A Mediateca do Lubango, inaugurada a 24 de Agosto
passado, pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, durante a
campanha eleitoral, continua em obras.
Orçada em quarenta milhões de dólares, a Mediateca
do Lubango, faz parte do programa de construção da Rede Mediatecas de Angola
(REMA), lançado por José Eduardo dos Santos a 11 de Novembro de 2010. A rede
prevê a construção de 25 mediatecas em todo o país, como são conhecidas as
bibliotecas informatizadas e multimídia.
Para o estudante universitário Henriques Mudundu, a
inauguração do edifício e o seu encerramento imediato para a conclusão das
obras, “não tem lógica”. O estudante explica as expectativas geradas no seio da
comunidade estudantil sobre o referido espaço de pesquisa, com capacidade para
albergar 250 pessoas em simultâneo. Quando abrir, o espaço albergará uma
colecção de mais de 10 mil livros, incluindo electrónicos, para além de jornais
electrónicos, publicações científicas e mais de cinco mil DVDs.
Para Gaspar Leonardo, do Instituto Superior de
Ciências de Educação (ISCED), a inauguração da Mediateca, apenas para fins
eleitorais, “é inadmissível num Estado sério. As pessoas podiam ser
responsabilizadas por este acto”.
“Vimos aqui pesquisar e as portas estão fechadas.
Isso é falta de respeito. Isso é falta de seriedade por parte dos nossos
governantes. [A construção da Mediateca] não é favor nenhum que o Estado faz. É
um dever pois o dinheiro com que foi construída é de todos nós” lamentou um
docente universitário sob anonimato. Para o docente, “se fosse um hotel de um dirigente
qualquer não estaria fechado”.
De acordo com informações recolhidas junto de
fontes ligadas ao projecto, o governo provincial da Huíla enviou, este ano,
quatro quadros seus a Portugal para a gestão do projecto.
“O curso tem a duração de quatro anos, é tudo
quanto sei e posso informar-lhe”, referiu um dos responsáveis ligados ao
projecto. A mesma fonte adiantou que alguns funcionários seleccionados para
trabalhar na Mediateca do Lubango estão a receber formação básica em Luanda.
Mas o problema maior do projecto de criação de
Mediatecas no país, sob o patrocínio de José Eduardo dos Santos, tem a ver
conflitos de interesse. O projecto de concepção e implementação da REMA foi
apresentado pela Fundação Eduardo dos Santos (FESA) e a empresa Nolimits Consulting
e aprovado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, através do Despacho
Presidencial 28/10.
O Presidente da República e o patrono vitalício da
FESA, são a mesma pessoa: José Eduardo dos Santos. Do ponto de vista ético e
legal trata-se de um conflito de interesses uma vez que, por interpretação
extensiva, o Presidente não deve exercer um cargo privado, assim como não deve
engajar o Estado em negócios particulares consigo próprio. Na FESA, o
Presidente tem competências supremas sobre a gestão quotidiana da sua fundação.
Ademais, a FESA continua a manter nos seus órgãos sociais membros do Governo e
deputados da Assembleia Nacional, assim como multinacionais estrangeiras e
empresas públicas, que também contribuem para os seus cofres sem transparência.
Por sua vez, o coordenador da REMA e vice-ministro
das Tecnologias de Informação, Pedro Sebastião Teta, também retira benefícios
pessoais do projecto. A sucursal angolana da empresa espanhola Impulso, na qual
o vice-ministro é sócio, é responsável pela fiscalização das obras, entre
outras tarefas.
A falta de separação entre o público e o privado,
no regime de dos Santos é patente nas declarações do coordenador da REMA ao Jornal de Angola,
a 28 de Fevereiro passado: “Pedro Sebastião Teta lembrou que a criação da Rede
de Mediatecas de Angola é uma iniciativa do Presidente da República, José
Eduardo dos Santos, que, em 2010, mobilizou uma doação financeira para custear
o projecto, para não sobrecarregar o Orçamento Geral do Estado”.
Como instituição de utilidade pública, assim
decidida por despacho presidencial, a FESA recebe fundos do Estado. Como pode,
então, esta fundação hipoteticamente fazer uma doação a um projecto do Estado?
Para as seis mediatecas construídas na primeira
fase, o projecto está avaliado em US $48 milhões, segundo declarações
públicas de Pedro Sebastião Teta. As primeiras províncias abrangidas são
Luanda, Benguela, Huíla, Lunda-Sul
Onde e como dos Santos mobilizou a referida doação
financeira, ou se dispendeu fundos da sua fortuna pessoal, continua a ser uma
incógnita. No interesse da transparência, o Presidente deve explicar onde
obteve os referidos fundos.
Para mais informações sobre os conflitos de
interesse do Presidente e da FESA, veja “A Promiscuidade do Presidente da República”.
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