Luanda - Um dos advogados que representa os jovens detidos na manifestação de sábado contra o Presidente angolano em Luanda acredita que a polícia se prepara para «fazer interrogatórios auto-incriminatórios» que possam sustentar a acusação contra os manifestantes.
Fonte: Diário Digital / Lusa
Advogado crê que polícia prepara «interrogatórios»
«Pensamos que poderão fazer um interrogatório de auto-incriminação, ou seja, na ausência dos advogados vão interrogar os jovens para ver se fazem uma confissão que possa servir de base para o auto de notícia que quererão encaminhar para o tribunal», disse à Agência Lusa o advogado David Mendes, da organização Mãos Livres - Associação de Juristas e Jornalistas pelos Direitos Humanos, que se constituiu como representante dos jovens detidos.
As pessoas detidas na manifestação antigovernamental de sábado em Luanda estavam ontem a ser transferidas das várias esquadras para a Direcção de Investigação Criminal (DIC) da capital angolana, revelou ao i o advogado David Mendes. "A Polícia Nacional está a tratar de remover os detidos das várias esquadras para a DIC. Em princípio, vão ser enviados para interrogatório, mas não sabemos sequer de que são acusados pois não tivemos acesso a eles", explicou este conhecido defensor dos direitos humanos angolano.
Desde os confrontos de sábado com as autoridades, depois de uma centena de manifestantes terem exigido a demissão do presidente José Eduardo dos Santos e tentado marchar em direcção à residência oficial do chefe de Estado, que as famílias e as organizações de direitos humanos procuram informações relacionadas com "os desaparecidos", assim denominados porque as autoridades os levaram para várias esquadras de Luanda sem registar a sua detenção ou pelo menos sem a comunicar oficialmente. "Foram levados e colocados em várias unidades que nunca assumiram que os tinham lá", disse o jurista, que abandonou a direcção da Associação Mãos Livres para ser líder do Partido Popular.
"Não temos hipótese de estar presentes porque não há juiz de piquete" para assim decidir. Isto leva David Mendes a pensar que os detidos - entre 30 e 50, número que não é certo porque a polícia se recusa a revelar o número total - poderiam vir a ser interrogados durante a noite de ontem, sem a presença de qualquer representante legal.
O pequeno partido da oposição Bloco Democrático enviou um comunicado na noite de domingo, assinado pelo seu líder, Justino Pinto de Andrade, denunciando os acontecimentos: "Foi presa uma manifestante, militante do Bloco Democrático, Ermelinda Freitas, e levada para parte incerta, somente tendo sido localizada muitas horas depois na Esquadra da Ilha de Luanda. Outros dois manifestantes, Adolfo e Luamba, foram barbaramente agredidos pela Polícia Nacional, tendo dado entrada inanimados no Hospital Maria Pia, de onde foram transferidos para o Hospital Militar, onde receberam tratamento e posteriormente [foram] conduzidos para a cadeia." Segundo David Mendes, há ainda outros dois feridos, que se encontram internados no Hospital Maria Pia.
Sem informação das autoridades, os activistas de direitos humanos vão sabendo notícias por outros: "Ficámos a saber por interpostas pessoas que os detidos que estão na 8.a esquadra estão em greve de fome", explicou Mendes. Na 8.a Esquadra, ao que parece, de acordo com as informações recolhidas pelos activistas, estará um dos organizadores da manifestação, "Carbono" Casimiro, cujo paradeiro a polícia angolana diz desconhecer.
David Mendes adiantou que hoje de manhã os advogados vão "tentar junto do procurador obter acesso aos presos e assistir ao interrogatório". Sem defesa legal presente, os interrogatórios, afirma, não serão mais do que maneiras de persuasão para confessarem o crime: "Vão forçá-los a falar para se auto-incriminarem." Na opinião do jurista, os detidos acabarão por ser indiciados pelo crime de desobediência à autoridade. "Se não houver interrogatório, acreditamos que haverá julgamento sumário."
MPLA pede libertação Uma tendência minoritária dentro do MPLA, o partido do governo em Angola, emitiu ontem um comunicado de imprensa "a exigir a libertação incondicional dos jovens manifestantes" detidos no sábado no Largo da Independência. A União de Tendências-MPLA, ligada à Fundação 27 de Maio (que lembra o golpe fracassado de Nito Alves em 1977), "regozija-se com a manifestação" e encoraja os jovens participantes "a prosseguirem com os tais actos, por ser um direito plasmado na Constituição".
Fragata de Morais, primeiro-secretário do MPLA de Luanda, garantiu no domingo ao i que a manifestação decorreu pacificamente e que a polícia só interveio quando algumas pessoas tentaram deixar o Largo da Independência para se dirigirem ao Palácio Presidencial, para o que não tinham autorização. .
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