O
presidente José Eduardo dos Santos está em vias de nomear o general Fernando
Vasquez Araújo como responsável pela implantação da indústria militar no seio
de uma nova estrutura no Ministério da Defesa.
Por Maka Angola
A
decisão presidencial está a causar descontentamento ao nível da classe
castrense, por se tratar da reabilitação de um general que o próprio presidente
demitiu por alegados actos de corrupção.
A
1 de Outubro de 2010, na qualidade de comandante-em-chefe das FAA, José Eduardo
dos Santos ordenou a realização de um inquérito sobre alegadas negociatas do
então chefe do Estado-Maior General das FAA, general Francisco Pereira Furtado,
e do chefe da Direcção Principal de Armamento e Técnica do Estado-Maior General
das FAA, general Fernando Vasquez Araújo.
Três
dias após ter ordenado a inspecção, a 4 de Outubro, o presidente exonerou o
general Furtado.
A
Inspecção Geral das FAA deu como provado, na altura, o envolvimento de ambos os
generais em actos de corrupção e de gestão danosa. A 24 de Janeiro de 2012 o
presidente também exonerou o general Araújo.
Pode
portanto dizer-se que, à luz da iminência desta recondução do general Fernando
Vasquez Araújo a um cargo público, as investigações a que os dois generais
foram submetidos anteriormente nada mais provam do que a forma arbitrária com
que o presidente Dos Santos usa a legislação e os procedimentos
administrativos.
As Razões do Passado
O
general Furtado, na qualidade de chefe do EMGFAA, aprovou a contratação de duas
empresas suas, a CECICORP e a FUJOPEC, administradas pelo seu irmão Cipriano
Pereira Furtado e por César Pascoal, para a construção de seis edifícios nas
instalações do Instituto Superior e Técnico Militar, no Grafanil.
Por
sua vez, as referidas empresas subcontrataram a chinesa Su Jungie China Harbin
International para realizar o trabalho.
Mais
tarde, o general Fernando Vasquez Araújo, como chefe da DPAT do EMGFAA, entregou,
sem quaisquer formalidades, cinco máquinas de construção, incluindo de
terraplanagem, e quatro viaturas das FAA ao cidadão chinês Su Jungie, patrão da
empresa subcontratada. Este procedeu ao registo dos meios em seu nome, como sua
propriedade privada.
Em
sua defesa, ambos os generais chegaram a argumentar, através de informes ao
presidente, que o uso, para proveito privado, de património militar por
generais que os tutelam é um “hábito encontrado e reiterado” nas FAA.
Antes
do início do inquérito, a 20 de Setembro de 2010, o general Furtado escreveu ao
comandante-em-chefe com o intuito de provar a sua inocência. Anexou facturas da
Su Jungie a cobrar, às FAA, pelos meios que recebeu a custo zero das mesmas
FAA.
Para
resolver o imbróglio, o inquérito, à luz da Lei da Probidade, propôs a
instauração de procedimento criminal contra ambos os generais.
O
presidente, por sua vez, optou pelo arquivamento do caso.
Como
consequência dos esquemas sub-reptícios dos generais Furtado e Araújo, os 16
edifícios construídos pela Su Jungie, de quatro pisos e 16 apartamentos cada,
num total de 96 apartamentos, deverão ser demolidos em breve, devido a graves
problemas estruturais de construção. Os prejuízos estão avaliados em várias
dezenas de milhões de dólares.
Estranhamente,
há já muitos anos que o general Araújo tem sido um dos principais fornecedores
de bens alimentares às FAA, presenteado com contratos multimilionários, através
da sua empresa Trans Omnia. Nessa empreitada, o general tem como sócios os irmãos
Safeca: Alcides, secretário de Estado do Orçamento – Ministério das Finanças;
Aristides, secretário de Estado das Telecomunicações; e Amílcar, director da
UNITEL. O general Fernando Vasquez Araújo nunca foi incomodado com questões
acerca de tais actos ilícitos.
Este mesmo general é ainda sócio do projecto agro-industrial Terra Verde, na Funda, que foi inicialmente concebido por Arkady Gaydamak para abastecer as FAA, e que custou ao Estado largas dezenas de milhões de dólares.
Com
o chefe do Estado-Maior da Força Aérea Nacional de Angola (FANA), general
Francisco Lopes Afonso “Hanga” e cidadãos portugueses, o general Araújo é um
dos sócios da empresa privada Air Meco, que faz a manutenção das aeronaves da
FANA.
Sobre
a Air Meco, o África Monitor escreveu o seguinte, em 2012: “Os
sucessivos acidentes com aviões e helicópteros militares ocorridos nos últimos
anos têm sido internamente atribuídos a problemas de manutenção que comprometem
especialmente a empresa e o seu trabalho. É corrente em meios militares que a
empresa, movida por expectativas de lucros, não é suficientemente zelosa”.
O Exemplo – de
Impunidade – Vem de Cima
Ora,
a arbitrariedade e as contradições dos actos do presidente Dos Santos,
exemplificadas no caso dos generais Furtado e Araújo, tem um precedente no seu
próprio comportamento corrupto.
Nos
anos 90, o presidente foi o principal beneficiário dos esquemas de
enriquecimento ilícito através da compra de armas durante o conflito armado. As
armas eram adquiridas em segunda mão, muitas em estado obsoleto, por dois
traficantes de armas, Pierre Falcone e Arkady Gaydamak.
No
referido período, a Sonangol depositou cerca de um bilião de dólares em contas
de Pierre Falcone. Este mercenário francês cuidava de encaminhar parte desse
dinheiro para as contas pessoais do presidente José Eduardo dos Santos e dos
seus principais colaboradores.
Segundo
documentos compilados pela justiça francesa, pela venda de armas avaliadas em
mais de US $790.8 milhões, Falcone e Gaydamak distribuíram comissões aos dirigentes
angolanos no valor de US $54.3 milhões. O general Araújo, na época conselheiro
de Dos Santos, recebeu US $6.3 milhões, enquanto o comandante-em-chefe aumentou
as suas poupanças no Banco Internacional do Luxemburgo com US $ 5 milhões. Do
círculo restrito presidencial, o seu amigo embaixador Elísio de Figueiredo,
aprovisionou as suas contas bancárias com US $19 milhões, enquanto o então
chefe da Casa Civil do presidente, José Leitão, injectou nas suas contas em
Lisboa US $17.5 milhões; o então chefe de comunicações do presidente, o coronel
(hoje general) Leopoldino Fragoso do Nascimento, viu as suas contas no Banco
Comercial Português na Madeira aumentarem em US $3.2 milhões.
Os
generais Fernando Miala, Carlos Hendrick Vaal da Silva, Salviano Sequeira e
João de Matos, entre outros, também ganharam em comissões.
O
famigerado caso Angolagate envolveu também um complexo esquema de
corrupção para o pagamento da dívida angolana à Rússia, resultante da venda de
armamento. Falcone e Gaydamak pagaram um total de US $36.2 milhões em comissões
para contas tituladas directamente por José Eduardo dos Santos, o
comandante-em-chefe.
Em
resumo, o comandante-em-chefe tem sido ao longo das últimas décadas o principal
promotor da corrupção no seio das Forças Armadas Angolanas. Os generais
limitam-se a seguir-lhe o exemplo, trocando impunidade por lealdade e protecção
ao poder do chefe supremo.
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