Luanda - Li, como sempre faço, a edição do Novo Jornal nº 215, de 2 de Março e não pude deixar de ficar com um misto de pena e de tristeza, ao ler o artigo “a UNITA, as Eleições e Savimbi”, escrito pelo meu duplamente ilustre colega (como jornalista e como deputado) João Melo.
Fonte: Club-k.net
Pena por ver um homem que se espalha em coisas nas quais ele próprio certamente não acredita. E prefiro pensar assim, para mitigar a minha mágoa. Por um lado, por estar a minimizar a força de um partido como a UNITA que cresce todos os dias e a olhos nus, enquanto o seu MPLA decresce, igualmente todos os dias, apesar de todos os exercícios de fictício engrandecimento por parte de gente que anda a beijar ridiculamente os limites inferiores da bajulação. Por outro lado, por agir de forma irrefletida na análise dos factos que nesse artigo relata; factos com os quais qualquer aprendiz de jornalista saberia lidar: verificá-los primeiro, para não correr riscos desnecessários de, como diria uma “zungueira” da nossa praça luandense, “comer bolinhos que fazem falar à toa”.
Olhemos para o que diz, no seu artigo:
1. Quando fala em “Insistir em criticar a UNITA pelo seu passado e não por aquilo que ela representa hoje”, é óbvio que se tornará mais cómodo para si e para o seu MPLA falar da Guerra Civil, cujo início, no país, se atribui erroneamente à UNITA, quando todos os angolanos que já tinham olhos de ver em 1975 (e mesmo aqueles que, sendo mais novos, procuraram fontes históricas mais sérias, mais credíveis do que a “História” mentirosa que o MPLA quer atribuir a Angola) sabem bem que, ajudados pelos “camaradas comunistas” de Portugal, da URSS, da RDA, do Congo de Marien Ngouabi, entre outros, foi o MPLA que partiu para a guerra contra a UNITA e a FNLA em total violação dos Acordos de Alvor (o vício da violação dos acordos e das leis vem de longe e já anda impregnado no sangue). E fê-lo porque tinha fortes motivos para recear que o voto popular, em 1975, lhe fosse completamente desfavorável. É bom recordar, para que os angolanos saibam, que em 1975 foram barbaramente assassinados muitos cidadãos europeus ou de origem europeia, como forma de desencorajá-los a apoiar quer a UNITA, quer a FNLA, acusadas de “capitalistas”, “lacaios do imperialismo”, “reacionários” e toda essa gama de coisinhas fúteis com que se enganavam os angolanos, e que os próprios “Mpelistas” resolveram banir do seu dicionário. É só olhar para a franja de capitalistas que nasceu do seio do MPLA para entendermos a metamorfose que se vive nos dias que correm. O MPLA, que não consegue mudar, prefere apresentar aos angolanos uma UNITA pintada à boa moda da propaganda “Disista” (menção feita à DISA), com medo da UNITA que hoje emerge e cresce como a grande alternativa para o país e para os angolanos.
2. Ao referir-se ao que chama de “atitude da UNITA de abandonar a plenária da Assembleia Nacional” que, segundo ele, “demonstra incapacidade e confirma que (a UNITA) não tem condições para ser uma oposição credível e para governar o país”, de facto, na amiga União Soviética de ontem (e talvez na Rússia de hoje) e na camarada Coreia do Norte, abandonar a sala para não pactuar com ilegalidades e violações da Constituição e da Lei poderá significar o que alega. Mas em democracia (e é para lá que Angola marcha e de forma inexorável e inevitável), esse é um comportamento normal, “camarada”. Admira-me que não o conheça. E se esse comportamento irrita tanto os colegas da bancada do MPLA é porque, na realidade, estão a ressentir o golpe. Ou quereriam que a oposição credível (UNITA, PRS e FNLA) ficasse na sala a bater palmas para a pouca vergonha nacional que cada dia desprestigia mais a nossa Assembleia Nacional; um Parlamento de onde devia partir o grande exemplo de democracia mas que se vai cada vez mais transformando em apenas mais uma instituição onde só se diz “amen” aos desejos do Chefe? Não. E é isso que incomoda e enraivece os nossos colegas do MPLA: a inexistência de uma oposição dócil que apenas faça número para “justificar” o vosso conceito de “democracia”.
3. Quando afirma, mais coisa menos coisa, que “o argumento utilizado pela UNITA (a sua discordância, por suposta ilegalidade, em relação à nomeação pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) da Presidente da Comissão Nacional Eleitoral Independente – CNEI) para justificar a repetição dessa atitude, não passa de um pretexto”, aconselho o meu ilustre colega a estar um pouco mais atento para não falsear o que está plasmado, quer na Constituição da República de Angola, quer na Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais. Nenhum desses instrumentos legais fala em “CNEI”, como a designa. Ela é apenas CNE, que se pretende independente.
Quanto à evocada alínea a), do Nº 1 do Artigo 143º, que estabelece as condições para a designação do Presidente da CNE, pasma-me a sua falta de coerência e de discernimento: O texto integral dessa alínea é o seguinte: : “um magistrado judicial, que a preside, oriundo de qualquer órgão, escolhido na base de concurso curricular e designado pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial, o qual suspende as suas funções judiciais após a designação” – fim de citação. Como diz e muito bem – e aqui devo concordar consigo – não precisa de ter ficado dez anos na Universidade para concluir o curso de Direito, para sabê-lo. O português aqui é tão claro que não dá, infelizmente para o MPLA e o seu Conselho Superior da Magistratura Judicial (porque o é), margem para qualquer manobra. O Presidente da CNE tem que ser um Magistrado Judicial e a Sra. Dra. Suzana Inglês não o é.
A confusão que se pretende propositadamente criar com o “oriundo de qualquer órgão” é completamente volátil, pois a última parte da redacção do articulado desfaz qualquer dúvida quanto a isso, ao dizer “o qual cessa as suas funções JUDICIAIS após a designação”. Chega de querer enganar os angolanos. Só cessa funções quem as exerce. E essa coisa de quererem dizer que “qualquer órgão” pode bem ser a antiga CNE ou a Federação Angolana de Futebol (porque não?) ou algo que valha, na ridícula e deficiente justificação avançada pelo CSMJ, e retomada qual coro pela claque “Mpelista”, é óbvio que não consegue ganhar solidez.
Teríamos alguém oriundo da FAF, da OMA, da JMPLA, da LIMA ou do AJAPRAZ a “cessar as suas funções judiciais após a designação ao cargo de Presidente da CNE”? Tenham dó! Caro amigo, aprenda a conviver com o facto de que a Dra. Suzana Inglês não pode ser Presidente da CNE, à luz da Lei Nº 36/11, de 21 de Dezembro. Está sobejamente mostrado e demonstrado que ela não tinha a categoria de Juíz na altura da designação e, a menos que se esteja perante uma grave crise de vocabulário, um magistrado jubilado também não poderia, conforme defende, ocupar o cargo de Presidente da CNE. Como iria o magistrado jubilado cessar funções que não exerce? Isso é mesmo dificuldade de perceber o que está escrito no Artigo 143º da Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais, ou é a “aldrabomania” que que vive no sangue de certas pessoas?
4. Ao falar “Sobre o facto de alegadamente a UNITA não ter recorrido às instituições de direito para esclarecer o caso “Suzana Inglês”, e quando o João Melo diz saber, inclusive, que ela (Suzana Inglês) terá solicitado ao CSMJ a sua reintegração no quadro de juízes, precisamente para poder concorrer para dirigir a “CNEI”, desconhecendo se o referido conselho já havia decidido sobre isso ou não”, a pergunta que me ocorre fazer é a seguinte:
onde mora o jornalista João Melo, que devia investigar primeiro antes de fazer declarações sobre assuntos tão sérios quanto este? Com uma perguntinha aqui ou ali, seria possível evitar que, do punho e da voz de um conceituado jornalista fossem proferidas tantas inverdades. Seria, assim, possível saber que, em 17 de Janeiro de 2012, logo após o anúncio, através da imprensa, da designação da Dra. Suzana Inglês para o provimento do lugar de Presidente da CNE, a UNITA, através da sua Direcção, remeteu ao Conselho Superior da Magistratura Judicial uma “Reclamação”. O mesmo foi feito, também oficialmente, pelo PRS e pela FNLA.
Os esclarecimentos, fracos, atabalhoados, mentirosos e violadores da lei, viriam a ser fornecidos pelo CSMJ, no seu Ofício nº 06/008/CSMJ/12, de 23 de Janeiro, que nos foi remetido na manhã do dia 24, na chamada “Fundamentação jurídico-legal da qualidade de magistrada judicial da candidata Suzana António da Conceição Nicolau Inglês, designada para o cargo de Presidente da Comissão Nacional Eleitoral”. E porque estávamos perante a “emenda que se revela claramente pior que o soneto”, por volta das 16h00 desse dia 24 de Janeiro, esse Conselho veio à Assembleia Nacional para uma reunião dita de “esclarecimento” com a Conferência de Líderes, da qual eu, felizmente, faço parte. Lá estavam – e isso não constitui segredo para ninguém – o Presidente do CSMJ (também Presidente do Tribunal Supremo), o Presidente do Tribunal Constitucional e o Magistrado Silva Neto que havia presidido o Júri que escolhera e designara a Advogada (porque é) Suzana Inglês para Presidente da CNE.
residente do Tribunal Supreasnte da Assembleia Nacional viria a propor um encontro com o Presidente do CSMJ (tambende as suas E foi da boca do Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial que eu e todos os outros presentes ficamos a saber que a Dra. Suzana Nicolau Inglês não tinha (repito, não tinha) solicitado qualquer reintegração no CSMJ por, alegadamente, nunca ter deixado de ser Juíz, dado o carácter vitalício que uma lei posterior (pasme-se!) lhe iria conferir de forma retroativa. E o que assistimos, nessa reunião e nesse triste dia, foi tão somente o cúmulo da vergonha da Justiça do nosso país, com juízes instrumentalizados, formatados para defender a permanência da Dra. Suzana Inglês no cargo de Presidente da CNE. Veio-me francamente à mente a imagem da Coreia do Norte, após a morte do “Grande Líder” Kim Il-Jong, com os coreanos dos mais variados extratos e latitudes a desfazerem-se em lágrimas e ranho, curvando-se e ajoelhando-se o mais que podiam, na vã tentativa de mostrar quem conseguia cumprir melhor as “ordens superiores”. É esta a Angola que temos hoje, com o MPLA, e que vai certamente mudar muito em breve, com a UNITA.
Acho, também, que um dia, o meu colega João Melo (e passo, já agora, o convite a outros distintos colegas Pereiras, Pintos, etc.) devia pensar em manter um debate aberto, frontal, numa estação de rádio ou de televisão com isenção, como sendo a Rádio Ecclesia ou a TV Zimbo, para evitarem-se os debates vergonhosamente viciados, desiguais, onde não existem fronteiras entre moderador e participante, jogando todos numa equipa contra uma pessoa que chamem para brincar ao contraditório. Assim, poder-se-ia sair do refúgio tranquilo de entrevistas em rádios e televisões de idoneidade e imparcialidade duvidosas, onde, na prática, apenas existe o “digo eu, digo eu”, ou os artigos plasmados em jornais que evitam um debate mais directo e mais interactivo. Não seria melhor assim para que as pessoas pudessem esgrimir os seus argumentos e deixar que os angolanos dissessem, de si mesmos, o que acham disto ou daquilo? Porque receiam os nossos colegas do MPLA em enveredar por esse tipo de debate?
Agora, permitam-me que deixe aqui o meu humilde conselho: quando e sempre que escreverem ou se pronunciarem publicamente, não se esqueçam de ter bem presente que o Povo que, em 1974/1975, se tentava enganar com discursos de que a FNLA comia pessoas, e outras coisinhas sem nexo como essa, esse Povo já não existe. Os angolanos amadureceram e já não se prestam a historinhas da carochinha. Este Povo, mesmo não estudando em Coimbra como muitos, sabem bem quem é o MPLA, quanto mal já fez ao país e ao Povo Angolano, durante estes quase 37 anos, e resolveu mesmo dizer “basta”. Aprendam a conviver com essa realidade, porque a realidade é mesmo essa.
À guisa de conclusão, devo dizer que só o MPLA não está interessado em eleições. Pelo menos sem batota, sem fraude, sem as quais sabe que vai sucumbir. Depois de 37 anos de desgovernação; de desrespeito pelo cidadão angolano; de desrespeito pelos mais elementares direitos dos cidadãos; de flagrantes e repetidas violações da lei; de assunção e aplicação das mais erradas políticas sociais e económicas; de verdadeiro afundamento dos angolanos na mais vil das misérias, mesmo sendo donos de um país de recursos invejáveis (apesar do reconhecimento público por parte do Poder de que este não tem nada a ver com isso); de clara, traiçoeira e vergonhosa expropriação do erário, propriedade de todos nós para enriquecimento ilícito de uns poucos; valerá a pena perguntar para que lado vai pender o veredicto do Povo Angolano nas próximas eleições, sem essa fraude doentia que não largam desde 1975? Afinal, quem é que, na realidade, terá medo das eleições? É mais do que claro que, se os resultados eleitorais não forem, mais uma vez, decididos num “Comité de Especialidade” de uma esquina qualquer, o Governo a sair das próximas eleições será da UNITA. E este é o pavor que “Melos, Pereiras, Pintos e Cª” vão experimentando. Só que a verdade nua e crua é esta: chegou a hora da mudança e ninguém vai poder impedir que isso ocorra.
Peço desculpas lá onde a verdade dói muito. Mas não é nada pessoal. É apenas a limitação de não poder responder ao Manuel quando é o João que fez as afirmações.
1 comentário:
Caro Raul Danda, mais verdades do que essas não existem. Eu vivi tudo isso que descreveu e sei como tudo se passou. Se fosse para eu responder ao João Melo, nem uma virgula retiraria ao seus argumentos! Parabéns!
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