domingo, 16 de outubro de 2011

“Nós vamos acabar com este regime em menos de dois anos”, assegura Carbono Casimiro


Luanda - Pouco mais de 24 horas depois de ser emancipado na cadeia de alta segurança sob decisão do Tribunal Supremo, o jovem que agora virou simbolo da luta contra a ditadura imposta pelo MPLA e o seu presidente José Eduardo dos Santos, concedeu no meio de um aparato policial aparentemente esfomeado, esta brevíssima entrevista.

* Lucas Pedro
Fonte: Club-k.net
Eduardo dos Santos usa o poder
que tem para impôr o perfume da ditadura
“Porra... meu”, são as primeiras palavras expressas pelo rapper, num gesto de brincadeira esbanjada com um largo sorriso rasgado nos lábios. “Bro... é necessário falarmos agora?”, questionou ao autor destas linhas que acompanhou os manifestantes desde o local de concentração, frente ao cemitério Sant’Ana, até ao local onde se previa realizar o acto.

“Não sei que horas são, mas hoje temos todos o dia ganho, porque atingimos todas as expectativas que prevíamos neste acto”, garantiu o rapper Carbono Casimiro, assegurando que “em menos de dois anos, nós vamos acabar com este regime. O povo vai provar que está cansado de sofrer e de ser roubado por este grupito. Chega de ditadura e de estrangeirismo”. “José Eduardo dos Santos não é patrióta”, asseverou o nosso entrevistado. O caro leitor pretende saber o porquê? Então acompanhe a conversa!
Club-k – Como é foi a vossa detenção no dia 3 de Setembro do corrente?
Carbono Casimiro – A nossa detenção foi, presumivelmente, por termos saído do perímetro consignado para a realização da nossa manifestação no dia 3 de Setembro. O pessoal teve algum problema com um dos companheiros foi raptado muito antes do início da manifestação. Daí algumas pessoas decidiram marchar em direcção ao palácio presidencial caso esse companheiro não fosse trazido até a nós.
O pessoal realmente tinha essa intenção. Mas, infelizmente, fomos detidos das piores formas possíveis, com a máxima carga brutal por parte da polícia. Alguns manifestantes foram, gravemente, feridos nessa incursão da polícia e houve pessoas que perderam sentidos por causa desse excesso da força usada pelos agentes presentes.
Fomos detidos e levados às esquadras como se tivéssemos a ser raptados. Porque muitas gentes, inclusive, os nossos familiares, tentavam nos contactar e, nem sequer tinham conhecimento sobre o nosso verdadeiro paradeiro.
Ficamos muitos dias sem ter contacto com ninguém até ao princípio do julgamento que, podíamos através dos nossos advogados, comunicarmo-nos com os nossos familiares.

Que apreciação faz do julgamento, sumariamente, submetidos?
O julgamento foi à base de mentiras que a polícia inventou. A polícia e o tribunal criaram uma façanha para sermos julgados e condenados a todo custo, sem sequer levar em consideração a nossa defesa.
Primeiro é que, os nossos advogados não tiveram acessos aos nossos depoimentos antes do julgamento. Eles (os advogados) tinham que ter acesso ao processo, por outro lado, e por outro, tinham que ter contactos com conosco. Está acção descrevia a pura violação do processo jurídico angolano e a vontade de um determinado grupo de pessoas, que alguns dizem ser general José Maria.

Qual foi a vossa reacção sobre a decisão do juíz que conduziu o vosso caso?
Bom, durante o julgamento nós já tínhamos quase noção dos resultados. Tínhamos a certeza que seriamos condenados a todo custo. Não importava a nossa defesa, não importava os factos e não importava os nossos pronunciamentos porque o juíz já tinha uma pré-condenação contra nós. E fomos vítimas disso. Mais uma vez o governo agiu com musculadamente. E toda gente sabe que o governo é musculado. Eles usam tudo que tiverem aos seus dispores para que todas as situações lhes favorecessem. E é o que aconteceu.
Porque era um julgamento em que, os polícias deviam ser presos, e posteriormente pagarem por agredirem os jovens manifestantes. A par isso, deviam pagar por mentirem diante do juíz sob juramento. Em qualquer parte no mundo, isso dava detenção às polícias. Mas nós sabíamos que isso não iria acontecer porque a polícia é do MPLA e o MPLA é quem manda em tudo. Infelizmente, vivemos num estado em que as instituições são partidarizadas. Os tribunais têm uma ordem superior. A polícia tem uma ordem superior do partido MPLA. Os comandantes policiais são militantes do MPLA e dependem sempre de ordem superior. No fundo, no fundo, todos aqueles indivíduos que ocupam cargos numa instituição pública ou privada dependem de ordens superiores. O que os tornam nos principais violares das leis existentes no país.

Como é que foram os vossos primeiros dias na prisão de alta segurança, no Bengo?
Olha, nós não percebemos o porque, supostamente, pelo suposto crime que tivéssemos cometidos, não seriamos levados a uma prisão de alta segurança. Fomos levados a uma das cadeias de mais alta segurança do país, Cadeia de Caboxa, em Caxito, alguns ficaram na cadeia de Viana em regime privado. Só eles (11) estavam em pavilhão inteiro. Inicialmente, estávamos todos juntos, depois da primeira noite fomos transferidos para a cadeia de Caxito, onde ficamos num lugar de mais alta segurança.

Club-k – Como é que eram tratados dentro desta cadeia de Caboxa?
C.C. – Fomos tratados com bastante rigidez, como tivéssemos matado. Realmente, foi se nós fossemos assassinos. Tudo o que acontecia ai era fruto de ordem superior. Então se mandassem dar-te na cara, ele dava porque tinha de cumprir ordens superiores. Ficamos trancados, sem acessos aos nossos familiares. Durante os primeiros 14 dias, lembro-me que a minha mãe teve lá e não conseguia ter contactos com nós por ordens superiores, o que já violava o regulamento dos serviços prisionais. Porque todo preso tem os seus direitos.
Existem ordens neste país que estão acima de todas as leis, que é ordens superiores.

Como é reagiram quando foram informados da decisão do Tribunal Supremo?
Nós tínhamos facilidade de todas as informações e não adianta aqui divulgar. Sobre o nosso destino, nós ficamos, a saber, através de meios de informações. De facto, acusamos uma felicidade enorme.

Finalmente, a justiça foi feita?
Não porque a justiça foi feita. Nós não tínhamos nem sequer estar presos, sejam lá quantos dias fossem. Então ainda não foi feita a justiça. A justiça somente será feita quando chamarem as pessoas que nos acusaram, e prenderam, falsamente. Isso eu digo a partir dos comandantes que ordenaram as nossas detenções, do juíz e da procuradoria.

Para terminarmos, vocês querem ser indemnizados?
Nós só queremos que se faça a justiça. Se tiver que ser à base de indemnizações, que seja. Se tiver que ser na base de sei lá o quê, que seja.
Sobre os nossos haveres. Nós temos telefones, t-shirts, utensílios de higiene pessoal espalhados em todas as unidades possíveis de Luanda. Computadores, dinheiros, mochilas, câmeras fotográficas, e não fizeram devolução de nada. Lembro-me que o Kadimi-x, foi um dos detidos dos 21, foi à busca do seu telemóvel na 3ª Esquadras e o comandante disse-lhe descaradamente que tinha sido devolvido ao proprietário. Mas que proprietário que ele entregou se o Kadimixi teve preso? Alguma coisa está errada.
Acabei de ver agora a minha máquina de filmagem num agente do SISE, em que eu reivindiquei ser o proprietário da máquina e a polícia não fazia nada. Teve o comandante, que está a controlar a manifestação hoje, intervir e de reter a máquina das mãos do tal dito bófia. Não sei se este bófia já foi identificado. Já que o ministro do Interior, Sebastião Martins andou a fazer publicidade que a polícia é um órgão de bem e serve o povo, então eu só povo agradecia imenso que a minha máquina fosse devolvido.

O que balanço faz da manifestação de hoje?
Eu só quero dizer, não sei se são que horas, temos o dia ganho. Se todos sairmos daqui para casa agora, o dia está mais que ganho e muito superior as expectativas que prevíamos alcançar.

... Sobre a condenação de um dos seus advogados William Tonet?
Mais uma vez o governo de Angola, MPLA, José Eduardo dos Santos está a usar do poder que tem para impôr o perfume da ditadura sobre os cidadãos pobres, nomeadamente: os operários, prolectários, camponeses. Digo isso por quê? Por que quando mataram os jovens da Frescura e quando foi comprovado as pessoas que mataram, foram todos julgadas e o Governo teve de indemnizar os familiares das vítimas. E o William Tonet levantou questões sobre determinadas pessoas de topo da sociedade angolana que são considerados intocáveis vai ser cobrado uma multa de 100 mil dólares. Não sei por que, mas os governantes de Angola pensam que todo mundo é gatuno como eles. Pensam que toda gente têm o poder de roubar o dinheiro do petróleo do povo. E povo não tem esse dinheiro. Um cidadão angolano que vive de salário base pode trabalhar durante um ano, nunca vai conseguir economizar, de forma legal ou honesta, 100 mil dólares. Agora como é que vão obrigar o senhor William Tonet pague 100 mil dólares em cinco dias? Isso é absurdo, e só é visto num regime de ditadura. Num regime que o senhor José Eduardo dos Santos quer impôr aos angolanos, ou que vem pondo há mais de 32 anos. E nós vamos acabar com este regime. Este regime não tem mais de dois anos. O povo vai provar que está cansado de sofrer; o povo vai provar que chega de roubalheira, chega de ditadura e chega de estrangeiros. José Eduardo dos Santos não é patrióta.
Tem dito que José Eduardo dos Santos não é angolano, é mpelano. Acho que isso é uma república dentro da República de Angola, e nós vamos acabar com esta república paralela.

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