segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Mistérios da Medicina. Icu, Veneno Implacável


Conhecido e célebre é o curare, veneno terrível com que os índios ao norte do rio Amazonas matam quase instantaneamente; mas desconhecida e coberta com zeloso segredo era a procedência dos elementos componentes do veneno.

Viajantes procuraram levantar, visitando diversas tribos, o véu do segredo, naturalistas faziam experiências com diversas plantas para assim descobrir a fabricação do mortífero produto.

A princípio, o mundo científico considerava uma estrychnacea, que também cresce na Amazônia, como o principal elemento que se fabricava o curare, até que o então diretor do Museu Nacional, o Dr. J. B. Lacerda, por diversas experimentações provou que o curare era fabricado de uma planta chamada Icú, (Anomospermum grandifolium Eichler), da família das menispermaceas. (Arquivo do Museu Nacional, vol XI, Rio, 1901).

Entre os índios Guaicas, que habitavam às margens do Orinoco, a fabricação do curare era rodeada de uma cerimônia curiosa, que nos descreve o Dr. J. Bach e, ao que se sabe, as tribos do Alto Amazonas e do Rio Negro, possuíam costume análogo.

O chefe da tribo era que realizava um sorteio de três indígenas, que teriam que sujeitar-se à fabricação do temido e enérgico veneno.

Eram sorteados dois homens e uma mulher para este fim. Reuniam-se então, 186 elementos da tribo e principiavam a fabricação do curare com as seguintes manipulações:

O morubixaba mandava preparar em uma pequena clareira uma fogueira de fogo lento. Ao seu lado ele tinha duas panelas de barro de tamanhos diferentes. A maior destas estava cheia de uma tintura cor de chocolate claro, na quantidade de mais ou menos 800 gramas e a menor a capacidade de 150 gramas. Por sua ordem, a panela menor foi colocada sobre a fogueira conservada em fogo lento e um dos índios sorteados esvaziou ou verteu nela uma quantidade de tintura até o meio e introduzia no líquido uma varinha resistente, com a qual o remexia. A evaporação era tão forte que no espaço de duas horas e meia, o índio obtinha 800 gramas da tintura, perfeitamente condensado. Ao término desta operação o indígena completamente estonteado em consequência da forte evaporação do veneno, era substituído pelo companheiro do sorteio. Uma hora e meia mais tarde, este último índio também se via obrigado a abandonar a fogueira, também vítima de fortes tonteiras. É revezado então pela mulher, que termina a operação, mas fica sujeita também aos mesmos sintomas.

Durante esta função o chefe da tribo formava com os outros indígenas que assistiam à fabricação, um semicírculo cuja abertura era do lado para onde soprava o vento, de forma que os espectadores não absorviam as evaporações do veneno.

Afirmou o mesmo naturalista, que os índios se negaram de revelar-lhe seu segredo. Contou ainda, que teve a oportunidade de observar os efeitos do curare, quando dois remadores de sua canoa foram flechados, sendo que poucos minutos depois de feridos, deixaram de existir, observando que não tinham sido acertados em lugares considerados mortais.

O curare era empregado, não só nas flechas lançadas por arcos, como também, em setas desferidas por zarabatanas, dependendo da tribo e destino a ser dado ao animal abatido com tais armas.

A primeira menção sobre estas flechas envenenadas, surge na História do Brasil, pelo relato de visitantes espanhóis, que singravam o rio Amazonas, muito antes dos portugueses, pois depois de conquistarem o Império dos Incas, passaram a buscar novas terras, à procura de mais riquezas.

As lendas a respeito de uma cidade repleta de tesouros incalculáveis situada em plena selva amazônica, denominada Manoa, fez com que Gonzalo Pizarro organizasse uma expedição para procurá-la.

Foi então contratado o tenente Francisco de Orellana para enfrentar a feroz resistência imposta pelos indígenas. Esses espanhóis navegaram pelo Amazonas sem jamais terem encontrado a lendária cidade. Entretanto, a partir de certo trecho do percurso, os viajantes passaram a sofrer um grande pesadelo, pois, durante o dia, flechas se abatiam sobre a embarcação, e os homens atingidos por esses primitivos artefatos, morriam a cabo de minutos, apresentando o aspecto de um terrível sofrimento, embora não emitissem um gemido, sequer. Era o curare, o veneno implacável.

Extraído de ervas nativas da Amazônia, preparado seguindo rituais e técnicas centenárias que passam de pais para filhos, o curare permanece ativo por séculos, sendo conhecido o caso de um conservador de certo museu da Europa que se feriu numa ponta de flecha que se encontrava no estabelecimento por mais de trezentos anos e teve morte idêntica à dos exploradores flechados em plena selva. Realmente é surpreendente!

Texto pesquisado e desenvolvido por Rosane Volpatto

http://www.rosanevolpatto.trd.br/lendaicu.htm

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