sexta-feira, 26 de março de 2010

ANJOS E LUBANGO (1)


Parafraseando: Violentas se dizem das populações espoliadas, mas não se diz violento o poder que as espolia.
Dando cumprimento ao primeiro mandamento da Intolerância Zero, vamos todos sem excepção e clarividentes, demolir Angola.
Até que a disciplina, Demolições, está obrigatória em todas as universidades. E tem doutoramento no curso, Como Bem Demolir Angola.

Conheci o Lubango nos terrenos e nas casas dele próximos do Caminho-de-ferro de Moçâmedes. Parecia-me homem sincero, recto e temente ao seu MPLA. Tinha fama de muito bondoso e afastava-se dos especuladores imobiliários e das suas demolições. Acérrimo defensor da tradição, proliferou sete filhos e três filhas, muitas lavras e muita gente condizente para o servirem.

A oposição maledicente costumava propagandear que era o mais rico do reino. Os seus filhos nunca se cansavam nas grandes festas que ofertavam para garantirem que eram muito ricos. Convidavam as suas irmãs a comerem e a beberem com eles. Lubango escolhia algumas cabeças de gado e enviava-as para o seu MPLA, como prova de gratidão, bajulação e vassalagem.

Um dia o MPLA visitou-o para lhe agradecer a bajulação. Num repente aparece o Anjos. O MPLA pergunta-lhe:
- Donde vem?!
O Anjos respondeu.
- Ando a vigiar estas terras para o caminho-de-ferro.
Disse o MPLA ao Anjos.
- Já viu o meu vassalo Lubango? Não há ninguém na bwala que se lhe compare. Muito honesto, justo, mais que vertical, e detesta os especuladores imobiliários.
Respondeu o Anjos ao MPLA.
- Hum! Acho que ele não faz isso em vão. O nosso MPLA concede-lhe muito apoio. É um dos poucos vassalos protegidos e intocáveis. O seu gado, as suas casas e as suas terras não param de aumentar graças ao MPLA. Ele que fique na miséria, que passe fome, odiará o MPLA e demais autoridades competentes.
Disse o MPLA ao Anjos.
- Parece-me que você anda com o olho nestas terras. Sei que alguns já espoliaram algumas… chegam, instalam-se… já está tudo feito.
O Anjos fez a saudação angélica e saiu da presença do MPLA.

Um dia, a filharada do Lubango estava numa festa na casa do filho mais velho. Depois chegou um mensageiro e disse ao Lubango:
- Os bois lavravam, as tropas do Anjos chegaram e levaram-nos. Disseram que estavam esfomeados. Feriram os empregados, só eu escapei.

Chegou outro mensageiro que disse:
- Incendiaram, arrasaram tudo, nem as crianças escaparam. Os empregados morreram queimados, só eu escapei.
Ainda outro mensageiro apareceu e disse:
- Eram pelo menos trezentos pelotões armados como na invasão do Iraque. Roubaram, reduziram tudo a pó… incluindo móveis e utensílios. Só eu escapei.

Mais um mensageiro chegou e disse:
- Estava a tua filharada numa festa em casa do filho mais velho. Como agora tudo se espolia, o governo é o principal criminoso, os demolidores e espoliadores atacam às três, quatro da manhã… pareciam, vieram como um tufão que arrastou as casas e todos os que lá estavam. Ninguém ficou vivo. Só eu escapei para te contar o que se passou.

Lubango levantou-se muito chateado, rasgou a sua manta da propaganda do MPLA, atirou-se para o chão e clamou:
- O meu destino é igual ao dos outros espoliados. Trabalhamos nas nossas terras, edificamos as nossas casas a que o MPLA chama casebres. Chega o Anjos e parte-nos tudo. Bendito seja o nome do MPLA!
Mesmo assim, Lubango não se revoltou nem amaldiçoou o MPLA.

Imagem: morrodamaianga.blogspot.com/

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