sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Diagnosticar a crise, entendê-la, abordá-la e vencê-la. Canal de Opinião Por Noé Nhantumbo



É possível e não tão difícil como poderá parecer à primeira vista…
Juntamente com o “sistema económico mundial” os governos são os culpados pela situação de crise…

Beira (Canalmoz) - Fácil é aos políticos atirarem a culpa para os outros quando a crise ou dificuldades chegam. Sobejamente sabido é que os políticos são especialistas em atribuir as culpas aos outros.
É típico verificarem-se ofensivas mediáticas contra supostos culpados da situação em que se vive num determinado país. Quem se recorda de que o falecido Mutharika do Malawi culpava Moçambique e seu governo pela carência de combustíveis que seu país vivia? Dessa troca de palavras algumas vezes azedas, resultaram ataques a postos fronteiriços moçambicanos por forças malawianas.  També resultou a recusa firme do governo moçambicano em apadrinhar intenções malawianas, de ver realizada a navegação no rio Zambeze, como forma de entrada e saída de mercadorias malawianas. Um porto construído em terras malawianas permanece sem uso num investimento financeiro que poderia ter sido destinado a importação de combustíveis que faziam e fazem falta ao Malawi.
No Zimbabwe a tendência também é correr e culpar os britânicos ou sucessivos governos britânicos pela crise aguda que assolou aquele país.
Os pronunciamentos recentes de Armando Guebuza, PR moçambicano, tendem a ser similares aos de seus pares na região da SADC. São os outros que travam o desenvolvimento, são modelos de cooperação ou de intervenção das corporações ou o sistema económico mundial, o culpado primordial. Embora exista alguma verdade em algumas das proclamações dos dirigentes governamentais de África e de outros continentes convém estabelecer com clareza o que realmente se está passando de modo a não cairmos em mais logros.
Uma actuação convincente e com hipótese de granjear os apoios necessários raramente acontece em países como Moçambique. Acusar os outros é o caminho mais fácil mas na verdade é demagogia antiga e já ensaiada por outros dirigentes do chamado terceiro mundo.
A questão do desenvolvimento endógeno de nossos países, sua protecção dos efeitos da crise financeira internacional, o surgimento de dinâmicas económicas competitivas e que assegurem um fortalecimento que signifique sustentabilidade das opções escolhidas não depende só dos parceiros externos ou do que estes façam na sua relação connosco.
Que está fazendo especificamente AEG em Moçambique e na região da SADC para contrariar as tendências controladas pelo sistema económico mundial? O que se pode dizer que tenha sido sua herança como presidente de Moçambique e por um ano também líder da SADC? Quais foram os passos concretos ou legislação aprovada que tenham concorrido para acelerar o desenvolvimento de Moçambique?
Em quase todos os países da SADC uma coisa é comum, a democracia política não recebe a importância que seria de desejar e ver. Os políticos pretendem alcançar o poder e controlar a máquina governativa mas se esquecem com frequência de que o desenvolvimento de seus países na esfera económica depende intimamente da sua estrutura política, judicial e legislativa.
Quem se queixa de esquemas internacionais que impedem seu país de florescer não se deve esquecer de sua quota-parte no assunto.
Não é difícil encontrar a mão de governos africanos específicos em África por detrás de atrocidades legislativas e operacionais em suas economias.
Se a China se tornou o maior exportador mundial actual de madeira isso não resulta de corte interno da floresta chinesa. São árvores de África de países como Tanzânia, Zâmbia, Moçambique, Angola, Gabão e outros que são exportadas para a China, industrializadas neste país e depois vendidas no mundo inteiro. Como se pode queixar o governo de Moçambique liderado por AEG quando ele mesmo não faz o necessário para garantir que o corte de toros seja sustentável e que sobretudo as necessidades internas em madeira sejam garantidas? Como se pode aceitar as lamentações de quem destrói a sua base industrial em áreas como indústria ligeira e alimentar e depois se transforma em importador do que antes era produzido em seu país? Importar óleo alimentar, sabonetes, detergentes líquidos, papel higiénico é um dos resultados de políticas económicas específicas, abraçadas por um governo que teve a possibilidade de fazer diferente. Sabe-se que o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional aparecem com frequência como impositores de procedimentos e de políticas económicas. Também consórcios banqueiros internacionais, em consonância com governos de países que controlam as instituições de Bretton Woods, estabelecem condicionalismos que travam o desenvolvimento dos países receptores de ajuda e de créditos.
Mas querer algo na esfera política, económica e financeira internacional não se consegue através de lamentações e apelos. O respeito por interesses e posições específicos dos interlocutores só se tornam realidade quando há visão estratégica e todo um pensamento político correspondente.
Não há ofertas nem respeito especial pelos pedintes e os fracos.
Os fracassos registados no passado em organizações como os Não-Alinhados, deveu-se a alguma incipiência política e posturas completamente desenquadradas com os objectivos enunciados pelos líderes políticos. Ditadores, repressores em seus países iam para os pacos internacionais defendendo a chamada “Nova Ordem Económica Mundial”. Sejamos concretos e politicamente honestos, a miséria em que vive a maioria dos cidadãos do “Terceiro Mundo” é politicamente motivada. Não há dúvidas de que num jogo em que uma parte possui vantagens históricas, políticas e financeiras, o terreno não está nivelado e a outra parte tem de organizar-se e estruturar-se estrategicamente para sair-se bem no jogo.
Vejamos por exemplo a SADC, região africana privilegiada com recursos naturais mas politicamente instável. Os governos da região não estão conseguindo delinear estratégias que os coloquem em posição de potenciar suas economias e seus povos vivem num estado deplorável. Não se pode aceitar que quem se diz governo não consiga desenhar ou encontrar soluções para problemas concretos de seus concidadãos.
A responsabilidade de pessoas como o AEG é ultrapassar as lamentações do passado, de Fidel Castro e seus pares dos Não-Alinhados, avançando para um entendimento consentâneo com a realidade de hoje.
Não se pode negociar recursos minerais com as corporações internacionais numa base que seja totalmente favorável a estas e depois esperar por dividendos ou contrapartidas confortáveis. Na SADC, mesmo com a existência de uma experiência acumulada, regional na exploração de recursos minerais não tem emergido iniciativas tendentes a criação de consórcios regionais ou estratégias de fixação de preços que favoreçam os países possuidores de recursos. Carvão, ferro, ouro, diamantes são explorados há já bastante tempo em África e especialmente na região da SADC.
Qual seria a vantagem financeira final se o investidor no carvão de Tete, Moçambique fossem os governos da África do Sul, Moçambique e empresas locais dos dois países? Será que não havia potencial financeiro e tecnológico para fazer o que a VALE está fazendo em Moatize? Quem determinou o rumo das negociações que levaram a assinatura do contrato com a VALE? Quando se entra num campo novo como aconteceu com o governo de Moçambique será que este procurou a assessoria apropriada? Não terá havido alguma “ingenuidade estratégica” ao negociar os recursos minerais e madeireiros nacionais? Agora que se torna claro que o volume de contrapartidas recebidas por Moçambique é irrisório em relação ao que as corporações e demais intermediários recebem ou retiram surgem dúvidas e reclamações de diversos quadrantes.
Não se advoga que Moçambique siga uma estratégia de exploração de recursos que signifique a concretização da política dos “bantustões” preconizado pelo regime do apartheid sul-africano. Não se pretende entregar o poder de decisão de tal modo que se a soberania seja hipotecada ou colocada em risco.
Mas governar sem analisar as potencialidades existentes e os desafios que a sua exploração significa é em termos práticos um contrassenso.
Já deveriam ter sido efectuados investimentos na área de educação e formação de quadros em áreas como geologia, geotecnias, hidrocarbonetos, hidráulica, atendendo que o país era de potencial conhecido na área dos minerais e agricultura. Engenharia mecânica, electrotecnia e outras áreas tecnológicas deveriam estar sendo fomentadas pelo governo há bastante tempo. As justificações que se referem ao factor guerra civil não podem dominar o panorama das explicações e não constituem a verdade quando analisada a situação concreta de Moçambique.
Deve ser dito “alto e com bom som” que o governo tem sido estrategicamente “distraído”. Só pensa quando confrontado com factos concretos, quando a “sopa já se despejou”, quando já aconteceu o incêndio.
É preciso ver uma concertação política e tecnológica acontecendo com os países, os governos, os políticos, antes que haja alterações significativas na maneira como os negócios são efectuados em nossos países.
A dependência em que se encontra Moçambique, Zimbabwe ou Malawi continuarão a fazer parte do cenário enquanto estes países forem incapazes de estabelecer novas regras na negociação do que possuem.
Há uma dimensão cultural, ética, moral, política que deve ser introduzida nas lides domésticas e diárias destes países se a intenção é realmente ver-se o desenvolvimento despontando e solidificando-se.
Trabalho diligente, transparência governamental na sua actuação, assumir pela parte do governo a necessidade estratégica da participação dos diferentes segmentos da sociedade na formulação das políticas públicas e indispensável e de crucial importância para qualquer esperança de êxitos.
Deve exigir-se transparência nos actos governativos que lesam todos os cidadãos nos seus interesses e isso acontece quando os governos vendem ao desbarato os recursos que possuímos.
O governo possui a prerrogativa de governar, de tomar decisões e de responder no parlamento. Em cada ciclo eleitoral o cidadão tem a possibilidade de punir ou premiar os candidatos a governo ou deputado.
Só poderemos almejar a desenvolvimentos concretos e sustentáveis em ambiente democrático, sem fraudes ou manipulação eleitoral.
Há que falar bonito e apreciam-se bons demagogos ou retóricos de topo mas isso jamais substituirá a democracia que falta em Moçambique ou na maior parte dos países que vivem prejudicados por regras de jogo postas em prática pelos poderosos.
Quem não compreende que a força dos fracos reside em sua união deveria estar fazendo algo de diferente a não política e governo…. (Noé Nhantumbo)

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