sexta-feira, 16 de abril de 2010

A Ocidente do Paraíso (46). Os guerrilheiros até conseguiram roubar a roupa que estava estendida próxima do gabinete do comandante.


Uma das consequências disso foi o envio por via aérea de alimentos frescos por pequenos aviões fretados para o efeito. Sardinhas portuguesas, pimentos, carne, vinho fresco, etc. A nossa ração melhorou e o moral da tropa também. Isto era necessário, enquanto o comando procurava uma companhia para a nossa rotação. Naturalmente que grande parte do tempo era passado a jogar à sueca. Por vezes surgiam grandes discussões por causa das famosas renúncias, e não acabavam em pugilato quase por milagre. Mas também não se desconhecia que se isso acontecesse, caía-nos em cima o RDM-Regulamento de Disciplina Milita. Já prestes a terminar a comissão, era de bom-tom evitar a todo o custo incidentes desta natureza.

As nossas cadeiras construíam-se de forma original. Das barricas com aduelas, depois de terminado o seu conteúdo, serravam-se de tal modo que se transformavam em verdadeiras obras de arte da picada. Nunca consegui saber quem foi o seu inventor.
Decidi ser repórter de guerra. Para isso necessitava de uma máquina fotográfica, o que consegui através de um furriel quando de uma sua deslocação a Luanda. A máquina era em segunda mão. A sua embalagem de transporte era muito resistente, blindada, o que permitia suportar pancadas fortes. Era ideal para um ambiente de guerra. Consegui fotos com nitidez a meio metro de distância. Conclui que só tiraria fotos de slides. Acompanhei algumas vezes os pelotões, pois queria deixar algo para a posteridade.

Normalmente quando uma coluna saía, a primeira viatura era uma Berliet, que tinha sacos de areia debaixo e à frente. Era o rebenta minas. Atrás da cabine tinha uma protecção blindada para a instalação de uma metralhadora que podia disparar em todas as direcções. As caixas de munições espalhadas em todas as viaturas tinham um cordel amarrado para permitir que em caso de ataque se pudessem puxar, e assim ter acesso a mais munições. Esta ideia surgiu, devido a um pelotão que algures sofreu um ataque. Todos saltaram para o capim, e depois não tinham como chegar às munições que ficaram nas viaturas.

O capitão tinha que sair até Nambuangongo. Antes faria uma curta paragem em Zala. Para descacimbar também fui na coluna. Ao chegar a Zala dirigi-me para a área das comunicações. A primeira coisa que me informaram foi que assim que anoitecia, rebentava bruto tiroteio. Mas de vez em quando também de dia isso acontecia. Existiam protecções de sacos de areia à volta. Quando cheguei junto a uma das protecções, advertiram-me para me agachar porque poderia ser atingido.

Em Nambuangongo a situação não era melhor. Postaram vigias com binóculos que observavam atentamente todos os locais. Mas ao escurecer, era tal o tiroteio que ninguém vivia em paz. Os guerrilheiros até conseguiram roubar a roupa que estava estendida próxima do gabinete do comandante. A cadeira dele chegou a ser furada com alguns tiros. Por sorte ele não se encontrava lá nesse momento. Os guerrilheiros iludiam os vigias porque rastejavam pelo meio dos montes. Havia nas proximidades uma companhia de Flechas, e desconfiavam que eles lhes davam assistência.

Imagem: http://batalhao2833.blogspot.com/2009/10/meios-aereos.html

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