As milícias de Laurent Nkunda, depois de capturarem Rutshuru, começaram a avançar até Goma, onde o Exército congolês fugiu em debandada. A população da capital do Kivu Norte, então, enfurecida, apedrejou os acampamentos da Força de Paz da ONU (e, de passagem os locais e veículos das organizações humanitárias), acusando-os de cruzarem os braços e de deixarem a população civil à mercê dos milicianos.
Mas o coronel Barrabino explicou-me que a Força de Paz, criada em 1999, segundo prescrições estritas do Conselho de Segurança, está no Congo para vigiar e para cumprir os acordos firmados em Lusaka que põem fim às hostilidades entre as distintas forças rivais, e com proibição expressa de intervir no que se consideram lutas internas congolesas. Esta disposição condena as forças militares da ONU à impotência, salvo no caso de serem atacadas. Seria muito distinto se o mandato recebido pela Força de Paz consistisse em assegurar o cumprimento daqueles acordos utilizando, em caso extremo, a própria força contra quem não os cumpre.
Mas, por razões não de todo incompreensíveis, o Conselho de Segurança optou por esta bizantina fórmula, uma maneira diplomática de não tomar partido em semelhante conflito, uma geringonça, com efeito, no que é difícil, pelo menos por dizer, estabelecer claramente a quem assiste a justiça e a razão e a quem não. Não tenho a menor simpatia pelo rebelde Laurent Nkunda, e provavelmente é falso que a razão de ser da sua rebeldia seja só a defesa dos tutsis congoleses, para quem os hutus ruandeses, armados e associados com o Governo, constituem uma ameaça potencial.
Mas, representam as Forças Armadas do presidente Kabila, uma alternativa mais respeitável? Para a gente comum e corrente tem-lhes tanto ou mais medo que os bandos de milicianos e rebeldes, porque os soldados do Governo os roubam, violam, sequestram e matam, ao igual que as facções rebeldes e os invasores estrangeiros. Tomar partido por qualquer destes adversários é privilegiar uma injustiça sobre outra. E o mesmo se poderá dizer de quase todas as oposições, rivalidades e bandorias pelas quais se entrematan os congoleses. É difícil, quando alguém visita o Congo, não recordar a tremenda exclamação de Kurz, o personagem de Conrad, em O coração das trevas: "Ah, o horror! O horror!"
IV – OS POETAS. E sem dúvida, pese a esse entorno, conheci muitos congoleses que, sem se deixarem abater por circunstâncias tão adversas, resistem ao horror, como o doutor Tharcisse, em Minova. Placide Clement Mananga, em Boma, que recolhe e guarda todos os papeis e documentos velhos que encontra para que a amnésia histórica não se apodere da sua cidade natal (ele sabe que o esquecimento pode ser una forma de barbárie). O Émile Zola, o director do Museu de Kinshasa, combatendo contra as térmitas para que não devorem o património etnológico ali reunido.
A esta estirpe de congoleses valorosos, que lutam por um Congo civilizado e moderno, pertencem os Poétes du Renouveau (Poetas da Renovação), de Lwemba, um distrito popular de Kinshasa. São cerca de uma trintena, uma mulher entre eles, e embora todos escrevam poesia, alguns são também dramaturgos, contistas e periodistas.
EL PAÍS
Mas o coronel Barrabino explicou-me que a Força de Paz, criada em 1999, segundo prescrições estritas do Conselho de Segurança, está no Congo para vigiar e para cumprir os acordos firmados em Lusaka que põem fim às hostilidades entre as distintas forças rivais, e com proibição expressa de intervir no que se consideram lutas internas congolesas. Esta disposição condena as forças militares da ONU à impotência, salvo no caso de serem atacadas. Seria muito distinto se o mandato recebido pela Força de Paz consistisse em assegurar o cumprimento daqueles acordos utilizando, em caso extremo, a própria força contra quem não os cumpre.
Mas, por razões não de todo incompreensíveis, o Conselho de Segurança optou por esta bizantina fórmula, uma maneira diplomática de não tomar partido em semelhante conflito, uma geringonça, com efeito, no que é difícil, pelo menos por dizer, estabelecer claramente a quem assiste a justiça e a razão e a quem não. Não tenho a menor simpatia pelo rebelde Laurent Nkunda, e provavelmente é falso que a razão de ser da sua rebeldia seja só a defesa dos tutsis congoleses, para quem os hutus ruandeses, armados e associados com o Governo, constituem uma ameaça potencial.
Mas, representam as Forças Armadas do presidente Kabila, uma alternativa mais respeitável? Para a gente comum e corrente tem-lhes tanto ou mais medo que os bandos de milicianos e rebeldes, porque os soldados do Governo os roubam, violam, sequestram e matam, ao igual que as facções rebeldes e os invasores estrangeiros. Tomar partido por qualquer destes adversários é privilegiar uma injustiça sobre outra. E o mesmo se poderá dizer de quase todas as oposições, rivalidades e bandorias pelas quais se entrematan os congoleses. É difícil, quando alguém visita o Congo, não recordar a tremenda exclamação de Kurz, o personagem de Conrad, em O coração das trevas: "Ah, o horror! O horror!"
IV – OS POETAS. E sem dúvida, pese a esse entorno, conheci muitos congoleses que, sem se deixarem abater por circunstâncias tão adversas, resistem ao horror, como o doutor Tharcisse, em Minova. Placide Clement Mananga, em Boma, que recolhe e guarda todos os papeis e documentos velhos que encontra para que a amnésia histórica não se apodere da sua cidade natal (ele sabe que o esquecimento pode ser una forma de barbárie). O Émile Zola, o director do Museu de Kinshasa, combatendo contra as térmitas para que não devorem o património etnológico ali reunido.
A esta estirpe de congoleses valorosos, que lutam por um Congo civilizado e moderno, pertencem os Poétes du Renouveau (Poetas da Renovação), de Lwemba, um distrito popular de Kinshasa. São cerca de uma trintena, uma mulher entre eles, e embora todos escrevam poesia, alguns são também dramaturgos, contistas e periodistas.
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