O Livro Apócrifo de Job (I)
Depois de uma grande batalha militar ganha, os anos passam, a fome continua, aumenta. Não teve valor essa batalha.
As desgraças do petrofaminto
A adversidade do Petróleo é cruel para o petrofaminto
Com pele e ossos estão sempre à nossa mercê. Esse é o nosso segredo. Então o Petróleo saiu deixando um pouco de sal na ferida do petrofaminto, dizendo que era um feitiço bom. A sua mulher disse-lhe: não entendo como é possível… que passados trinta e tal anos ainda acredites no Petróleo. Amaldiçoa o Petróleo para que ele morra. O petrofaminto respondeu: és doida, nós já estamos habituados a receber mal do Petróleo, nunca recebemos bem. É preferível aceitar o Petróleo, porque sempre podemos roubar qualquer coisita. E veio uma delegação de três membros com o feiticeiro da água benta consolá-lo, e disse: Que naquele tempo fizemos uma matança, e que o petrofaminto não se esquecesse dela. E lançaram-lhe um pó sobre a sua cabeça, feito especialmente por um ancião de Malanje. E ficaram com ele mais de sete dias e sete noites, até que jurasse que nunca abandonaria o Petróleo do seu coração.
O petrofaminto amaldiçoa o Petróleo pela miséria que lhe causou
Depois disto o petrofaminto tornou a amaldiçoar o dia em que o Petróleo se apoderou do poder. E disse: pereça o dia em que nasceu. O dia em que foi concebido. Há os que nunca deviam ter saído das trevas. Por vezes Deus engana-se, e dá luz a quem a não merece. Que o Petróleo fique sempre nas trevas, mas como o obrigar a lá retornar? E que as nuvens mais escuras entrem na sua cabeça. E nela desabem cascatas de pedra, e o empedre na noite dos tempos. Mas retornamos sempre… à espera que o Petróleo nos lance para o pranto. Escureça-se a estrela do seu coração. Que a luz do Petróleo não venha.
Que as mulheres cosam os ventres, apertem bem as pernas, para que o signo do Petróleo nelas não penetre. E que conseguindo penetrar, saindo do ventre com o signo do Petróleo, que logo expire. Se não expirar, que as mamas não deitem leite. Porque assim poderei repousar em paz. E que não venham os habituais conselheiros, como esse da água benta assolar-me. E que não me tragam nem uma gota desse maldito ouro negro, como unguento. Estamos cansadas de fazer abortos ocultos por causa do Petróleo. Os maus do Petróleo perturbam-nos, e nunca se cansam.
O Petróleo dá muita força. Estamos todos reféns do Petróleo. Os juízes não nos defendem. Eles são os grandes, ensinam-nos que não podemos ficar livres destes senhores. Porque eles são os que dão a vida e a morte aos miseráveis. Insistem na sua amargura. Que esperam a morte, anos e anos, a cavar à espera de encontrar algum diamante oculto. Mas normalmente só encontram a sepultura. Porque se dá luz ao Petróleo? Porque não está sempre encoberto? Com tanta água, gemo e suspiro porque não consigo fazer o meu pão. Porque o que temia do Petróleo veio, e realmente aconteceu. Nunca mais tivemos descanso, nem sossego, nem repouso. Aprendemos a viver com a perturbação do Petróleo.
O Petróleo repreende o petrofaminto
Queres abandonar as nossas fileiras? Estás cansado dos nossos discursos? Já enganaste muitos, conforme te ensinámos, estás cansado de os enganar? Eles procuram-te, diz-lhes qualquer coisa, como por exemplo, que nem daqui a cem anos a vida vai melhorar. Diz-lhes a verdade, com essa mentira. Eles acreditam em tudo. No princípio acreditavas no nosso Petróleo, na nossa ideologia, e agora descobriste que tudo não passa de baboseiras. Já é tarde! Agora queres ficar inocente? Esqueces-te que também os destruíste? Quem persistiu no grande Petróleo, tem que aguentar as consequências. O pior é se nos julgarem depois, e enviarem-nos para uma prisão. Eles já estão consumidos na ira. Quem sabe, até podemos escapar. Enquanto estão entretidos com a feitiçaria, vamos avançando.
Gil Gonçalves
Inicialmente publicado no Jornal O Observador
Depois de uma grande batalha militar ganha, os anos passam, a fome continua, aumenta. Não teve valor essa batalha.
As desgraças do petrofaminto
A adversidade do Petróleo é cruel para o petrofaminto
Com pele e ossos estão sempre à nossa mercê. Esse é o nosso segredo. Então o Petróleo saiu deixando um pouco de sal na ferida do petrofaminto, dizendo que era um feitiço bom. A sua mulher disse-lhe: não entendo como é possível… que passados trinta e tal anos ainda acredites no Petróleo. Amaldiçoa o Petróleo para que ele morra. O petrofaminto respondeu: és doida, nós já estamos habituados a receber mal do Petróleo, nunca recebemos bem. É preferível aceitar o Petróleo, porque sempre podemos roubar qualquer coisita. E veio uma delegação de três membros com o feiticeiro da água benta consolá-lo, e disse: Que naquele tempo fizemos uma matança, e que o petrofaminto não se esquecesse dela. E lançaram-lhe um pó sobre a sua cabeça, feito especialmente por um ancião de Malanje. E ficaram com ele mais de sete dias e sete noites, até que jurasse que nunca abandonaria o Petróleo do seu coração.
O petrofaminto amaldiçoa o Petróleo pela miséria que lhe causou
Depois disto o petrofaminto tornou a amaldiçoar o dia em que o Petróleo se apoderou do poder. E disse: pereça o dia em que nasceu. O dia em que foi concebido. Há os que nunca deviam ter saído das trevas. Por vezes Deus engana-se, e dá luz a quem a não merece. Que o Petróleo fique sempre nas trevas, mas como o obrigar a lá retornar? E que as nuvens mais escuras entrem na sua cabeça. E nela desabem cascatas de pedra, e o empedre na noite dos tempos. Mas retornamos sempre… à espera que o Petróleo nos lance para o pranto. Escureça-se a estrela do seu coração. Que a luz do Petróleo não venha.
Que as mulheres cosam os ventres, apertem bem as pernas, para que o signo do Petróleo nelas não penetre. E que conseguindo penetrar, saindo do ventre com o signo do Petróleo, que logo expire. Se não expirar, que as mamas não deitem leite. Porque assim poderei repousar em paz. E que não venham os habituais conselheiros, como esse da água benta assolar-me. E que não me tragam nem uma gota desse maldito ouro negro, como unguento. Estamos cansadas de fazer abortos ocultos por causa do Petróleo. Os maus do Petróleo perturbam-nos, e nunca se cansam.
O Petróleo dá muita força. Estamos todos reféns do Petróleo. Os juízes não nos defendem. Eles são os grandes, ensinam-nos que não podemos ficar livres destes senhores. Porque eles são os que dão a vida e a morte aos miseráveis. Insistem na sua amargura. Que esperam a morte, anos e anos, a cavar à espera de encontrar algum diamante oculto. Mas normalmente só encontram a sepultura. Porque se dá luz ao Petróleo? Porque não está sempre encoberto? Com tanta água, gemo e suspiro porque não consigo fazer o meu pão. Porque o que temia do Petróleo veio, e realmente aconteceu. Nunca mais tivemos descanso, nem sossego, nem repouso. Aprendemos a viver com a perturbação do Petróleo.
O Petróleo repreende o petrofaminto
Queres abandonar as nossas fileiras? Estás cansado dos nossos discursos? Já enganaste muitos, conforme te ensinámos, estás cansado de os enganar? Eles procuram-te, diz-lhes qualquer coisa, como por exemplo, que nem daqui a cem anos a vida vai melhorar. Diz-lhes a verdade, com essa mentira. Eles acreditam em tudo. No princípio acreditavas no nosso Petróleo, na nossa ideologia, e agora descobriste que tudo não passa de baboseiras. Já é tarde! Agora queres ficar inocente? Esqueces-te que também os destruíste? Quem persistiu no grande Petróleo, tem que aguentar as consequências. O pior é se nos julgarem depois, e enviarem-nos para uma prisão. Eles já estão consumidos na ira. Quem sabe, até podemos escapar. Enquanto estão entretidos com a feitiçaria, vamos avançando.
Gil Gonçalves
Inicialmente publicado no Jornal O Observador
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