terça-feira, 27 de setembro de 2011

No Banco Millennium. Angolanos dizem-se vítimas de discriminação


Queixam-se de que um angolano aufere, apenas, entre dois e três mil dólares, ao passo que o seu colega português, com a mesma categoria, «limpa» 15 mil dólares. Por outro lado, insurgem-se contra «muitos dos portugueses do Millennium que, em Portugal, já estão aposentados, mas que, em Angola, trabalham, em prejuízo de jovens angolanos que enfrentam a dureza do desemprego

Pascoal Mukuna SEMANÁRIO ANGOLENSE

Quadros angolanos do Banco Millennium Angola dizem-se insa¬tisfeitos, por, segundo eles, falta de oportunidades, o que está a provocar a fuga em massa de colaboradores nacionais, sou¬be o Semanário Angolense junto dos reivindicadores. Numa carta que puseram a circular e a que este jornal teve acesso, os subs¬critores revelam que 98% dos car¬gos de direcção são ocupados por expatriados, portugueses, e que «a cada dia que passa, outros vão chegando ao país, já com cargos de chefia garantidos.»
Acrescentam que os «tugas chegam como gerentes e, dois a três meses depois, ascendem logo a directores comerciais, enquanto os angolanos só sobem passados seis anos. «Todos os funcionários lusos exercem funções de chefia», prosseguem. Ao contrário dos an¬golanos, que usufruem somente do salário, os portugueses têm di¬reito a viaturas zero quilómetros, casa, telemóvel, colégio para os fi¬lhos, bilhete de passagem e outras benesses.
Apontam que o administrador João Matias e a vice-presidente da Comissão Executiva, Herme¬negilda Benge, ambos represen¬tantes da Sonangol, «nada têm feito no sentido de se resolver os problemas dos colaboradores na¬cionais», que enfrentam muitas dificuldades, que vão desde a ob¬tenção de crédito habitação, cré¬dito pessoal, que agora passou a ser equivalente a 10 salários, caso se consiga um avalista, aumento salarial desajustado, atribuição anual de bónus, de cem dólares para os angolanos e 20 mil dólares para os seus colegas portugueses.
Denunciam ainda que, no Banco Millennium, tornou-se «moda» os expatriados perma¬necerem em Angola sem visto de trabalho, irem a Portugal e aqui regressarem com visto provisó¬rio, enquanto «vão fazendo corre¬dores para, por meios ínvios, con¬seguirem o referido documento. Por outras palavras, quando expi¬ra o contrato de trabalho, o banco simula que lança a vaga, mas que não houve candidato em Angola, reocupando o mesmo expatriado o lugar e dando-se a conhecer ao Banco Nacional de Angola (BNA).
Os colaboradores angolanos dão a conhecer, na sua carta, que o BNA recomenda que as tecnolo¬gias, os servidores, onde se encon¬tram todos os programas, estejam instalados no país, mas o Millen¬nium, contrariando essa ordem, colocou-os em Portugal, visando dar emprego aos «seus parentes», em vez de ser o contrário.
Os autores da carta questio¬nam se aos angolanos «não têm capacidade de ocupar cargos de destaque no serviço, porque mo¬tivo só os expatriados são direc¬tores comerciais, quando nem o mercado angolano conhecem?» Indagam, ainda, «quando é que a Comissão Executiva vai começar a pensar nos angolanos, que tanto fazem para engrandecer o Banco Millennium?»
Queixam-se de que um angola¬no aufere, apenas, entre dois e três mil dólares, ao passo que o seu colega português, com a mesma categoria, «limpa» 15 mil dóla¬res. Questionam também o facto de a directora do gabinete jurídi¬co do BMA ser uma cidadã lusa, de nome Mafalda Lourenço. Por outro lado, insurgem-se contra «muitos dos portugueses do Mil¬lennium que em Portugal já estão aposentados, mas que trabalham em Angola, em prejuízo de jovens angolanos que enfrentam a dure¬za do desemprego.
«O que se passa no Banco Mil¬lennium Angola é uma autêntica neocolonização», acusam os fun¬cionários nacionais.
Comissão executiva nega acusações
Interpelada a propósito pelo SA, a comissão executiva do Ban¬co Millennium Angola indicou António Raposo de Magalhães, vogal desse órgão, que começou por dizer que as saídas de funcio¬nários angolanos correspondem ao funcionamento do mercado. «Não sentimos estar a perder co¬laboradores «em massa» ou acima da média do mercado», justificou, acrescentando que, o que sabe é que o mercado angolano, a rota¬tividade é elevada e que têm de se precaver.
Informou que contrataram também muitas pessoas, saídas de outros bancos, «por estarem insa¬tisfeitas naquelas instituições» e que «o saldo é positivo.» Quanto ao facto de 98% dos cargos de di¬recção serem ocupados por por¬tugueses, António de Magalhães argumentou que o «processo de angolanização tem de ser res¬ponsável, afirmando que, 96 por cento dos quadros do banco são angolanos.
Frisou que os expatriados «com funções de enquadramento estão a prazo», para formar as equipas, transmitir metodologias e proce¬dimentos, regressando depois ao Millennium bcp, em Portugal. Disse ainda que a totalidade dos expatriados do BMA é de quadros com mais de 15/10 anos de experi¬ência bancária. «Dos 20 responsá¬veis de 1ª linha, 7 são angolanos, o que corresponde a 35%. Num to¬tal de 53 responsáveis de 2ª linha, 36 são angolanos, correspondente a 68%. O total das duas primeiras linhas hierárquicas do BMA é de 73 responsáveis, dos quais 43 são angolanos, o que se traduz em 59% de mão-de-obra angolana», precisou.
Quanto à informação segundo a qual «os portugueses benefi¬ciam de viaturas zero quilómetro, casa, telemóvel, colégio para os filhos, bilhete de passagem e ou¬tras benesses», o vogal do BMA afirmou que essa informação não corresponde à verdade e que o banco tem angolanos com mais benefícios do que o salário. «As regalias referidas atribuídas a um expatriado são idênticas em todas as empresas e no mundo. Não é exclusivo do BMA nem do merca¬do angolano e isso é do conheci¬mento de todos», defendeu-se.
Sobre a referência ao desem¬penho dos representantes da So¬nangol na comissão executiva, nomeadamente a vice-presidente, Hermenegilda Benge, e o admi¬nistrador, João Matias, no que concerne à defesa dos interesses dos colaboradores angolanos, António de Magalhães disse não se tratar de este ou aquele admi¬nistrador resolver situações dos colaboradores nacionais e que a comissão executiva gere de forma colegial e solidária.
Relativamente às condições de empréstimo aos colaboradores, explicou que a sua revisão visa protegê-los de uma eventual situ¬ação futura em que haja uma su¬bida abrupta das taxas de juro, o que poderia aumentar a prestação mensal para níveis incomportá¬veis. Os bónus são atribuídos em função de uma série de factores e «não corresponde à verdade o que se diz, porque todos os qua¬dros BMA usufruem de bónus de acordo com os cargos, responsa¬bilidades e desempenhos exibidos ao longo do ano.»
À questão sobre os vistos de trabalho, ripostou que, também, e que todos os colaborado¬res expatriados têm visto de trabalho ou cartão de estran-geiro residente, que renovam de acordo com as datas de validade. Para apurar a ver¬dade, contactámos o Serviço de Migração e Estrangeiros, mas quem nos deveria prestar informações não estava dis¬ponível, pelo que contamos fazê-lo em próxima oportu¬nidade.
Depois da instalação, em Luanda, de um novo centro de processamento de dados, que representou um investimento de cerca de 4,5 milhões de dó¬lares, está em curso um pro¬jecto de «realocação» dos ser¬vidores em Luanda, informou, ajuntando que o Millennium está em «perfeita sintonia» com o BNA sobre a matéria e vem cumprindo todos os «ti¬mings» exigidos pelo Banco Central.
António de Magalhães de¬clarou que não apenas expa¬triados são directores comer¬ciais, pois o BMA já possui cinco angolanos e espera vir a ter mais no futuro, ocupando ainda cargos de destaque nas áreas de marketing, recursos humanos, qualidade, Infor¬mação de gestão, entre ou-tras. Por outro lado, informou que, actualmente, além dos 14 salários anuais, os colabora¬dores do Banco Millennium usufruem de seguro de saúde, subsídio de refeição, crédito habitação e crédito pessoal e outros, para além de benefi¬ciarem de milhares de horas de formação.
Quanto às diferenças sala¬riais entre angolanos e portu¬gueses no Millennium, disse que não se permite e o Banco Millennium Angola não prati¬ca esses salários. «Há diversos angolanos no BMA que aufe¬rem salário superior ao colega expatriado que exerce a mes¬ma função», afirmou.
Alegou que existem em Portugal quadros pré-re¬formados do Banco Millen¬niumbcp, mas que, face à sua idade e «larga experiên¬cia, podem representar uma mais-valia para um banco que está a dar os primeiros passos.» Desafiou, dizendo que não existe em Angola, na banca ou em qualquer outro sector de actividade, nenhuma empresa que crie um número tão elevado de empregos a angolanos, como tem vindo a fazer sistemati¬camente o BMA. Assim es¬peram continuar em 2012, em que pretendem atingir os 1300 colaboradores, com menos de 3% de expatria-dos.
Imagem: altohama.blogspot.com

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