sexta-feira, 16 de março de 2012

Polícia não pode ser exército do partido no poder. Editorial


Maputo (Canalmoz) – Os últimos acontecimentos em Nampula que colocaram a chamada capital do norte em alvoroço às primeiras horas da manhã do dia 08 de Março quando a FIR assaltou a sede da Renamo naquela cidade; o comportamento da Polícia nos postos de recenseamento eleitoral no Município de Inhambane; e a forma como a Polícia tratou uma comitiva do MDM na portagem da ponte que separa as províncias de Sofala e de Inhambane, entre o centro e o sul do País, sobre o Rio Save, em Vila Franca do Save, no distrito do Govuro, na última segunda-feira, mostra bem que cada vez estamos mais enganados quando dizemos “a nossa Polícia”.
Qualquer estado necessita de uma Polícia competente, mas ainda não é seguramente o nosso caso.
Armados até aos dentes, usando verbas do Orçamento do Estado, cada vez mais os agentes da PRM desrespeitam mais os cidadãos e os princípios mais elementares por que se deviriam nortear no quadro dos valores éticos por que se deve pautar quem está a servir um Estado.
A PRM não pode continuar a agir como uma força partidarizada.
A PRM não pode continuar a ser um instrumento do Partido Frelimo. Ou é uma Policia do Estado ou ninguém lhe tem de obedecer.
Se em Nampula a Polícia pode alegar que se confrontou com “homens armados da Renamo” – o que mesmo assim nós questionamos dada a forma irresponsável como agiu, prendendo inclusivamente civis em fuga –, em Inhambane já não se poderá alegar o mesmo quando se instalou nos postos de recenseamento, dentro das salas onde os cidadãos iam para se recensearem por forma a habilitarem-se a votar para eleição do novo edil da “Terra da Boa Gente”.
Em Inhambane, sendo absolutamente ilegal a Polícia estar a menos de trezentos metros dos postos de recenseamento onde deverão depois funcionar as assembleias de voto no dia das eleições, a 18 de Abril próximo, pudemos testemunhar in loco que foi a própria corporação liderada por Jorge Khalau que partiu para a violação da lei sem que houvesse distúrbios e sem que houvesse armas nas imediações. Havia apenas cidadãos à civil, sobretudo senhoras e centenas de jovens de ambos os sexos, movidos apenas pela sua consciência e espírito de cidadania, mas a Policia estava lá para intimidar.
Se houve em Inhambane quem não soube respeitar o Estado foi a própria Polícia. Agiu claramente conluiada com o partido Frelimo como se pode ver numa imagem da rubrica intitulada “Canal de Fotografia”, nesta edição, em que a fiscal do Partido Frelimo no Posto de Recenseamento nr. 10, na Escola Terceiro Congresso está a dar ordens a dois agentes da PRM, vulgo “cinzentinhos”, para se porem em fuga e se esconderem, dada a presença de jornalistas a testemunhar a ilegalidade. Logo a seguir, a supervisora do STAE nesse posto de recenseamento daria ordens para que esses mesmos agentes retirassem os jornalistas da sala quando era a Polícia que por lei deveria sair, tanto mais que quem estava ilegal eram eles e não a Imprensa. E assim acabou sendo porque tivemos que levantar a voz em nome da legalidade e dos nossos direitos profissionais, pondo fim ao abuso que ali estava a ser praticado.
Poucas horas depois disso, num outro Posto de Recenseamento, já na EPC 25 de Setembro, um outro jornalista do Canal de Moçambique / Canalmoz viria a ser algemado e levado para a segunda esquadra e aí detido, por estar a tirar fotos que provam também que a PRM estava dentro de áreas onde decorriam procedimentos eleitorais e em que a sua presença é proibida por lei. Alegaram que o repórter não tinha identificação como jornalista (o seu cartão tinha-se estragado com a chuva do temporal Irina), mas não o deixaram ir ao carro buscar o BI. Valeu o bom-senso do porta-voz da PRM na província para impedir que tudo acabasse mal. Ficou, no entanto, a péssima imagem de uma PRM que não sabe lidar com a Imprensa.
Em Inhambane, no recenseamento, a Polícia agiu contra a lei e intimidou os cidadãos de forma tendenciosa e conivente com os fiscais da Frelimo e elementos estranhos ao STAE e à CNE, disfarçados à civil, mas com todo o ar de serem agentes do SISE.
Em Quelimane, nas “intercalares” de Dezembro de 2011, para eleição do novo edil, vimos a Polícia a agir contra a cidadania e a favor do Partido Frelimo, chegando ao cúmulo de implantar duas bandeiras do partido no poder dentro da sede do MDM na capital da Zambézia, às primeiras horas da madrugada do último dia de reflexão, deixando no local um contingente de dezenas de homens armados da FIR, em desafio a civis desarmados e com comportamento cívico irreparável.
Estando a falar sobre comportamentos incorrectos da PRM. Vemos que lhes falta legitimidade para exigirem respeito dos cidadãos. Sem que eles se dêem ao respeito e cumpram a lei e sem que eles tenham comportamento compatível com o papel que está reservado a qualquer força policial em democracia – o que esperam os agentes da PRM? Respeito?
Gostaríamos de ver uma Polícia mais profissional e com mais ética.
Gostaríamos de ver uma Polícia a agir de tal forma que a pudéssemos realmente considerar nossa.
Gostaríamos de ver a PRM a agir em defesa dos cidadãos e não contra eles.
A PRM está a agir de novo em defesa da manutenção de uma elite que se instalou no poder e finge apenas admitir o pluralismo de ideias e oportunidades iguais para todos, de acesso ao poder.
A PRM está a agir contra a cidadania.
A PRM, quando ainda não existiam em Moçambique tantas instituições de formação, já teve mais nível do que tem hoje.
A PRM já se comportou de forma mais civilizada e ciente do seu papel como instituição do Estado.
Os abusos que estão de volta fazem-nos lembrar os velhos tempos do monopartidarismo.
Os excessos ordenados por quem mandava no tempo do regime de partido único foram contidos depois do Acordo de Paz por, no outro prato da balança, estarem “homens armados da Renamo” com força idêntica para impedir veleidades e abusos da Polícia.
A PRM provou não ser capaz de evitar abusos e excessos quando não tem armas apontadas pela oposição à testa de quem manda.
O País precisa de facto de ter uma Polícia e outras instituições viradas para a aplicação da lei e manutenção da ordem. Não pode tolerar-se o comportamento que estamos a voltar a ver a PRM a ter.
Supúnhamos que estivéssemos a andar para a frente, mas estamos a ver a PRM a voltar a partidarizar-se.
A PRM em vez de tratar todos os cidadãos por igual e agir nos estritos termos da lei e dos limites das suas competências, está a voltar a comportar-se como um exército privado ao serviço do Partido Frelimo.
A PRM está de novo a tornar-se discricionária e ostensivamente às ordens do partido no poder e dos interesses particulares de quem está no poder.
A Polícia cada vez menos respeita os cidadãos por igual. Perigosamente vemos que está a ser armada por uma comunidade internacional que embevecida pelos cenários económicos e pelas estatísticas está a perder de vista a ideia que os cidadãos comuns do País têm da Polícia.
A comunidade internacional que apoia uma Polícia com este comportamento e não é capaz de diplomaticamente passar recados concretos ao Governo do dia, acabará sendo cúmplice dos desmandos que a PRM está a praticar.
Uma Polícia com este comportamento mas que não sabe exercer o seu papel nem mostrar serviço quando se trata de raptos e de proteger os cidadãos, preocupa os cidadãos de qualquer País. Os moçambicanos não são diferentes dos outros povos.
Uma Polícia a comportar-se como a PRM se tem comportado ultimamente, não contribui de forma nenhuma para que haja bom ambiente e segurança no País.
Cabe ao Governo mudar a sua atitude. A Polícia não está a agir por sua conta e risco. Alguém anda a dar-lhe ordens absurdas.
A Polícia de um País não pode ser o exército privado do partido no poder. (Canal de Moçambique/ Canalmoz)

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