sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A floresta (I). Uma história verídica


Na minha juventude, sentia prazer mágico, quando acompanhava o meu pai na direcção de uma floresta. Enquanto ele, depois de parar o automóvel, sentava-se num banco de pinho e apreciava a frescura do local e o seu silêncio, eu embrenhava-me floresta adentro. Primeiro olhava para os pinheiros, que já estavam bem crescidos. Via os recipientes colocados para colherem a resina que deles escorriam, e por vezes, não sei explicar bem porquê, derrubava alguns deles.

Não sabia que com isso estava a prejudicar alguém, ou pelo contrário, com que direito alguém cortava, feria pinheiros. Acho que os pinheiros não devem ser castigados assim. E prosseguia, afundava-me na floresta. Via algumas plantas com flores muito bonitas. E como que um descobridor de um novo mundo, mergulhava, aprofundava-me imenso pela floresta até me sentir quase perdido. Havia um riacho com rãs. Pegava num pequeno ramo seco e perseguia-as, mas elas não se intimidavam com a minha presença.

E quanto mais avançava, havia outro riacho, com dimensões maiores, e aqui amedrontava-me. Alguns peixes pequenos saltitavam na água, grandes libélulas pairavam à minha volta, como se se aborrecessem com a minha presença. Os pinheiros, ventados, pareciam murmurar qualquer coisa da voz humana. Toda a vegetação ondulava de um modo como se quisesse andar, mover-se do solo, desplantar-se.

Apavorado, ainda conseguia forças para ir um pouco mais longe. A tremer, acompanhei o curso do riacho, prometendo-me que ficaria por aí. Queria chegar até um pinheiro muito grande, rodeado de lírios, porque me parecia ouvir a voz de uma criança. E quando me aproximei, vi de facto que era uma criança, sozinha e sentada junto à água. Pensei que os seus pais deveriam estar por perto, mas depois vi que além de mim, não existia mais ninguém.

Tomado de um terror súbito, corri a alta velocidade, imaginando que toda a floresta e a criança misteriosa me perseguiam. Só me senti tranquilo, quando acabei de chegar atarantado junto do meu pai.
Não lhe contei nada, com receio de ser chamado de maluco. Notei que além do meu pai não existia mais ninguém, e perguntei-me: Quem seria essa criança?
Gil Gonçalves

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