Abdul Rodrigues,
Desde quarta-feira que seis crianças
estão detidas na Direcção Provincial de Investigação Criminal de Luanda (DPIC),
sob a acusação de terem incendiado uma viatura de marca Toyota Corolla. Todos
os detidos são menores de 13 anos, do sexo masculino, e foram capturados por
agentes policiais da Divisão do Sambizanga, às cinco da madrugada do dia 18 de
Junho, sem qualquer mandado de busca ou captura. As detenções ocorreram na
comuna do Ngola Kiluange.
A queixa foi apresentada pelo suposto
proprietário da viatura, que alegadamente tem uma testemunha fidedigna, mas que
«até ao momento não se conseguiu apresentar na DPIC». Os familiares contaram
que «o dono da dita viatura estava no carro-patrulha a indicar as casas à
polícia». «O mesmo senhor estava na viatura da polícia quando foram buscar o
meu filho as 5h00. Era ele quem estava a indicar», afirma António Domingos, pai
de Costa Domingos, de 7 anos, o mais jovem do grupo. António Domingos informou
que, no momento da detenção, o seu filho dormia na residência da avó, pelo que
se assustou quando recebeu a chamada telefónica na madrugada de quarta-feira.
«Quando me espantei devido à ligação pensei que fosse assunto de morte ou
doença. Ainda achei que fosse brincadeira da minha mãe», recorda António.
Idalina Martins é mãe do pequeno Emanuel
Bengue, de 11 anos, também encarcerado na DPIC. «Eu já estava a me preparar
para ir ao trabalho. Acho que era por aí 5h15 quando os polícias bateram à
porta e me informaram que tinham vindo prender o meu filho por ter queimado um
carro», diz a senhora, consternada.
Na manhã de sexta-feira, defronte à
DPIC, encontrámos Manuel Francisco na companhia dos demais progenitores dos
outros pequenos detidos. O seu filho é o mais velho dentre os demais: tem 13
anos. Flor Mugiba, de apenas oito anos, filho de Félix Mugiba, e é considerado
“o mais descontente da prisão”. Ao longo destes três dias de encarceramento,
Mugiba “tem gritado bastante, principalmente à noite”, ao contrário dos outros,
que “pensam tratar-se duma brincadeira”. Jonathan Serra, com 13 anos, foi
detido em casa de Fátima Julieta, sua mãe, também às cinco da madrugada.
«Enquanto os bandidos estão a roubar, a polícia madruga para ir caçar o meu
filhinho. Essa é a justiça deste país», desabafa Fátima, com lágrimas nos
olhos. Encontra-se ainda detido um menino que aparenta ter 11 anos. Não foi possível
proceder à identificação do menor, porque até sexta-feira não apareceu nenhum
familiar para o representar.
Segundo relatos colhidos no bairro, a
alegada viatura foi incendiada e encontra-se encostada naqueles arredores há
cerca de um mês.
Fonte do Departamento de Prevenção e
Combate à Delinquência Juvenil da DPIC ligada ao processo adiantou que
«brevemente o caso será remetido ao Julgado de Menores». Tal informação foi
transmitida aos familiares das crianças, facto que não aconteceu até à data actual,
pelo que «estão em risco de serem ouvidos só na segunda-feira». No entanto, até
à data da audiência, os meninos deverão permanecer detidos, isto porque a DPIC
não tem competências para decretar a sua liberdade, conforme fez saber o
instrutor processual em declarações aos familiares dos garotos.
A mesma fonte referiu hoje, ao Maka
Angola, que os menores continuam detidos por indisponibilidade da
juíza do julgado de menores em ouvi-los.
Uma advogada, que preferiu o anonimato,
considerou as detenções dos menores como ilegais. “A responsabilidade penal em
Angola inicia com 16 anos, para a larga maioria dos crimes. Em casos
excepcionais, de homicídio, por exemplo, o adolescente pode ser encarcerado a
partir dos 14 anos”, explicou a advogada.
Para a também professora de Direito, “a
polícia não deve deter ninguém sem mandado de captura, a menos que seja em
flagrante delito”.
De realçar que, na proposta do MPLA,
para o novo Código Penal, há a intenção de diminuir a idade a partir da qual o
menor pode ser responsabilizado. No entanto, permanece a falta de consenso,
entre os líderes do partido no poder, se a idade de responsabilização penal
deve ser de 12 ou 14 anos da idade.
Entretanto, a DPIC recusou hoje a
entrada de Idalina Bengue para fazer o curativo ao seu filho Emanuel Bengue,
que tem uma ferida no pé. Segundo a mãe, a DPIC alegou que hoje não é dia de
visitas e, por essa razão, a criança só poderá receber curativo no dia
seguinte.
Tentámos contactar o autor da queixa,
mas este desligou o telefone tão logo o Maka Angola se
identificou.