terça-feira, 4 de agosto de 2015

Angola à beira de um abismo. William Tonet






No actual des­calabro financeiro angolano, enxerta­ram-se num curto espaço de um punhado de meses, violações dramáticas dos direitos humanos consa­grados pela constituição da República de Angola. Umas dramáticas - sigam o nosso olhar para o geno­cídio indesmentível do 16 de Abril do ano em curso de mais de mil fiéis desar­mados e sentados a cantar a Deus no Monte Sumi, na província do Huambo -, outras grotescas, como a de que foram vitimados quinze jovens encontrados numa casa da Vila Alice a dissertar sobre uma obra considerada subversiva e atentatória à Segurança do Estado, o que deu origem a um estapafúrdio encar­ceramento por via de uma acusação quase poética de “tentativa de golpe de Es­tado”.
Os jovens foram imediata­mente encarcerados e pos­tos num estádio de isola­mento total durante 10 dias. Em seguida, foram levados para uma prisão situada a cerca de 70 quilómetros de Luanda, onde foram in­terrogados por agentes da autoridade estatal. Apenas quatro dentre eles tiveram direito a assistência de um advogado. Uma vergonha, um escarro judicial dado à queima-roupa pela Segu­rança do Estado na figura do chefe supremo!
(Figura de estilo volunta­riamente retorcida, pois as orientações vêm do Titular do Poder Executivo!)
No fundo de todas estas exacções (com cubanos, kalupetekas e revús), im­pera um facto: o regime deixa pouca coisa ao acaso, domina os media, nomeia os seus lacaios para dirigir as instituições que levam a cabo as eleições, coopta políticos da oposição e in­timida os opositores. Por isso se pode dizer que não há oposição em Angola. Reina o medo de ser assas­sinado.
E, nesta caminhada que Angola está a fazer rumo a uma verdadeira ditadu­ra, compete-nos relembrar que «o general Kopelipa presidiu a um aparelho eleitoral que deixou 3,6 milhões de pessoas im­possibilitadas de votarem: quase tantos votos quantos o MPLA teve. A percen­tagem de votos do MPLA caiu 9 pontos comparando com as eleições de 2008, mas registou ainda assim uma vitória esmagadora, com 72 por cento dos votos. No novo sistema, o primei­ro nome na lista do partido vencedor seria o presiden­te. Mais de três décadas de­pois de tomar o poder, José Eduardo dos Santos podia dizer que tinha um manda­to absoluto para governar “ad eternum”, apesar das revelações de uma repu­tada sondagem de opinião que mostravam que tinha a aprovação de apenas 16 por cento dos angolanos (Financial Times)».
Entretanto, cerca de meta­de da população de Angola vive abaixo da linha inter­nacional de pobreza de 1,25 dólares por dia. Para dar uma ideia, podemos dizer que a esses mais-pobres levarlhesia, a cada um, cerca de 260 anos para ga­nhar o suficiente que lhes permitisse comprar o apar­tamento mais barato no Kilamba.
O partido no poder prome­teu eletricidade na campa­nha eleitoral de 2008, mas pouca chegou e nada ou muita coisa sobrou da últi­ma promessa de abastecer água canalizada, feita no período que precedeu as eleições de 2012.
E entretanto, o governo gastou 1,4 vezes mais na Defesa do que na Saúde e na Educação em conjunto. Por comparação, o Reino Unido gastou quatro vezes mais em Saúde e Educação do que na Defesa.
Citemos ainda o Financial Times.
«Os generosos subsí­dios ao combustível são apresentados como um bálsamo para os pobres, mas na verdade, funda­mentalmente beneficiam os suficientemente ricos para poderem ter carro e os politicamente rela­cionados para ganharem uma licença de impor­tação de combustível. O governo de Angola meteu petro-dólares em contra­tos para estradas, habi­tação, caminhos de ferro e pontes a um ritmo de 15 mil milhões de dólares por ano, na década até 2012, uma soma enorme para um país com 20 mi­lhões de pessoas. As es­tradas estão melhores, os caminhos de ferro estão lentamente a chegar ao interior, mas a explosão na construção também se revelou uma benesse para os burlões: calculase que os subornos sejam responsáveis por mais de um quarto dos custos finais dos contratos de construção do governo. Além disso, muito do fi­nanciamento é feito sob a forma de crédito da China garantido pelo petróleo, sendo que muito desse crédito é controlado por um departamento espe­cial que o general Kopeli­pa dirige há anos».
Somos de opinião que só um abandono do poder por parte de José Eduardo dos Santos poderá evitar uma explosão social, quiçá uma banca-rota técnica.

Folha 8. 01 de Agosto 2015

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