. Até hoje, depois de
estarem servidos, existe uma dívida, não paga, por José Eduardo dos Santos, que
com os juros ascende os USD 11 milhões de dólares.
Como
se pode verificar os factos falam por si, mas o importante é termos, enquanto
cidadãos, consciência de que a nau do MPLA/Governo singra ao acaso, impelida
por ventos estranhos, desprovida de pilotos responsáveis e conscientes da
nacionalidade a que pertencem. Apontam-nos, diria Mário Saraiva, envolvida na
névoa da distância, a mancha dúbia de “Um futuro Melhor”. Miragem paradisíaca,
ou holocausto da pátria. E de que lado está o actual MPLA? E o governo/JES?
Eles têm o dever de nos informar. Os angolanos têm o direito de, rigorosamente,
o saber! O povo tem de ter a consciência exacta de que aqui e agora se joga o
nosso destino humano e de angolanidade e é hora de fazer alguma coisa, sob pena
do país soçobrar.
Há,
de tempos a tempos, que tomar-se a altura do Sol para que a rota se não
extravie pela pela superfície movediça de factos e circunstâncias, num mar-alto
sem referências nem horizontes. Também hoje, “Angola vagueia num mundo
transformado e revolto, sem horizonte” nem pontos de referência angolanos.
É
pois em função, também deste comunicado, a hora de tomar o ponto da situação e
de corrigirmos os desvios de orientação, em nome da estabilidade do país e não
continuarmos passivos, ante a procissão dos corruptos, que pretendem a
continuação da discriminação e a promoção de uma nova guerra.
Estejamos
unidos. Defendamos a democracia e a Paz das armas alcançada, pois há quem nos
queira levar a uma nova guerra, forjando, tal como em 1977, bodes expiatórios. (William
Tonet / Canalmoz)
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