segunda-feira, 6 de abril de 2009

O Cavaleiro do Rei (15). Novela


Estádios de futebol, palácios, catedrais, a liquidação dos intelectuais - que não pensam como nós - uma guarda vermelha presidencial, carros de luxo, a destruição da cidade de Luanda, a perseguição sistemática como as SS e o roubo dos bens das vendedoras que vendem nas ruas para não morrerem à fome, são mais valiosos que uma universidade. E as que existem são a fingir. Não estão a formar nada nem ninguém. Estão a deformar o homem, a ensombrar o amanhã.


- Epok!
- Meu rei!
- Vou para o reino do Ruanda, inicia os preparativos. Mas que nome para designar um país em África, só mesmo aqui. Esse nome não faz sentido. Como sempre nós inventamos as coisas, e os outros apropriam-se das nossas ideias. Foi assim com as pirâmides do Egipto. Copiaram a sua arquitectura e agora querem direitos de autor.

O Cavaleiro Epok falou com o marquês GOR, Gabinete das Obras Reais. Várias brigadas deslocaram-se para a rua da Maianga. Estandartes levantaram-se nas janelas. Os buracos taparam-se. A arraia-miúda evacuada. A rua ficou muito bonita. Espalharam-se flores e perfumes. Vieram os comentários do legado cultural dos quinhentos anos.
- Estou a rezar para que o rei saia todos os dias.
- O rei do líquido negro.
- O nosso rei é muito bonito. O rei dos reis mais bonitos.
- O dinheiro que gastaram na rua dava para um ano de comida.
- Vamos roubar as flores.
- Agora não. Só depois dele passar.
- Avisa a rádio dos republicanos.
- Não dá. Desligaram os telefones.
- Alguém que vá a correr às Mãos Livres.
- Não dá. Não entra nem sai ninguém.
- Vou namorar com um mosquiteiro. Vou roubar muita comida.
- Eu vou namorar com eles todos. Vou ficar rica.

Sons de tambores, flautas e alaúdes ouvem-se. Vários arautos anunciam.
- Abram alas para sua majestade El-Rei!
Aplausos e vivas ao rei começam, quando este surge num magnífico coche estilo D. José I. Ao seu lado está o cavaleiro Epok.
- Viva o rei! Viva o rei!
- Viva o cavaleiro Epok das piranhas!
- Viva o piranhoso!
- Viva! Viva!
- Viva La Padep!
- Fofinho, vamos fazer um bonitinho!

O rei comenta:
- Que povo barulhento, mal-educado, indisciplinado. Elas então são as piores. Não tem cultura, são simplesmente impossíveis. Já entendo porque é que o outro as queria queimar.
- Meu rei, vou decretar a lei das feiticeiras. Vão todas para a inquisição da fogueira.
- Isso é perigoso. Arriscamo-nos a ficar sem elas… esposas. Além disso, são elas que trabalham. Os homens são apenas para enfeitar.

O cortejo está a chegar ao fim da rua. Vê-se uma multidão de pedintes sem forças para caminharem. Restos de roupa cobrem os seus corpos. Estendem as mãos. Parecem mortos vivos. Epok espanta-se.
- Mas o que é isto!? O cemitério não é aqui!
- Nós não fazemos mal, viemos em bem.
- Ah sim, quem vos mandatou?
- Foi o cavaleiro La Padep. Disse-nos que o rei prometeu que nos daria algum dinheiro, umas sobras do vosso líquido negro.
- Maldito La Padep. Esse jovem dá-me cabo da cabeça. Ou vão embora já, ou atiro-os para as piranhas.

Foto: Angola em fotos

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