A 10 de Março de 2012, 3 jovens foram detidos pelos agentes da Polícia de Intervenção Rápida (PIR) e agentes à civil, por decisão do Governo Provincial de Benguela (GPB), quando se pretendia realizar uma manifestação, no Largo da Peça, em Benguela, reclamando, entre outras coisas, contra a nomeação de Suzana Inglês para o cargo de presidente da CNE.
Porque razão decidiu o GPB reprimir a referida intenção de manifestação?
De acordo ao que se pôde acompanhar com o processo de julgamento, 4 jovens subscreveram uma carta dirigida ao GPB a 13 de Fevereiro de 2012, a comunicar a intenção de realizarem uma manifestação a 10 de Março de 2012 (sábado) pelas 13 horas, no Largo 1.º de Maio. Nessa carta, apresentavam os objectivos. No entanto, não colocaram outros dados que, de acordo à lei, são solicitados, como profissão e morada. Mas, deixaram contactos telefónicos.
Desta maneira, os promotores cumpriram com o prazo (mais de 3 dias de antecedência), a descrição do local, horário e objectivo. Não cumpriram com o referente ao número de assinaturas (faltou uma) e em relação aos dados já especificados como profissão e morada, embora tivessem deixado formas de contacto (números de telefone).
De acordo à Lei 16/91 de 11 de Maio, Lei das Manifestações, o GPB, logo na altura do depósito da referida comunicação, violou a mesma, já que de acordo ao ponto 4 do Artigo 6.º (Comunicação) deveria imediatamente passar um documento comprovativo da sua recepção. Seria nessa altura, que daria conta de que, estavam em falha os dados já citados e daria as devidas explicações, recusando-se a recepcionar a comunicação.
Depois, e ainda, o GPB não comunicou aos promotores, no prazo de 24 horas, a decisão de proibir a realização da manifestação, conforme espelhado no ponto 1 do artigo 7.º da mesma lei.
De acordo aos Declarantes da acusação, não o fez porque não tinha endereço e porque os telefones ora (de acordo a uns) não funcionavam, ora (de acordo a outros) ninguém atendia. Mesmo assim, não mostraram em tribunal a referida comunicação, o que deixa portanto concluir, que o GPB não escreveu qualquer comunicação.
Mas na ausência de morada ou de telefone, as regras administrativas obrigam a fixação da comunicação num edital, o que também não foi feito.
Antes pelo contrário, ficou claro também durante o processo no tribunal, que o GPB não só não comunicou sobre a intenção de proibir a manifestação aos seus promotores, como endereçou um ofício, a 20 de Fevereiro de 2012, à Direcção provincial do SINSE e Comando Provincial de Benguela da Polícia Nacional, para que estes tomassem as devidas medidas de acordo à análise da questão.
A 7 de Março de 2012, os promotores, voltaram a endereçar uma comunicação ao GPB para solicitar a devida protecção, conforme estabelece o artigo 9.º da citada Lei (Garantias do exercício dos direitos). Enfocam também a alteração do percurso que deveria ter a concentração junto ao Liceu Cte. Kassanje, passar pela Av. Agostinho Neto e terminar no "Jardim Milionário".
Em resposta a esta comunicação, a 8 de Março (feriado) o GPB contacta um dos promotores telefonicamente e marca um encontro no referido "jardim milionário" no qual faz a entrega de uma comunicação onde consta a decisão de proibição. Diz aqui, que a manifestação no 1.º de Maio não estava autorizada por estar a menos de 100 metros de uma sede de um partido político. Pretende o GPB fazer recurso ao ponto 3 do artigo 4.º (limitações ao exercício do direito).
Como é visível, nesta comunicação o GPB faz ainda referência ao primeiro local apontado pelos promotores e nenhuma referência a quaisquer outras falhas.
Achamos importante salientar que o ponto 3 do artigo 4.º da Lei das manifestações, não diz que é proibido organizar-se uma manifestação a menos de 100 metros de uma sede partidária, mas diz "Por razões de segurança, as autoridades competentes poderão impedir a realização de reuniões ou de manifestações em lugares públicos situados a menos de 100 metros de...."
E diz a lei, logo no ponto 1 do artigo 7.º (Proibição de realização de reunião ou manifestação) que, e transcrevemos:"O Governador ou o Comissário que decida, no termos do disposto nos artigos 4.º e 5.º, n.º 2, da presente lei, proibir a realização de reunião ou manifestação deve fundamentar a sua decisão e notificá-la por escrito, no prazo de 24 horas a contar da recepção da comunicação, aos promotores, no domicílio por eles indicado e às autoridades competentes."
Já no ponto 2 do mesmo artigo, diz:"A não notificação no prazo indicado no ponto anterior é considerada como não objecção para a realização da reunião ou manifestação."
Como podemos interpretar a referida Lei, o não cumprimento dos pressupostos de "n.º de assinaturas e de colocação de profissão e morada" não é argumento para proibição da manifestação por parte do GPB. Mas sim, seria motivo para a não aceitação da comunicação na altura do seu depósito.
Depois, o facto de na primeira comunicação os promotores terem colocado o Largo 1.º de Maio como local da manifestação, na segunda comunicação apresentaram a devida alteração. A decisão, errada de proibição do GPB referia-se ao primeiro local e não ao segundo trajecto apresentado pelos promotores, pelo que deixa de ser aceite a sua decisão de proibição acrescida da falta de fundamentação.
Por outro lado é certo, também, que os jovens foram detidos no Largo da Peça e não nem no Largo 1.º de Maio, nem no Liceu Cte. Kassanje, nem na Av. Agostinho Neto e tão pouco no "jardim milionário". Os jovens tinham à última da hora mudado de local. Isto também serviu de pretexto para a acusação. Estarem concentrados num local nunca antes apontado em qualquer uma das duas comunicações dos promotores. Mas também aqui temos um argumento. O GPB tinha concentrado bastantes efectivos de agentes da PIR em todos os locais indicados e ao mesmo tempo tinha autorizado (há quem diga prepositadamente) organização nesses locais de outras actividades.
Porque a Procuradoria acusou e o Tribunal condenou?
Juntando à acusação de desobediência em relação à decisão de proibição da manifestação por parte do GPB, tentaram ainda acusar de terem os manifestantes incorrido no crime de agressão contra as autoridades por terem feito recurso à resistência e à agressão dos agentes através de apedrejamento. Acusação esta, não provada e fácilmente desmentível através das imagens de vídeo que transcrevemos mais a baixo. Porque então precisou a polícia, o GPB e a Procuradoria recorrer a esta falsidade?
Por outro lado, entre os 3 detidos e reús desse processo, Hugo Kalumbo, Jesse Lufendo e David, apenas o primeiro era um dos promotores da manifestação. O segundo é activista da OMUNGA e o terceiro, simples curioso que ali parou.
Mas o Juíz, perante todos os factos achou ter encontrado provas de desobediência e acusar os 3 reús à pena de 45 dias de prisão. Tão simplesmente isto! Mas não só isto, indeferiu, inicialmente o requerimento do advogado de defesa, de pagamento da caução e soltura imedata dos mesmos, argumentando que tal decisão deveria ser pronunciada pelo Tribunal Supremo. Queria, o Meretíssimo Juíz, ver os 3 jovens na cadeia, aqui sim, simplesmente isso!
De forma correcta, o Procurador interferiu demonstrando que, sendo a pena de efeito suspensório, deveria o Tribunal deferir o requerimento do Advogado de defesa. Assim foi e os 3 jovens, sob pagamento de caução no valor de 50000,00 Kz cada, foram postos em liberdade na noite de sexta-feira esperando o recurso da sentença no Tribunal Supremo.
Poderemos concluir:Governo, Polícia, Procuradoria e Tribunal juntos na repressão das liberdades fundamentais? A quem podem os cidadãos recorrer?
Em comunicado, a OMUNGA chamava à atenção que, perante este quadro de coisas, os cidadãos não terão outra saída que senão recorrer à Desobediência Civil, enquanto um direito de todos!
Lobito, 20 de Março de 2012
José Patrocínio
http://quintasdedebate.blogspot.com/2012/03/dia-10-de-marco-de-2012-3-jovens-foram.html
Porque razão decidiu o GPB reprimir a referida intenção de manifestação?
De acordo ao que se pôde acompanhar com o processo de julgamento, 4 jovens subscreveram uma carta dirigida ao GPB a 13 de Fevereiro de 2012, a comunicar a intenção de realizarem uma manifestação a 10 de Março de 2012 (sábado) pelas 13 horas, no Largo 1.º de Maio. Nessa carta, apresentavam os objectivos. No entanto, não colocaram outros dados que, de acordo à lei, são solicitados, como profissão e morada. Mas, deixaram contactos telefónicos.
Desta maneira, os promotores cumpriram com o prazo (mais de 3 dias de antecedência), a descrição do local, horário e objectivo. Não cumpriram com o referente ao número de assinaturas (faltou uma) e em relação aos dados já especificados como profissão e morada, embora tivessem deixado formas de contacto (números de telefone).
De acordo à Lei 16/91 de 11 de Maio, Lei das Manifestações, o GPB, logo na altura do depósito da referida comunicação, violou a mesma, já que de acordo ao ponto 4 do Artigo 6.º (Comunicação) deveria imediatamente passar um documento comprovativo da sua recepção. Seria nessa altura, que daria conta de que, estavam em falha os dados já citados e daria as devidas explicações, recusando-se a recepcionar a comunicação.
Depois, e ainda, o GPB não comunicou aos promotores, no prazo de 24 horas, a decisão de proibir a realização da manifestação, conforme espelhado no ponto 1 do artigo 7.º da mesma lei.
De acordo aos Declarantes da acusação, não o fez porque não tinha endereço e porque os telefones ora (de acordo a uns) não funcionavam, ora (de acordo a outros) ninguém atendia. Mesmo assim, não mostraram em tribunal a referida comunicação, o que deixa portanto concluir, que o GPB não escreveu qualquer comunicação.
Mas na ausência de morada ou de telefone, as regras administrativas obrigam a fixação da comunicação num edital, o que também não foi feito.
Antes pelo contrário, ficou claro também durante o processo no tribunal, que o GPB não só não comunicou sobre a intenção de proibir a manifestação aos seus promotores, como endereçou um ofício, a 20 de Fevereiro de 2012, à Direcção provincial do SINSE e Comando Provincial de Benguela da Polícia Nacional, para que estes tomassem as devidas medidas de acordo à análise da questão.
A 7 de Março de 2012, os promotores, voltaram a endereçar uma comunicação ao GPB para solicitar a devida protecção, conforme estabelece o artigo 9.º da citada Lei (Garantias do exercício dos direitos). Enfocam também a alteração do percurso que deveria ter a concentração junto ao Liceu Cte. Kassanje, passar pela Av. Agostinho Neto e terminar no "Jardim Milionário".
Em resposta a esta comunicação, a 8 de Março (feriado) o GPB contacta um dos promotores telefonicamente e marca um encontro no referido "jardim milionário" no qual faz a entrega de uma comunicação onde consta a decisão de proibição. Diz aqui, que a manifestação no 1.º de Maio não estava autorizada por estar a menos de 100 metros de uma sede de um partido político. Pretende o GPB fazer recurso ao ponto 3 do artigo 4.º (limitações ao exercício do direito).
Como é visível, nesta comunicação o GPB faz ainda referência ao primeiro local apontado pelos promotores e nenhuma referência a quaisquer outras falhas.
Achamos importante salientar que o ponto 3 do artigo 4.º da Lei das manifestações, não diz que é proibido organizar-se uma manifestação a menos de 100 metros de uma sede partidária, mas diz "Por razões de segurança, as autoridades competentes poderão impedir a realização de reuniões ou de manifestações em lugares públicos situados a menos de 100 metros de...."
E diz a lei, logo no ponto 1 do artigo 7.º (Proibição de realização de reunião ou manifestação) que, e transcrevemos:"O Governador ou o Comissário que decida, no termos do disposto nos artigos 4.º e 5.º, n.º 2, da presente lei, proibir a realização de reunião ou manifestação deve fundamentar a sua decisão e notificá-la por escrito, no prazo de 24 horas a contar da recepção da comunicação, aos promotores, no domicílio por eles indicado e às autoridades competentes."
Já no ponto 2 do mesmo artigo, diz:"A não notificação no prazo indicado no ponto anterior é considerada como não objecção para a realização da reunião ou manifestação."
Como podemos interpretar a referida Lei, o não cumprimento dos pressupostos de "n.º de assinaturas e de colocação de profissão e morada" não é argumento para proibição da manifestação por parte do GPB. Mas sim, seria motivo para a não aceitação da comunicação na altura do seu depósito.
Depois, o facto de na primeira comunicação os promotores terem colocado o Largo 1.º de Maio como local da manifestação, na segunda comunicação apresentaram a devida alteração. A decisão, errada de proibição do GPB referia-se ao primeiro local e não ao segundo trajecto apresentado pelos promotores, pelo que deixa de ser aceite a sua decisão de proibição acrescida da falta de fundamentação.
Por outro lado é certo, também, que os jovens foram detidos no Largo da Peça e não nem no Largo 1.º de Maio, nem no Liceu Cte. Kassanje, nem na Av. Agostinho Neto e tão pouco no "jardim milionário". Os jovens tinham à última da hora mudado de local. Isto também serviu de pretexto para a acusação. Estarem concentrados num local nunca antes apontado em qualquer uma das duas comunicações dos promotores. Mas também aqui temos um argumento. O GPB tinha concentrado bastantes efectivos de agentes da PIR em todos os locais indicados e ao mesmo tempo tinha autorizado (há quem diga prepositadamente) organização nesses locais de outras actividades.
Porque a Procuradoria acusou e o Tribunal condenou?
Juntando à acusação de desobediência em relação à decisão de proibição da manifestação por parte do GPB, tentaram ainda acusar de terem os manifestantes incorrido no crime de agressão contra as autoridades por terem feito recurso à resistência e à agressão dos agentes através de apedrejamento. Acusação esta, não provada e fácilmente desmentível através das imagens de vídeo que transcrevemos mais a baixo. Porque então precisou a polícia, o GPB e a Procuradoria recorrer a esta falsidade?
Por outro lado, entre os 3 detidos e reús desse processo, Hugo Kalumbo, Jesse Lufendo e David, apenas o primeiro era um dos promotores da manifestação. O segundo é activista da OMUNGA e o terceiro, simples curioso que ali parou.
Mas o Juíz, perante todos os factos achou ter encontrado provas de desobediência e acusar os 3 reús à pena de 45 dias de prisão. Tão simplesmente isto! Mas não só isto, indeferiu, inicialmente o requerimento do advogado de defesa, de pagamento da caução e soltura imedata dos mesmos, argumentando que tal decisão deveria ser pronunciada pelo Tribunal Supremo. Queria, o Meretíssimo Juíz, ver os 3 jovens na cadeia, aqui sim, simplesmente isso!
De forma correcta, o Procurador interferiu demonstrando que, sendo a pena de efeito suspensório, deveria o Tribunal deferir o requerimento do Advogado de defesa. Assim foi e os 3 jovens, sob pagamento de caução no valor de 50000,00 Kz cada, foram postos em liberdade na noite de sexta-feira esperando o recurso da sentença no Tribunal Supremo.
Poderemos concluir:Governo, Polícia, Procuradoria e Tribunal juntos na repressão das liberdades fundamentais? A quem podem os cidadãos recorrer?
Em comunicado, a OMUNGA chamava à atenção que, perante este quadro de coisas, os cidadãos não terão outra saída que senão recorrer à Desobediência Civil, enquanto um direito de todos!
Lobito, 20 de Março de 2012
José Patrocínio
http://quintasdedebate.blogspot.com/2012/03/dia-10-de-marco-de-2012-3-jovens-foram.html
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