sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Seminua


Lá vou outra vez para o pau, apanhar tautau, mais, muitas mais chicotadas.

De pulsos nele amarrados, de cintura nua, seminua. O chicote bate-me nas costas, acho que foram buscar serpente, esticaram-na de língua afiada. O chicoteador lança-a com força, como se fosse um dardo. As minhas costas têm o calejar, de tanto apanhar.

Evito com dificuldade que não me bata nos seios, porque receio ficar feia. O meu príncipe não me vai namorar, bolinar, vai-me abandonar e dirá: onde já se viu mulher sem atributos de feminilidade?

Depois dos primeiros tautaus… das iniciais chicotadas dadas com soberba mestria, já não sinto dor. Desvio o pensamento para o mais profundo da minha floresta… lá está o rio da minha génese.

Vejo-me a pescar, peixe para secar.
E canto o meu canto: o xirico desencanta-me, apoquenta-me.

Vida de negra não tem valor. Cada vez mais o lixo se valoriza nas bolsas mundiais… porque não é negro.
Gil Gonçalves

Imagem: Foto de imigrante seminua no chão de uma esquadra em Itália choca a Europa
http://ultimahora.publico.pt/noticia.aspx?id=1339112&idCanal=62

Sem comentários: