Nota de imprensa da Global Witness: 15 de Março de 2010
A Sonangol, empresa petrolífera estatal de Angola, nomeou o genro do presidente angolano José Eduardo dos Santos para o Conselho de Administração de uma empresa holding que controla um terço da firma petrolífera portuguesa cotada na Bolsa de Valores, a Galp Energia, conforme a Global Witness.
Fonte: Zwela Angola
Angola é um país empobrecido que depende da sua indústria petrolífera para pagar a reconstrução após uma longa guerra civíl. Angola tem uma reputação de corrupção grave, a qual a Global Witness vem noticiando na última década.
1 O povo angolano tem um dos índices de expectativa de vida mais baixos do mundo: 46.5 anos, segundo as Nações Unidas.
2 A Galp possui importantes investimentos de petróleo em Angola, uma ex-colónia de Portugal, e opera em estreita relação com a Sonangol, cujo presidente, Manuel Vicente, tem lugar no Conselho de Administração da Galp.
3 Um terço das ações da Galp pertencem à holding denominada Amorim Energia BV. Quarenta e cinco por cento das ações da Amorim Energia pertencem a uma empresa chamada Esperaza Holding BV, a qual é uma subsidiária da Sonangol. O restante das ações da Amorim Energia é ultimamente controlado pela família Amorim de Portugal.
4 Entre os membros do Conselho de Administração da Amorim Energia está incluído Sindika Dokolo, um empresário casado com Isabel dos Santos, uma filha do presidente angolano.
5 Como será feito claro nesta nota, a Global Witness tomou conhecimento de que Dokolo foi nomeado para este posto em Abril de 2006 pela Esperaza Holding. Esta última era na íntegra propriedade da Sonangol nessa época, de acordo com registros corporativos holandeses.
6 “O genro do presidente angolano, um empresário privado, não deveria trabalhar tão estreitamente com a empresa estatal responsável pela administração do petróleo de Angola em nome dos seus cidadãos,” afirmou Diarmid O’Sullivan da Global Witness. “Esta situação levanta receios sobre conflitos de interesse aos quais a Sonangol não respondeu.” O parceiro minoritário da Sonangol na Esperaza Holding é a Exem Holding AG, uma empresa discreta baseada no cantão suíço de Zug, que não divulga publicamente as identidades dos seus proprietários.
7 Um director da Exem Holding, um financeiro baseado em Paris chamado Konema Mwenenge, revelou à Global Witness que ele possui uma relação “profissional” com Dokolo. Mas Mwenenge declinou dizer se Dokolo tem algum interesse financeiro na Exem Holding.
8 O próprio Dokolo, através do seu advogado, declinou responder às questões da Global Witness.
9 O presidente da Sonangol, Manuel Vicente, não respondeu às questões escritas.
10 O facto de que o genro do presidente angolano aparenta ter estado a representar a Sonangol no investimento indirecto desta companhia na Galp não evidencia a prática de nenhum acto ilícito. Mas estas revelações levantam outras questões sobre a transparência da Sonangol, a empresa petrolífera estatal que domina a economia de Angola. A Sonangol arrecada bilhões de dólares de receitas anuais em nome do governo angolano e regula o acesso de outras empresas às reservas de petróleo e gás de Angola, mas não publica as suas contas e divulga escassa informação detalhada sobre as suas atividades. Quando o presidente Eduardo dos Santos pediu “tolerância zero” para a corrupção em Novembro de 2009, um membro proeminente do partido do governo, MPLA, disse que os angolanos deveriam sentir-se livres para criticar o presidente em relação aos negócios da sua família, conforme reportou a agencia de notícias Reuters.
11 O bilionário português Américo Ferreira de Amorim é o presidente da Amorim Energia. Ele disse à Global Witness, numa resposta de três páginas às questões levantadas nesta nota, que Dokolo tinha sido nomeado para o Conselho de Administração da Amorim Energia “de acordo com a nomeação da Esperaza Holding”.
12 “O fato de que o Sr. Dokolo é o esposo da filha do presidente José Eduardo dos Santos não parece ser em si mesmo relevante quer para qualificá-lo ou não como membro do Conselho de Administração da Amorim Energia, e como tal não foi um fator para nomeá-lo como um administrador não-executivo da Amorim Energia,” escreveu Amorim na sua carta para a Global Witness. Ele acrescentou: “Eu posso dar-lhes a minha visão pessoal sobre o fato de que a nomeação do Sr. Dokolo não levantou discussões com respeito a assuntos de ordem ética.” Amorim disse na sua carta que a relação entre a Amorim Energia e a Galp era regida por um acordo de acionistas que estava em vigor antes de Dokolo ingressar no Conselho de Administração da primeira companhia. A Global Witness não declara, ou pretende insinuar, que as empresas controladas pela família Amorim estejam envolvidas em qualquer tipo de atividade ilícita ou ilegítima. No final de 2006, a participação de 100 por cento da Sonangol na Esperaza Holding tinha caído para 60 por cento. Os outros 40 por cento pertenciam a uma subsidiária da Exem Holding.
13 À Exem Holding, através das suas subsidiárias, foi-lhe concedido acesso, pela Sonangol, a potenciais investimentos lucrativos no petróleo e gás angolanos, embora pareça ser, fora isso, desconhecida na industria petrolífera.
A Sonangol autorizou as subsidiárias da Exem Holding a: • Adquirir uma participação de 40 por cento na Esperaza Holding até ao final de 2006, tornando-a uma parceira nos investimentos indirectos da Sonangol na Galp.
• Adquirir uma participação de 10 por cento num empreendimento de exploração de gás em Angola, anunciado em Dezembro de 2007. Este empreendimento é controlado pela Sonangol. Os outros acionistas incluem a Galp, a italiana ENI e a espanhola Gás Natural da Espanha.
14 Foi noticiado que ao empreendimento foi concedida uma licença de exploração de gás por dez anos, e isenção de impostos.
15 • Pré-qualificação, datada do final de 2007, para licitar com vista a obter licenças petrolíferas em Angola.
16 A Global Witness solicitou ao director da Exem Holding, Konema Mwenenge, para descrever o processo no qual a Exem Holding havia adquirido estes investimentos e oportunidades de investimento. Em resposta por e-mail, Mwenenge disse: “Como Diretor da Exem Holding, posso confirmar que as suas subsidiárias responderam a concursos públicos em Angola. Informação referente aos concursos encontra-se disponível no site da empresa petrolífera nacional de Angola.”
17 O site da Sonangol refere que uma subsidiária da Exem Holding foi pré-qualificada pela Sonangol para licitar por licenças de petróleo em Angola como uma “não- operadora”, ou seja, um accionista minoritário num empreendimento conjunto com outras empresas petrolíferas.
18 No entanto, não parece haver nenhuma informação neste site sobre concursos públicos em relação a outros interesses da Exem Holding. A Global Witness escreveu de volta e perguntou a Mwenenge onde poderia encontrar esta informação, mas ele não respondeu. Embora a Sonangol tenha a reputação de ser gerida de forma profissional, a sua opacidade e os laços estreitos que mantém com a elite governante de Angola há muito que são alvo de preocupação pública. A empresa petrolífera estatal vem sendo usada há muito tempo pelo governo para o empréstimo de somas elevadas de forma opaca e com pouca escrutínio público em relação ao uso do dinheiro.
19 Há mais de um ano, a Global Witness tem vindo a investigar as relações entre a Sonangol e certas empresas privadas que investem no sector petrolífero de Angola, as quais são geralmente complicadas e difíceis de desenlaçar devido à escassez de informação pública. Em Agosto de 2009, a Global Witness publicou informação sobre outra empresa privada pouco conhecida que estava pré-qualificada para licitar por direitos petrolíferos em Angola pela Sonangol no final de 2007. Entre os accionistas desta empresa, Sociedade de Hidrocarbonetos de Angola (SHA), encontrava-se o nome de Manuel Domingos Vicente. O presidente da Sonangol, que possui o mesmo nome, não respondeu ao pedido de comentário da Global Witness, tal como não o fizeram outros dois funcionários séniores que também possuíam os mesmo nomes de accionistas da SHA.
20 No final de 2009, o Fundo Monetário Internacional concordou em emprestar $1.4 bilhões a Angola em troca de compromissos políticos, incluindo mais transparência para a Sonangol, mas continua por verificar se esses compromissos serão de facto implementados.
21 “Numa altura em que o governo de Angola promete mais transparência ao FMI em troca de um socorro financeiro, as nossas constatações mostram que a Sonangol é tudo menos transparente,” disse O’Sullivan.
A Global Witness acredita que o governo angolano não poderá começar a reverter a reputação internacional de corrupção grave do país até que:
• A Sonangol explique a sua relação com Dokolo e identifique os proprietários beneficiários últimos da Exem Holding, os quais são actualmente desconhecidos do público.
• A Sonangol divulgue as suas contas auditadas e todos os detalhes dos movimentos de receitas do petróleo entre empresas petrolíferas estrangeiras, da própria Sonangol e do governo angolano.
• A Sonangol abdique do controle de alocação dos direitos de extracção de minérios e de petróleo em Angola em favor de uma agência independente que opere sob ampla supervisão pública e outorgue estes direitos de forma transparente.
• As empresas petrolíferas internacionais em Angola se comprometam elas mesmas a não entrar em parcerias com outras empresas mais pequenas, cujos principais proprietários beneficiários sejam desconhecidos do público.
• O governo assegure que os grupos da sociedade civil em Angola possam discutir livremente assuntos de interesse público, incluindo os relacionados com o sector petrolífero, sem receio de perseguição ou de censura de qualquer tipo.
Este documento é a tradução em português de uma nota de imprensa publicada originalmente em inglês pela Global Witness e entitulada “Link between Angolan president’s son-in-law and state oil company raises questions about transparency”. Para efeito de referência, por favor cite o documento original em Inglês disponível no site da Global Witness
Imagem: corrupcaocjw2a.blogspot.com/
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