sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

A Ocidente do Paraíso (9). Quando conseguia alguns do Brick Bradford com o seu pião do tempo


Um dia chamou-me e começou a aliciar-me para transportar tijolos para o segundo andar. Em troca receberia algumas moedas, o que para mim parecia ser uma pequena fortuna. Na minha ignorância pensei que pouco demoraria a carregar os tijolos e receber o meu dinheiro. Mas por mais esforços que fizesse a carregá-los, parece que nunca mais acabavam. Vi a aldrabice que me tinha sido feita. A minha mãe quando soube, foi muito aborrecida ter com ele, e disse-lhe se não tinha vergonha de andar a explorar crianças. E que era por isso que estava rico. E porque andava sempre a enganar as pessoas. Como resposta ele apenas se limitou a rir, aquele riso que nos considera a todos idiotas.

Como só apareciam livros de caubóis, continuava na sua leitura. Quando conseguia alguns do Brick Bradford com o seu pião do tempo, deslumbrava-me. Comecei a gostar muito de ficção científica. Entretanto, com os meus amigos fazíamos grandes batalhas de caubóis e índios.
Consegui improvisar um arco de aço muito potente. As flechas eram varetas de guarda-chuvas também de aço. Tornei-me exímio no seu manuseamento, até ao dia que decidi apontar a uma galinha de uma distância considerável. Lancei a flecha e acertei em cheio no pobre animal. Entrei em pânico e corri atrás dela para retirar a flecha, para que ninguém soubesse do sucedido, mas ela parecendo querer incriminar-me fugiu na direcção da minha mãe. Acabou-se o arco e flechas para sempre.

Nas proximidades construíam uma auto-estrada. Alguns amigos disseram-me que tinham feito uma descoberta. Pediram-me para que os acompanhasse. Partimos, chegados ao local havia uma abertura na terra. Um deles tinha uma lata com azeite e um bocado de pano ao qual pegou fogo. Com essa luz improvisada avançámos. Eram grutas escavadas na terra, com algumas ramificações e quanto mais avançávamos mais surgiam. Alguém teve a ideia de marcar os locais para não nos perdermos. Num ponto do trajecto com receio de estarmos perdidos decidimos regressar.

Voltámos lá mais uma vez. Entretanto um dos meus amigos disse-me que encontraram algumas moedas, mas alguém, talvez um historiador ou arqueólogo que por ali apareceu açambarcou-as. Acho que essas grutas serviam para as fugas históricas dos cercos de Lisboa, ou para penetração de forças para o seu interior.

À noite, um dos meus amigos convidou-me para assistir a um filme que estava a dar na televisão. Era o Homem Invisível de Herbert George Wells. Mas tínhamos que ir a outro café que ficava a cerca de dois quilómetros, porque a mercearia próxima já não deixava entrar menores. Lá fomos e chegados ao café deparamo-nos com um empregado a fazer de segurança na porta para evitar que não entrássemos.

A televisão intencionalmente ficava por cima da porta de entrada, e quando o empregado servia algum cliente nós aproveitávamos e víamos o filme aos bocados, porque quando ele vinha enxotava-nos para a rua. Fazíamos o jogo do entra e sai. Para a minha idade o filme tinha muito suspense, deixava-me muito medo. Porque ver uma pessoa invisível a bater noutra, a tirar as ligaduras para ficar invisível, ou quando tirava os óculos e nasciam-lhe dois buracos.

Imagem: http://www.comicsfun.com/comicart/albums/comic_strips/BrickBradford_8_30_70.gif

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