domingo, 23 de fevereiro de 2014

Não aconselhava ninguém, mas mesmo ninguém a entrar em euforia quanto à situação da Ucrânia,



pois o desenrolar rapidíssimo dos acontecimentos coloca cada vez mais interrogações.

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O desmoronamento rápido do regime do Presidente Victor Ianukovitch não é surpreendente, pois era odiado pela maioria esmagadora da população ucraniana, tão pró-UE, como pró-Rússia. Durante a sua presidência, os pobres ficaram ainda mais pobres, enquanto que o seu clã ficou cada vez mais rico. O filho estomatólogo do dirigente ucraniano transformou-se numa das pessoas mais ricas do país, e não foi com o tratamento dos dentes dos ucranianos que ele juntou fortuna.
Tal como acontece nestas situações de rápida derrocada de regimes, as “ratazanas” apressam-se a fugir do navio e ou a fugirem para o estrangeiro, como parece ser o caso do ex-Ministro do Interior, ou a passarem para o lado dos vencedores, como numerosos deputados do Partido das Regiões.
Porém, a vitória da oposição, ou melhor, das oposições, ainda está longe de ser uma realidade.
Criou-se um verdadeiro vácuo no poder. Ninguém sabe onde se encontra o Presidente (diz-se que ele se encontra na cidade de Kharkov (Khirkyv) e que poderá participar numa assembleia de deputados do Leste do país), o governo está completamente inativo, o Parlamento tenta chamar a si o poder, mas também este processo não é fácil, pois os dirigentes demitiram-se.
As oposições têm que tomar medidas rápidas para restabelecer o controlo num país onde existem quatro centrais nucleares e não permitir o caos. Mas as dificuldades estão a ser muitas.
Primeiro, os moderados não sabem o que fazer com os radicais do Sector da Direita, que se recusam a abandonar o centro de Kiev e certamente não desejarão ficar de fora na partilha do poder.
Segundo, a libertação de Iúlia Timochenko também bem complicar ainda mais as contas das oposições, pois ela certamente não perdeu as ambições do poder na prisão e tentará recuperar o tempo perdido.
Os adversários da oposição pró-UE não irão ficar de braços cruzados, tanto mais se os vencedores não tiverem em conta os seus interesses. Além disso, eles recebem apoio directo e indirecto da Rússia, que não está nada satisfeita com o desenrolar dos acontecimentos e intervirá (não é obrigatório que seja de forma militar) à primeira falha do novo poder em Kiev.
Ou melhor, Moscovo já começou a intervir ao adiar sine die a concessão de parte do empréstimo de 15 mil milhões de dólares que Vladimir Putin havia prometido.
A União Europeia pode regozijar-se de ter conseguido um acordo entre o Presidente e a oposição, mas agora é preciso fazer o mais difícil: recriar as estruturas do poder de forma a não permitir a desintegração do país. E este processo deve ser feito de forma a não ostracizar qualquer sector da sociedade ucraniana. A UE envolveu-se no processo, ela tem de continuar envolvida na normalização da situação.
Eu fui testemunha da vitória das forças pró-ocidentais em 2004 e vi as esperanças que a população ucraniana depositava no Ocidente. A euforia foi gigantesca, mas a ressaca não foi mais pequena. Desta vez, a situação não vai repetir-se: ou se apoia realmente a Ucrânia (não sendo obrigatório fazê-lo hostilizando a Rússia, pelo contrário, a humilhação de Moscovo nada trará de bom) ou o país avançará rapidamente para uma situação catastrófica.

Se tal acontecer, a Ucrânia poderá cair nos braços da Rússia exausta, pronta a aceitar tudo. Há muitos políticos russos que esperam que isto aconteça.
PUBLICADA POR JOSÉ MILHAZES

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