Lisboa - Em 1975, MPLA, UNITA e FNLA estavam em guerra
pelo poder em Angola. Na disputa participaram várias forças internacionais, em
apoio do MPLA. Otelo terá ajudado a convencer Fidel a enviar tropas para a
ex-colónia.
Fonte: DW
Club.k-net
O assunto era secreto. Por isso, era necessária máxima
discrição. Enquanto uma delegação de portugueses e cubanos almoçava no
restaurante "Los Canaviales", perto da capital cubana Havana, o
militar da revolução portuguesa Otelo Saraiva de Carvalho e Raúl e Fidel Castro
foram para uma sala mais isolada. Em cima da mesa, o possível envio de tropas
cubanas para Angola.
"E o Fidel disse-me: 'Eu recebi há uma semana uma delegação angolana do MPLA, que me trouxe uma carta dramática de Agostinho Neto. É que estão tropas sul-africanas, em apoio da UNITA, a entrar em Angola pelo rio Cunene, pela fronteira sul com a Namíbia”, recorda Otelo.
“Por outro lado”, continua, “o FNLA, apoiado por
forças do Mobutu [Sese Seko], do Congo, estão a entrar pelo norte e o MPLA está
numa situação enfraquecida. Está em Luanda, mas vai ter grande dificuldade em
resistir a este cerco. E pede-me apoio militar."
Era o mês de julho de 1975. Depois da revolução de 25
de Abril de 1974 em Portugal que derrubou a ditadura fascista, os novos
governantes portugueses apressaram-se a acabar com a guerra colonial e a
encetar diálogos com os movimentos de libertação.
Em Janeiro de 1975, Portugal reconheceu a
independência de Angola na vila algarvia de Alvor. No acordo então assinado,
previa-se que o poder fosse distribuído por três movimentos de libertação
angolanos: o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), a União Nacional
para a Independência Total de Angola (UNITA) e a Frente de Libertção de Angola
(FNLA). E ficou ainda decidido que a proclamação oficial da independência de
Angola seria a 11 de Novembro de 1975.
“Tropas cubanas para Angola, já!”
Mas, logo após o Acordo de Alvor, estalou a guerra. Na
altura, o MPLA controlava Luanda – uma posição vantajosa que o movimento queria
manter. Face à perspectiva de um cerco à capital angolana, na conversa com
Fidel Castro, o militar português Otelo foi claro: era fundamental apoiar o
MPLA.
"Perguntava-me o Fidel: 'Vocês vão mandar tropas
para lá para poderem apoiar o MPLA?' E eu disse-lhe: 'Nem penses nisso! Numa
situação como esta, com três movimentos de libertação em jogo, no terreno, o
Governo português atual não vai tomar posição por nenhum dos partidos.'
'Então o que achas que eu faça?' Disse: 'Eu se estivesse
no teu lugar, fazia o seguinte: começava já a mandar tropas cubanas, se
possível negras, para Angola, já. Desembarcam ali em Luanda e ficam em apoio do
MPLA.”
Segundo Otelo Saraiva de Carvalho, essa era a
possibilidade que o MPLA tinha de sobreviver. Os homens do MPLA estavam apenas
habituados à "guerrilha" e, na altura, a guerra tomava outras
feições.
Visita decisiva?
A visita de Otelo a Cuba terá certamente ajudado a
convencer Fidel Castro a enviar tropas para Angola, refere o historiador português
José Milhazes. "Não só Otelo, mas também o almirante Rosa Coutinho e
outros portugueses que, naquele momento, estavam a dirigir Angola no período de
transição tudo fizeram para que o poder fosse entregue ao MPLA”, esclarece.
Os primeiros militares cubanos chegaram a Luanda em
outubro de 1975. Estava-se nas vésperas da independência. Eles eram tantos que,
segundo o escritor colombiano Gabriel García Marquez, nem o próprio líder do
MPLA, Agostinho Neto, queria acreditar. "Por este andar, Cuba vai arruinar-se",
terá dito Neto na altura.
De repente, o xadrez político-militar no terreno
mudava completamente, a favor do MPLA, afirma José Milhazes. "Se as tropas
não tivessem sido enviadas para Angola, se Fidel Castro tivesse consultado
primeiro os soviéticos antes de enviar as tropas, é muito provável que os
soviéticos lhe tivessem dito para esperar, e nesse caso sem tropas soviéticas,
é claro que o MPLA não aguentaria o poder depois do dia 11 de Novembro."
Nesse dia, Agostinho Neto proclamou a independência em
Luanda. A UNITA e a FNLA aliaram-se contra o MPLA e declararam a independência
no Huambo. A guerra civil em Angola só terminaria 27 anos depois, muito após a
saída dos cubanos do país em maio de 1991.
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