O maior erro dos ditadores consiste no convencimento de que as suas fortunas pessoais e as das suas famílias compram, vendem e pagam tudo. Nenhuma voz se lhes pode elevar, denunciar o opróbrio, o contra o eliminar fisicamente dos que não desejam mais rastejar na imundície que lhes é característica.
Empedernidos, decidem a todo o momento quem deve ou não viver, quem mais não andar pela face da Terra. Os países cujas populações tiranizam são como atiradores furtivos que matam qualquer um impunemente. Onde não existirem campos semeados de cadáveres, eles de imediato tratam disso. Porque tudo é deles, e acreditam doentiamente que eternamente assim tudo ficará. Para cada tubarão, uma solução. A agonia do espectro final está finalmente sazonal.
«O Regime Criou Uma Imagem De Diabolização Contra O General Numa – Justino Pinto De Andrade
Luanda – O catedrático e também líder político, no seu habitual exercício de análise e comentários sobre o conteúdo dos diversos jornais todas as segundas- feiras na Rádio Ecclésia, desta vez (28 de Fevereiro) quebrou o gelo e surgiu em dupla função: cunha e coroa, para dar luz e corpo a controvérsia perigosa gerada em torno de falsos argumentos, urdidos por governantes naquilo que se pode considerar um abuso de poder, que visam confundir a opinião pública nacional e internacional, justificar matanças e prisões, face as reivindicações legítimas dos angolanos que fazem uso dos direitos que conferem a Constituição angolana, desta feita o direito a manifestar.
*Félix Miranda
Fonte: Folha8/Radio Ecclesia Cllub-k-net
Segundo o que se pode ler no interior desta conversa conduzida pelo nosso colega Manuel Vieira e que os nossos serviços de escuta captaram e com o devido respeito retomamos parter, Justino Pinto de Andrade, sem evasivas, desnaturado e visivelmente agastado com o estado de coisas, teceu duras críticas àqueles que se pretendem donos de Angola e de todos. Capitalizando sobre o episódio Kamalata Numa, JPA mais adiante disse: - Criou-se uma imagem de diabolização. Escolheu-se a figura do Numa e transformou-se num Lobo-mau, no Homem do saco e penso que isto de facto não é correcto. Não me parece que haja alguma legislação neste país que impeça algum deputado de dizer que parou de comer ou que não concorda com uma prisão que ele ache ilegítima. Se o Numa deve ser chamado à pedra pelo facto de ter feito greve de fome diante de uma esquadra policial, porquê que Dino Matross não deve ser chamado à pedra porque ameaçou repressão sobre hipotéticos manifestantes? Há uns que têm direito de fazer e dizer o que querem e há outros que têm apenas que bater palmas?!
Instado a se pronunciar sobre a manifestação do dia 7, o também Decano da Faculdade de Economia da Universidade Utanga dizia:
Justino Pinto de Andrade – O que vai acontecer, se acontecer. Está-se a ver a hipótese de haver manifestação dia 7 de Março, de acordo notícias que vão correndo por aí e que geraram algum nervosismo ao nível das pessoas ligadas ao poder. É evidente que também tenho notícias desta convocatória anónima de manifestação, embora ao nível dos jornais já se apresenta um nome, mas a mim parece-me que é fictício. É um indivíduo que se apresenta com um nome que junta os nomes de Agostinho Neto, Holden Roberto, Jonas Savimbi e Eduardo dos Santos. A pessoa não deu o rosto, escondeu-se por detrás de um suposto nome, mas de qualquer forma, ousou convocar a população de Angola para uma suposta manifestação a ter lugar no dia 7 de Março. É evidente que isto criou receios junto de algumas pessoas que receberam estas mensagens, mas sobretudo criou algum nervosismo junto do poder. É normal que tenha criado receios junto da população porque a população sabe perfeitamente que as manifestações que não são de agrado, de apoio, de felicitações, não são bem-vindas. Mesmo até coisas inofensivas. Recordo-me que há um tempo atrás, um conjunto de senhoras quis organizar uma manifestação de apoio a lei contra a violência doméstica, foram reprimidas no Largo 1º de Maio pela polícia, inclusivamente algumas foram parar à Esquadra da polícia. E era uma manifestação perfeitamente pacífica que até estava a apoiar a aprovação eminente de uma lei contra a violência doméstica. Significa que neste país, pelo menos ao nível dos órgãos dirigentes, não há a aceitação do princípio da manifestação embora este princípio esteja consagrado na nossa legislação a começar pela Constituição que contempla o direito legitimo dos cidadãos de forma organizada e pública manifestarem a sua vontade. Depois existe legislação mais concreta que trata das condições que o direito à manifestação deve ser exercido.
Manuel Vieira – Hoje é uma tese fundada em se ter receios de uma manifestação deste caris?
JPA – Não me diga que, quando foi das senhoras sobre a lei da violência doméstica tinham receio que o governo caísse naquela altura. Não é um problema do carácter da manifestação, é do princípio. As pessoas não aceitam a manifestação, os governantes, os órgãos de polícia, os políticos não aceitam o direito à manifestação. Só aceitam o direito à manifestação, quando for de apoio.
Esta das senhoras tinha rosto. Esta suposta manifestação, não tem rosto.
Temos que falar concretamente desta suposta manifestação. Digo suposta porque tenho dúvida se efectivamente haverá tal manifestação, por causa do receio que as pessoas têm. Não é porque as pessoas não tenham vontade de manifestar. As pessoas sabendo o carácter repressivo do regime, seguramente não estarão dispostas a serem recebidas a bala só porque se juntaram num sítio qualquer e disseram que estavam em desacordo com a governação. Além disso também, as coisas foram feitas com uma antecedência tal que todo o mundo está prevenido. Há já um contra-ataque também de pessoas anónimas que puseram a circular umas duas mensagens precisamente em sentido contrário, inclusivamente uma delas atribui a responsabilidade desta manifestação a UNITA em si e ao senhor Numa, Secretário-geral em particular.
Isso não faz sentido, entrarmos nesta lógica acusatória porque ninguém me consegue provar salvo não me tenha apercebido que esta manifestação tenha sido convocada pela UNITA. Porque o seu porta-voz, a pessoa que está autorizada a falar em seu nome, o Alcides Sakala, ele próprio disse que não faria sentido a manifestação, dado que poria em perigo o processo de paz e reconciliação nacional. Portanto, as pessoas estão no direito de convocar e fazer a manifestação, um direito consagrado constitucionalmente, o Estado que devia fazer caso as pessoas viessem a rua, era garantir que a manifestação se processasse de forma pacífica por forma a não criar incidentes de maior, porque a experiência está a mostrar-nos que quando se reprime ainda é pior. E parece-me que o Secretário-geral do MPLA, Dino Matross, ainda lançou mais achas na fogueira. Para já não tem o direito de falar naquelas condições porque ele é Secretário-geral de um Partido político ele não é um órgão do Estado. Se efectivamente havia intenção de se fazer manifestação contra o poder, não é ao Secretário-geral de um partido que compete vir declarar sob forma ameaçadora que as pessoas não podem fazer aquela manifestação. Por outro lado também o Presidente da Bancada Parlamentar do MPLA teve exagero de linguagem na forma como abordou a questão, inclusivamente apontando o dedo à UNITA e ao PRS. Usou uma linguagem um bocadito rasteira, pouco apropriada. Esta forma de reacção quer do Secretário-geral do MPLA, quer do presidente da Bancada do MPLA, para além de exagerada ainda alimentou mais os receios que as pessoas têm e sobretudo mostrou que a cultura democrática não faz parte dos hábitos de muita gente. Há uma série de pessoas que estão de costas viradas para as liberdades democráticas.
As pessoas têm direito a manifestar-se e sobretudo também mostrou que algumas dessas pessoas não aprenderam com aquilo que está a acontecer no mundo. Ali onde a repressão foi maior, a reacção também foi maior. Quando começaram as manifestações na Jordânia, o Rei imediatamente interveio, tomou uma posição e descomprimiu o ambiente. Fez algumas concepções, ouviu as pessoas, deixou que tivessem manifestado, ouviu o que elas tinham para dizer e fez as concertações necessárias. No caso concreto dos outros países onde a repressão policial foi cega, os governos caíram. Inclusivamente estamos numa situação de quase guerra civil na Líbia porque o ditador da Líbia também agiu em sentido contrário àquilo que devia ter feito. Para já não admitiu que está há 42 anos no poder e que isso não faz sentido. 2° - Que o poder não é instrumento para uso pessoal, seja para quem for. E quando as pessoas não percebem que o poder não deve ser usado dessa maneira, é evidente que reagem da maneira como reagiram, depois tem as consequências que tem.
Em termos de cautela, o que aconselha aos cidadãos?
Aconselho é a policia, aconselho às autoridades.
Ou aos cidadãos para que não embandeirem.
Não me compete à mim dizer as pessoas que não devem fazer manifestação. As pessoas têm um direito consagrado na lei. Posso achar conveniente ou não, mas isso é uma questão subjectiva, é um problema do Justino como pessoa. Agora que as pessoas possam usar este direito a manifestar-se, eu não tenho o direito de dizer que não porque sei perfeitamente que neste país, as manifestações que não são de apoio, são geralmente contrariadas e reprimidas. O que devo dizer é as autoridades que apliquem na prática aquilo que a lei consagra. Que não reprimam as pessoas que saem à rua para manifestar, que protejam as pessoas porque essas pessoas são tão angolanas como aquelas que saem à rua para apoiar. Se as pessoas podem sair à rua para apoiar, há outros também que saem à rua para manifestar seu desagrado. O conselho que dou às entidades políticas, que oiçam o povo, tenham a coragem de ouvir coisas que não vos agrada, precisamente para poderem avaliar o sentimento popular. Porque é muito bonito convocar as manifestações de apoio, bandeiras e todo o carnaval que geralmente acompanha estas manifestações, fica-se com a sensação de se estar a fazer tudo bem e as vezes nos esquecemos que estas pessoas saíram à rua porque foram mobilizadas às vezes até de forma incorrecta. Há manifestações que são mobilizáveis através da atracção da bebida, as chamadas maratonas e as pessoas ficam com a sensação que estão a agir perfeitamente, que toda a gente está de acordo, quando na realidade as coisas não são assim. É bom que o poder perceba que a pior coisa que pode fazer é reprimir. Se o poder não reprimir, as pessoas ficam consignadas no local, há palavras de ordem, há intervenções públicas, nós cá de fora ouvimos o que estão a dizer, percebemos a mensagem, podemos estar de acordo ou em desacordo. Penso que assim seria correcto, é assim que se faz em democracia e quando as pessoas não percebem que a democracia é sobretudo liberdade, naturalmente que não podem dirigir de forma democrática um país.
MV – O Jornal a Capital fala de “Numa” como sendo Inimigo Público n° 1. Discorda desta posição? A vida política ficou com alguma ebulição nesta semana em pleno parlamento, o que reputamos de normal em democracia.
Não sei porquê que um deputado, não pode fazer uma greve de fome.
MV – Está na greve de fome, no eventual incitamento a violência.
Mas quem é que diz que o Numa incitou à violência, o MPLA tem que provar isso. Penso que estamos a entrar numa lógica que não vai conduzir a melhoria do nosso debate político, que devia ser feito em torno das ideias e de propostas e projectos que cada um tem. Estamos novamente a voltar nos anos de 1990/91 em que as pessoas são a partida tachadas com um rótulo e não se discute ideias, é a figura do bom e do mau. Penso que a política não é feita por bons e por maus, é feita por pessoas normais. Pessoas que têm ideias contrárias de quem recebem o acordo destes ou o desacordo daqueles. E julgo que esta forma de fazer política que no fundo é a forma que agrada aos partidos tradicionais é muito ínvia, porque em vez de estarmos a discutir projectos e fazer críticas correctas à acção governativa estamos a criar a figura do bom e do mau. Agora o escolhido foi o NUMA, que teve uma reacção que foi face a prisão que ele achou injusta do seu correligionário no município do Bailundo ele terá assentado arraiais em frente a Esquadra da polícia para exigir libertação do seu correligionário.
Não me parece que tenha usado violência. Ele teve uma reacção que me parece perfeitamente normal que é o direito a indignação. Não foi ninguém que foi lá ao estômago do NUMA tirar comida. A partir daí, criou-se uma imagem de diabolização. Escolheu-se a figura do Numa e transformou-se num Lobo-mau, no Homem do saco. Penso que isto de facto não é correcto. Não me parece que haja alguma legislação neste país que impeça algum deputado de dizer que parou de comer ou que não concorda com uma prisão que ele ache ilegítima. Assim como hoje temos o Dino Matross que me parece que é deputado do MPLA, se o Numa deve ser chamado à pedra pelo facto de ter feito greve de fome em frente de uma esquadra policial, porquê que Dino Matross não deve ser chamado à pedra porque ameaçou repressão sobre hipotéticos manifestantes? Há uns que têm direito de fazer e dizer o que querem e há outros que têm apenas que bater palmas! Não me parece que esta seja uma atitude equilibrada. Se Dino Matross fez aquilo e eu estou aqui a condenar publicamente suas palavras, é porque exagerou na linguagem, intimidou as pessoas e abusou de um direito porque enquanto Secretário-geral do MPLA, não pode pôr forças na rua, não pode falar em repressão, porque o Secretário-geral do MPLA, fala em organização do MPLA, não fala em repressão. O MPLA não tem forças militares, nem forças policiais, as forças militares e as forças policiais são do Estado. Ele não pode fazer este tipo de abordagem. Mas não me parece até agora que alguém tenha vindo dizer que Dino Matross vai ser chamado a pedra, mas é deputado também como o Numa e fez uma ameaça pública contra aqueles que se manifestarem publicamente. Mas contudo, o Numa parece-me que decorre apenas do facto de ter feito greve de fome, de se ter colocado em frente de uma Esquadra policial e exigir a libertação do seu correligionário; ameaça-se levá-lo em Tribunal e a perder o cargo. Gostaria de ver a parte final, seria ridículo em qualquer parte do mundo, era uma vergonha para este país, até porque ele é eleito e não é assim que se tira o cargo à uma pessoa que usou de um direito que está consignado na Constituição e na Lei Ordinária.
A Comissão de Ética e do Quórum parlamentar ainda não se pronunciou!
Devia ter assuntos mais sérios para tratar. Acho que a Comissão da Ética e do Quórum parlamentar tem seguramente matéria muito mais substantiva do que estarem a perseguir uma pessoa que se sentou em frente de uma Esquadra a dizer que não quero comer mais porque o meu colega está aí preso.
Já que tudo aconteceu no Huambo, é notícia Faustino Muteka. Segundo o “Novo Jornal”, é o fim da linha, será substituído por Sílvio Peixoto que durante muitos anos foi o secretário da presidência da República.
Estamos no domínio das hipóteses, não sei qual é a fonte do Novo Jornal, acredito que eles tenham fonte segura e parece-me que tudo decorre do facto em haver um desacerto entre a condição de Faustino Muteka enquanto 1° Secretário do MPLA na província do Huambo e a sua condição de Governador provincial. Creio também que esta situação que aconteceu agora tenha maculado um pouco a sua imagem que agiu de maneira partidária nas vestes governamentais. Esta forma de agir, volta e meia confunde as coisas. Penso que o problema não é propriamente o governo e a figura partidária, tem mais a ver com a personalidade das pessoas. Aí é que as coisas ficam mais complicadas, quando as pessoas são um bocado atreitas ao trungungo como se diz entre nós, quando as pessoas reagem intempestivamente, às vezes até de forma quase irreflectida, perante situações que podiam até ter um outro tratamento. Parece-me que esta é uma das práticas reiteradas de Faustino Muteka o que estará a criar alguns problemas à imagem do seu próprio partido no Huambo.
Sobre a realidade de Cuba, Fidel de Castro, Raul e das hipotéticas mudanças, JPA, disse que não acredita em regimes que eram ditatoriais e de um dia para o outro dizem que são democratas, sobre isso foi peremptório em relembrar: a Democracia não pode ser feita pelos velhos ditadores.
Falaram de entre outros sobre a Líbia e Kadhafi, o facto dos seus aliados lhe terem virado nitidamente as costas, inclusive alguns dos seus dirigentes, e a acusação que pesa sobre ele de que poderá ir ao TPI pelo facto de ter utilizado meios desproporcionais para conter a revolta e muita gente ter morrido em consequência.
JPA, tal como tem vindo a citar, não poupou verbos para caracterizar a conjuntura: – Só não dava conta que Kadhafi para além de ditador é um desequilibrado quem usa óculos escuros e deixa de ver a luz do dia. Para além de ditador, uma concepção da sociedade e do Estado errada, é um homem desequilibrado e agora começam a vir notícias das pessoas próximas dele que demonstram que o homem não batia bem da bola como se diz. Um dos seus colaboradores no passado, diz que ele tinha escassas duas horas por dia que estava fora dos efeitos das drogas. Um país não pode ser dirigido por um maluco, um drogado. Os ditadores a certa altura entram numa paranóia tremenda. No caso concreto do Kadhafi, está 42 anos no poder, pensa que ainda tem mais alguma coisa que fazer. Vai fazer mais o quê? O que é que um individuo que fica 20; 30; 40 anos no poder pode apresentar aos seus concidadãos como novidade. A única novidade é de que vai continuar a destruir. Kadhafi só se manteve no poder até agora por duas razões: por um lado porque é um ditador; 2° Porque a Líbia tem dinheiro, fruto do petróleo e é o petróleo que move a Líbia, as conexões dos interesses, as fidelidades, as relações internacionais. Há uma questão que as pessoas têm de tomar em conta: um presidente que ordena a destruição de um avião com inocentes, é um assassino, não é um presidente. O homem próximo dele, julgo ser o ministro da justiça diz que tem provas de que ele ordenou pessoalmente a explosão do avião da PANAM em Lokerbie (Escócia). Para JPA: o fim dos ditadores está a chegar, uns chegam mais cedo do que outros. Mas o mundo do futuro será um mundo de liberdade, não de ditadores com sorrisos ou com cara trancada como é o caso do Kadhafi. Hoje fica mais claro que aquele muro caiu, o muro que protegia a corrente. Cai o Kadhafi, caem os outros todos. Até no Iraque já há manifestações pró democracia, fala-se também da China. Estamos perante uma situação nova no mundo. É evidente que isto vai criar alguma instabilidade; mas, mais vale termos alguma instabilidade durante certo tempo e termos felicidade depois, do que estarmos a viver esta ilusão destes regimes que não dão liberdade aos seus povos. Acho eu que todos os ditadores encapotados ou não deviam fazer a leitura desta altura que estamos a viver no mundo porque outros muros irão cair.»
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