sábado, 11 de abril de 2009

MARIO VARGAS LLOSA visita o Congo. Viajem ao coração das trevas (fim)



Ademais do francês, a colonização belga deixou assim mesmo aos congoleses a religião católica. No pais há também protestantes – vi igrejas evangélicas de todas as denominações –, muçulmanas – na região oriental – e várias religiões autóctones, a maior das quais é o kimbanguismo, assim chamada pelo seu fundador, Simão Kimbangu, enraizada sobretudo no Baixo Congo. Mas, pese a hostilidade que desencadeou contra ela o ditador Mobutu, a quem fez oposição, a católica parece, de longe, a mais estendida e influente. Igrejas e centros católicos são os focos principais da vida cultural do país.

Os Poétes du Renouveau reúnem-se na igreja de San Agustín, onde têm uma pequena biblioteca, uma impressora e uma ampla sala para recitais e debates. Publicam desde há alguns anos umas edições populares de poesia que vendem a preço de custo e às vezes oferecem. Empenhados em que a poesia chegue a todo o mundo, deslocam-se a miúdo a darem recitais e conferências literárias por toda a região.

Assisto a um interessante encontro, de várias horas, em que nele se discutem temas literários e políticos. O francês que escrevem e falam os congoleses é cálido, cadencioso, demorado e, por vezes, tropical. Fazendo de diabo pastor, provoco uma discussão sobre a colonização belga: que de bom e de mau deixou?

Para minha surpresa, em lugar da cerrada (e merecida) condenação que esperava ouvir, todos os que falam, menos um, ainda sem esquecerem as terríveis crueldades, a exploração e o saque das riquezas, a discriminação e os prejuízos de que foram vítimas os nativos, fazem análises moderadas, situando todo o negativo num contexto de época que, se não excluem os crimes e excessos, explicam-nos.

Um deles afirma: "O colonialismo é uma etapa histórica porque passaram quase todos os países do mundo". Outro refuta-o, lança-lhe uma duríssima requisitória contra o ocorrido no Congo durante quase século e meio de domínio belga. Responde-lhe um jovem que se apresenta como "teólogo e poeta" com uma única pergunta: "E que fizemos nós, os congoleses, com o nosso país desde que em 1960 nos tornámos independentes dos belgas?".

EL PAÍS

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