quarta-feira, 12 de agosto de 2009

O Livro das demolições (2)


Noutro dia veio uma delegação de alto nível chefiada pelo MPLA. O General Jardim Éden estava presente. Então o MPLA disse ao General Jardim Éden:
- Onde tens andado? Porque não proteges os bens do meu vassalo Job?!
O General Jardim Éden respondeu:
- Estou sempre vigilante, está tudo sob controlo e não notei nada de anormal.
Disse o MPLA ao General jardim Éden:
- O vassalo Job merece a minha admiração. É a única pessoa honesta que resta no reino. Tomara que houvesse mais como ele. Confesso que os corruptos ganharam o campeonato da corrupção… e apuraram-se para o campeonato mundial. Facilmente obterão a vitória final.
O General Jardim Éden respondeu ao MPLA:
- A vitória é incerta. O terror da corrupção termina em assassinatos, ajustes de contas, até à vitória final do grande terramoto político. Parece que já sabemos como isto vai acabar.
O MPLA disse ao General Jardim Éden:
- A nossa secreta informou-me que você está envolvido no roubo das terras. Tratamos disso depois. Peço-lhe que não atente contra a vida de Job.

O General Jardim Éden baldou-se. Quando viu o luxuoso avião particular do MPLA desaparecer no céu mandou alguns dos seus matadores de confiança darem uma grande sova a Job, mas de maneira que não o matassem.
O corpo de Job ficou macadamizado. Job apanhou uma folha de bananeira para limpar as feridas. Tudo à sua volta parecia uma chuva de cinzas. Sentou-se nos restos de tijolos e na madeira queimada. A sua esposa disse-lhe:
- Ainda gostas do MPLA?! Depois do que o General Jardim Éden dele te fez?! És muito parvo!
- As mulheres não entendem nada destas coisas. Apesar do General Jardim Éden me espoliar e privatizar tudo o que tinha, devo obediência e lealdade ao MPLA.
- Eu é que trabalho na terra!.. o teu fanatismo é escravidão, não é lealdade! És um grande atraso de vida! Onde estão os teus amigos do MPLA, em quem tanto confiavas?
- Hão-de vir... Hão-de vir!

E chegaram alguns amigos do MPLA que confortaram Job. Um disse-lhe que a sua conta bancária estava em baixo. Os outros tristemente confessaram que também lhes espoliaram e demoliram tudo o que tinham. Que o mal era geral... um reino de demolições. Trabalhar de verdade não era possível, porque espoliar continua fácil. Ficaram uns dias a acalentá-lo e sentaram-se nas sobras de algumas cadeiras. Depois, cansados foram-se embora. Um deles ao despedir-se reafirmou:
- O reino da fome está combalido.

Apareceram alguns grupos de espoliados, esfomeados que aproveitaram as sobras. O local ficou igual a um deserto. Job bocejou, apetecia-lhe dormir. Falou para o vento cúmplice que arrastava as cinzas:
- Tantos e tantos anos de trabalho em vão. Não dá para trabalhar nesta terra, porque depois vem um General Jardim Éden e fica com ela, privatiza-a. Finge que a trabalha à espera que surja um sócio estrangeiro. Mas eles já não acreditam nisso e a terra abandona-se. Fica para acampamento de deslocados que na verdade são refugiados, e assim sucessivamente. As trevas dominam este reino. O MPLA está sempre lá em cima sentado no seu trono. Raramente desce, sobe, ou sai. Adora rodear-se de pessoas que mais parecem lâmpadas fundidas, que dão pouca luz, ou acendem de vez em quando. A minha terra, a minha Luanda, a minha Angola, contaminam-se, nunca mais nelas nada crescerá. Resta-me olhar para as nuvens e para os restos das árvores que parecem fantasmas ao luar. Tantos anos em vão que trabalhei. Agora tudo ficou igual às noites escuras. Nunca mais perderei anos, meses e dias nestas coisas.

Imagem: Estádio de Luanda 1
http://www.girabola.com/estadios-do-can-2010-caracteristicas/

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