segunda-feira, 26 de setembro de 2011

GPL viola a Constituição da República Angolana - Mihaela Webba


Luanda - Passada a primeira agitação relacionada com as manifestações do dia 3 de Setembro, eis que o Governo Provincial de Luanda (GPL) decidiu delimitar os espaços nos quais será doravante permitida a realização de manifestações na capital angolana.

Fonte: Novo Jornal
Em nosso entender o acto do GPL divulgado na passada quinta-feira pode ser eventualmente considerado inconstitucional. Em primeiro lugar, temos de analisar a lei que fundamenta a medida tomada pelo GPL – a lei sobre o direito de reunião e manifestação– e verificar até que ponto esta norma não padece de inconstitucionalidade superveniente,em virtude de ter entrado em vigor a nova Constituição em Fevereiro de 2010.

No entanto, mesmo que se considere aquela lei como estando em conformidade com a Constituição, o acto do GPL não deixa de ser, no nosso entender, inconstitucional, porquanto é violador de normas constitucionais.

Em segundo lugar, de acordo com a nota de imprensa tornada pública, a medida visa “assegurar as condições para o exercício do direito de reunião e de manifestação em lugares públicos”. De acordo com a Constituição da República de Angola (CRA) a todos é garantida a liberdade de reunião e de manifestação pacífica e sem armas, sem necessidade de qualquer autorização, o que significa dizer que as reuniões e manifestações podem ser realizadas em lugares privados e em locais públicos (artigo 47º/1 da CRA); todavia quanto às reuniões e manifestações em locais públicos a Constituição impõe a necessidade de comunicação prévia (artigo 47º/2 da CRA) – que a lei sobre o direito de reunião e manifestação estabelece a antecedência mínima de 72 horas – à autoridade competente, no caso os Governos Provinciais.

Para espanto da maioria dos cidadãos o GPL vem publicamente anunciar que irá restringir o exercício de um direito dos cidadãos constitucionalmente consagrado.

De acordo com a lei fundamental da nossa república a competência para restringir direitos, liberdades e garantias dos cidadãos é exclusiva da Assembleia Nacional (artigos 57º e 164º alínea c) da CRA).

Em caso de restrição desta categoria de direitos fundamentais a lei só poderá restringi-los nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário, proporcional e razoável numa sociedade livre e democrática e sempre que for necessário para a salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

Em terceiro lugar, o GPL alegando haver necessidade de se dar cumprimento ao estipulado na lei sobre o Direito de Reunião e de Manifestação, inerente à reserva de lugares públicos devidamente identificados e delimitados, indica os espaços nos nove municípios da província de Luanda, esquecendo-se que a Assembleia Nacional aprovou uma nova divisão administrativa para a Província de Luanda e assume claramente um conceito errado de reunião e manifestação; ambas podem ser feitas por um número ínfimo de cidadãos, ou mesmo, no caso da manifestação, por apenas um único cidadão.

Se por exemplo um determinado cidadão pretender realizar uma manifestação contra a péssima prestação da Edel ou Epal em frente ao edifício destas empresas situadas no município da Ingombota – recorrendo ainda a divisão administrativa antiga – de acordo com o comunicado do GPL esta manifestação teria que ocorrer no Ponto Final local muito distante das supracitadas empresas.

Neste exemplo hipotético podemos denotar que o efeito que se quer alcançar com manifestação do cidadão não pode ser alcançado.

Neste momento com duas manifestações marcadas para esta semana e como a maioria da população não teve acesso ao documento exarado pelo GPL, não se sabe ao certo de tal medida entra imediatamente em vigor ou não.

Por último, resta-nos apenas a percepção de que só num país em transição democrática se pode assistir tamanha aberração: um órgão do executivo escolher os locais onde os cidadãos irão exercer o seu direito de reunião e de manifestação ao arrepio e em clara contravenção ao estabelecido na Constituição.

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