Quanto é que as multinacionais pagam pelos direitos de
exploração de gás natural em Moçambique?
Quem não se defende acaba sugado pelos “vampiros”…
Beira
(Canalmoz) - Um farmeiro americano no Ohio, EUA, recebe três milhões de dólares
americanos pelos direitos de exploração de petróleo nos seus 700 acres, cerca
de 283 hectares de terra. É o que se pode ler no NYT (New York Times) de
30/12/2012. Evidentemente que as leis em diferentes países diferem e que o
valor pela exploração de recursos iguais não é o mesmo em todo o mundo.
A
informação respeitante aos valores que as pessoas negoceiam na praça pública
são conhecidos, e dos negócios estabelecidos, não há possibilidade de surgirem
“guerras pelos recursos” como parece já recorrente em África.
Quando
se apela a emergência de uma política de transparência é preciso que se diga
que o estado de direito tem de ser uma realidade antes que a transparência se
verifique no terreno. Aquela desilusão que se apossa das pessoas e instituições
tem causas próprias. Existe uma impunidade institucional implantada, uma forte
rede de traficantes de influência que se especializou em angariar interessados
nos recursos minerais moçambicanos e em negociá-los em nome de que só eles
sabem. São estes os factores que concorrem para o atraso do estabelecimento da
legislação apropriada para a exploração da riqueza mineral do país. Há
objectivamente interessados em que tudo continue incipiente, precário,
incompleto e inconsequente.
É
comum verificar-se que em Moçambique quase ninguém sabe quanto pagam as
corporações multinacionais em cada bloco ou concessão recebida ou entregue pelo
governo. Nada disto acontece por acaso pois “onde há mel aparecem muitas
moscas” querendo aproveitar.
Quando
nos dizem ou querem fazer-nos crer que se trata de um dossier complexo tudo
visa limitar drasticamente o número de pessoas realmente informadas sobre a
dimensão e valores envolvidos nos negócios.
Mesmo
a escolha dos titulares dos pelouros da energia e dos recursos minerais é feita
tendo em conta a sua capacidade de cumprir escrupulosamente com instruções
superiores. Se antes Moçambique já teve quase um ministro dos recursos minerais
vitalício isso obedece também a uma estratégia.
Uma
barragem de silêncio parlamentar em que a maioria se recusa a fazer as
perguntas pertinentes associa-se ao que é a agenda do governo e da liderança de
seu partido de suporte.
Está
tudo num pretenso “segredo dos deuses”. Aparecem ministros arrogantemente
afirmando que é necessário preservar os segredos por causa da natureza dos
negócios.
Numa
situação em que não há uma legislação minuciosamente elaborada sobre os
recursos minerais, em que não existe um código de mineração que seja baseado no
estudo e visita dos diversos instrumentos legislativos existente a nível
torna-se evidente quer Moçambique vive um vazio legislativo sabiamente
aproveitado pelos diversos interlocutores na área dos minerais.
A
corrida desenfreada a aquisição de concessões e licenças em Moçambique é um dos
frutos dos lobistas e demais intervenientes se terem dado conta de que podiam
realizar negócios milionários da noite para o dia, bastando para tal descobrir
e quantificar determinada reserva.
Riversdale,
empresa australiana detentora de licença de pesquisa e exploração de carvão em
Tete, Moçambique não hesitou em vender o que tinha a Rio Tinto, sacando biliões
de dólares numa operação em que o país detentor do recurso ficou a “ver
navios”. Aproveitaram-se dos “buracos legais” para realizar uma operação
altamente lucrativa.
Só
que existe todo o direito de duvidar da natureza dos “buracos legais” que
permitiram que tal operação fosse realizada sem vantagem financeira alguma para
Moçambique. Com tantos conselheiros, assessores, ministros e directores,
experts do mundo académico e empresarial, quase todos principescamente pagos,
seria de esperar que no mínimo aconselhassem o executivo moçambicano a
precaver-se.
Convenhamos
que é extremamente conveniente e oportuno que as descobertas de reservas de
minerais com interesse estratégico aconteçam numa situação de vazio legislativo
ou em que a legislação aprovada ainda seja muito precária e muito longe de
garantir assim como proteger os interesses públicos moçambicanos.
As questões
dos recursos naturais, nomeadamente minerais, é obviamente o cavalo de batalha
de diversos interesses específicos. Uma estratégia eleita pelos conselheiros do
governo e pelos seus integrantes é fazer de conta que não ouvem nem escutam o
que o público diz. Com o parlamento solidamente controlado o governo quer
continuar a executar uma política mineira atrasada e lesiva aos mais legítimos
interesses nacionais. Onde os cofres do estado sairiam beneficiados há
governantes decidindo que mais vale serem suas contas bancarias crescendo. De
outro modo não se pode compreender porque a persistência em vender tao barato
cada tonelada de carvão moçambicano.
Compreensível
que esta situação, oportunamente explorada pelas multinacionais, faz parte de
todo um processo histórico, económico, político e financeiro. Quando ainda
estamos dando os primeiros passos na exploração mineira como país independente,
outros já percorreram o caminho há bastante tempo. Através de combates nem
sempre fáceis, confrontação verbal, legal, nacional e internacional se tem
visto governos de países detentores de recursos minerais como gás natural e
petróleo desfazendo acordos antes assinados.
O
mundo real é cruel e os políticos muitas vezes têm a última palavra a dizer
sobre o são as leis de um país. Uma história regional de luta por uma quota
cada vez maior do bolo dos recursos minerais dos países, desta vez tendo sede
na América Latina levou a que a Petrobras se confrontasse com o governo da
Bolívia. Na Venezuela viu-se o governo deste país tomar firmemente conta do
pelouro do petróleo. Após hesitações a presidente Kirchener da Argentina
decidiu pela intervenção estatal no nego petróleo dominado por uma
multinacional espanhola. Vozes contrárias levantaram-se em Madrid e Bruxelas
mas o governo argentino manteve-se firme na sua decisão. A imprensa
internacional propriedade do grande capital, escusa-se de publicar com
actualidade o que se passa com o petróleo argentino. Há um fundado receio de
que espalhar uma mensagem de sucesso dos governos que decidiram nacionalizar ou
renegociar contratos de gás e petróleo possa contagiar outros governos de
regiões onde o desenvolvimento de uma posição “nacionalista” ainda não se
concretizou.
Há
uma outra fonte de receios na arena internacional se os governos de países que
possuem recursos minerais considerados estratégicos tomarem decisões drásticas
quanto a forma como tais recursos são negociados. Empresas que conquistaram
posições de relevo financiando golpes de estado e manipulação política efectiva
não podem sossegar quando seu ganha-pão antes garantido sofre ameaças concretas
por uma nova vaga de políticos.
O
desenvolvimento de uma postura política diferente e uma crescente exposição
internacional de práticas de intervenção das corporações multinacionais trouxe
um manancial de recursos informativos antes impensáveis para o público e os
políticos.
É
preciso termos a sensatez de concluir que decisões e alterações no mundo da
exploração de recursos minerais no mundo acontecem no quadro de uma plataforma
mais alargada de desenvolvimentos políticos à escala mundial. Relações de
subordinação e de subserviência entre governos, comandadas por países poderosos
foram ruindo com a emergência de novas correlações de forças.
Se
hoje não há hesitações por parte de muitos políticos no que se refere a
“reconquista” de seus recursos minerais isso também é produto de uma atmosfera
política que só se concretizou com o advento de uma situação de hegemonia
multipolar e da redução dramática dos esquemas que governavam a “diplomacia de
imposição” bem característica dos tempos da “guerra-fria”. Os “dinossáurios” da
diplomacia e política externa de países como os EUA, os “tenebrosos” dos velhos
dias no Chile, Congo Indonésia e outras paragens, Henry Kissinger e outros, já
entregaram os bastões a outros como Hillary Clinton ou John Kerry. Condi Rice e
outros de diferente filiação partidária comungam no fundamental os mesmos
objectivos. São estes agentes activos de uma política externa atenta que
aprenderam a infiltra-se de maneira diferente nos negócios estratégicos de seus
países.
Ter
a Anadarko, corporação americana, no terreno em Cabo Delgado, pesquisando e
construindo um consórcio que eventualmente descobriu gás natural foi uma obra
que misturou interesses empresariais, políticos, financeiros. Tanto o governo
dos EUA como o de Moçambique tiveram a sua intervenção na facilitação dos
desenvolvimentos posteriores. Na senda do gás natural e do petróleo é claro
notar-se uma indisfarçável da AFRICOM, comando militar americano para África.
Ofertas não letais, visitas de vasos de guerras e outras iniciativas de
assistência técnica especializada são parte do “pacote do gás natural”.
Agora
é evidente que Moçambique não se preparou a contento para uma entrada
potencial, ditando regras num negócio estratégico e de importância
internacional.
O
tipo de contrapartidas recebidas em toda a operação gás natural, Panda/Temane e
Pemba terá encorajado algum consumo por parte do governo e isso se verifica nas
aquisições de luxo feitas. Todo aquele brilhantismo e circunstância verificados
em Pemba aquando o congresso do partido no poder deve ser tipificado como
resultados colaterais do negócio. Criar bom ambiente e entendimento com as
autoridades locais por vezes passa por facilitar a realização de actividades e
acções fora do âmbito ou escopo de uma empresa. Provar que houve apoio da ENI
ou da Anadarko para o congresso de Pemba é difícil senão impossível. Mas o tipo
de facilidades e imposições fiscais que obrigam aquelas empresas é uma das
questões que os moçambicanos querem ver respondidas pelo governo de seu país.
Nunca
foi tão urgente que se conheçam os contornos do negócio energético em
Moçambique. Com alegações ou justificações que teimam em falar de escassez de
recursos financeiros para a execução de obras públicas, analisadas à luz da
“explosão de descobertas” de recursos minerais os cidadãos ficam apreensivos e
atentos a tudo o que se passa em sua volta. Já se torna dificílimo “enganar os
cidadãos”.
A
comunicação social nacional, suas contrapartes internacionais, as TIC,
tecnologias de informação e comunicação, permitem que os cidadãos, as entidades
públicas e privadas se informem em tempo útil sobre desenvolvimentos que muitos
gostariam que estivessem no “segredo dos deuses”.
Os
deputados da nossa Assembleia da República não podem alegar falta de informação
e de recursos para não fazerem as perguntas pertinentes ao governo.
Ninguém se iluda quanto aos efeitos de
iniciativas como a Transparência Internacional na exploração dos recursos
minerais. Só com uma exigência fundada em informação irrefutável se podem fazer
vergar posições governamentais que estão lesando os interesses públicos no
capítulo de exploração de recursos minerais… (Noé Nhantumbo)
Imagem: magem capturada na Internet
(Fonte: Google)
marlivieira.blogspot.com
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