Estive a acompanhar de perto a reacção de certos zambianos ao recente pedido de desculpas do governo de Michael Sata a Luanda por vários e sucessivos regimes de Lusaka terem, no passado, apoia¬do a UNITA. Vários comentado¬res insistiam que não havia ne¬cessidade de ter que se rebaixar assim tanto. O diálogo na Internet transformou-se num debate sobre nós: vários zambianos afirmaram que os angolanos são vaidosos, excêntricos e que só pensavam em si. Uma menina lançou, no fio da discussão, que entre todos os africanos, os homens que melhor sabiam amar eram os angolanos. Muitos intervenientes ficaram malucos e começaram a insul¬tar em Bemba e Nyanja, línguas zambianas, e a contar histórias de como, na Namíbia, África do Sul, Zimbabué e mesmo Botswana, os angolanos tinham a má fama de atraírem as mulheres dos outros por causa do seu dinheiro.
Por mais absurdo que seja, em muitos países africanos, os ho¬mens angolanos têm a fama de se¬rem grandes amantes. Há alguns anos atrás, em Kampala, a capi¬tal do Uganda, contaram-me que uma equipa de futebol angolana apareceu na capital e, acto con¬tínuo, surgiram certas ligações românticas instantâneas entre os jogadores e várias meninas que iam atrás deles. No momento de despedida, as meninas fartaram-se chorar: nunca, nas suas vidas, tinham sido amadas como o ha¬viam sido pelos angolanos. Diz-se que houve meninas que ficaram com tantos dólares que lhes per-mitiram abrir pequenos negócios. Os angolanos, neste caso, foram muito bons para a economia local.
Ultimamente, a ideia do ho¬mem angolano, como super-rico e ultra viril, tem sido celebrado nos telediscos. Para muitas jovens afri¬canas, a ideia de Angola tem vindo desses telediscos que, em certos casos, são filmados nos Estados Unidos. Há jovens que passam os dias a verem telediscos nos seus ecrãs. Os telediscos de muitos ar¬tistas angolanos são de uma qua¬lidade elevadíssima porque eles têm recursos para tal. E os temas nesses telediscos – alguns à beira da pornografia – são os mesmos: o cantor, com os seus músculos e óculos de marca, vai declarando o seu amor a uma menina giríssi¬ma num quarto maravilhoso. No fundo, pode-se até ver garrafas de Cristal, uma bebida que os artistas negros americanos adoram.
Nesses telediscos, a vida de cer¬tos artistas negros americanos, evidenciada nos seus telediscos, é que é mais admirada. Eles vivem em casas matulonas, com piscinas e salões de bilhar; as suas viaturas são gigantescas. Não há telediscos de gente desempregada, de famí¬lias que vivem em casas pequenas, de gente que se sente marginali¬zada. Os telediscos dos artistas negros americanos são verdadei¬ras hossanas ao consumismo, ao exibicionismo e a uma existência libidinosa.
Os angolanos, nos seus tele¬discos, repetem isso com mui¬ta fidelidade. Há meninas em Chinyanga, uma pequena vila na Tanzânia, perto do Lago Vitória, que pensam mesmo que a Angola verdadeira é aquela que elas vêem nos telediscos do Heavy C, Bruna Tatiana, Pather Mak, etc. E o an¬golano típico é, também, o jovem, cheio de músculos, apaixonadís¬simo a acariciar o objecto do seu amor. Há mesmo quem diga que, em muitas regiões da África, hoje, quando um casal jovem faz amor, há sempre três pessoas no quarto – o casal e um artista angolano, que vai alimentando a paixão e a fantasia da pobre mocinha. Mui¬tos homens africanos estão bem conscientes disso!
Se os vistos para Angola fossem fáceis, o país estaria inundando de jovens vindas de todo o lado à procura dos objectos das suas fan¬tasias.
Os telediscos congolenses têm tido, também, uma imensa influ¬ência nas africanas – mas os ho¬mens congoleses, com a sua obses¬são por trajos esquisitos, passam a ter um efeito cómico. Depois há mesmo o facto de que os angola¬nos cantam, na sua maioria, em português – uma língua que muito poucas raparigas africanas sabem sabe que está também associada à África. Para elas, os homens ango¬lanos dos telediscos passam a ser muito exóticos.
O cómico negro americano Ja¬mie Foxx também louva a energia do kuduro e a sensualidade dos angolanos; isto está no Youtube, a ser visto por milhares e a propagar esta noção desejável dos mwango¬lés.
Mas toda esta adulação desfaz-se por completo quando as pes¬soas entram em contacto com a realidade. Há alguns anos atrás, em Luanda, estive hospedado no mesmo hotel que a selecção femi¬nina de futebol do Ghana. Todas elas ficaram chocadas quando se depararam com a realidade ango-lana. Descobri que a noção delas de Angola tinha vindo dos tele¬discos. No hotel onde estávamos houve, a um certo momento, o problema de inundação: um tubo de canalização tinha rebentado e havia um grande problema por¬que estava a ser difícil convocar o senhor que tinha as ferramentas porque ele tinha ido a um óbito. Uma das ghanenses queixou-se que havia bolor no seu quarto. Outra disseque ninguém ainda ti¬nha lhe convidado para ir dançar Kizomba. Ela disse-me, também, que estava muito decepcionada: pensava que Angola estava cheio de homens lindíssimos. A reali¬dade era muito diferente. Suspeito que as ghanenses esperavam ser seduzidas de imediatos por bata¬lhões de modelos angolanos.
Espero que nos telediscos an¬golanos a imagem do angolano, como ele é – com as falhas e tudo – seja transmitida fielmente. Esta ênfase na venda de fantasias pode¬rá nos sair muito caro! ■
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