O Antunes, serenamente servia o seu cliente. Claro que preparava a sua vingança. No dia seguinte o Luís faz os mesmos pedidos, mas o Antunes já estava devidamente preparado para o receber, e gritou:
- Liguem a mangueira e tragam um tambor com água!
E o Luís levou banho. Os dias passaram. Luís veio com alguns amigos, juntaram duas mesas e fizeram uma despesa considerável. Mais tarde as mesas estavam cheias de garrafas de cerveja vazias. Eram quase horas de fechar, e pediram a ultima rodada. Beberam e o Antunes apareceu com a conta para pagarem. Luís pegou num saco cheio de moedas, de valor mínimo, que parecia não ter fundo, e entregou-as ao Antunes, este calmamente riposta-lhe:
- Grande filho da puta.
Quando o Luís aparecia ficávamos atentos, porque nunca sabíamos qual era a partida que ele iria fazer. Numa dessas vezes alguém concentrado lia o Diário de Noticias – as páginas eram gigantes – sentado, obrigava a que o corpo ficasse quase todo coberto. O Luís acendeu o isqueiro, aproximou-se da parte do jornal que quase tocava o chão e pegou-lhe fogo. A chama elevou-se rapidamente e gritou:
- Eh pá estás a arder!!!
- Hã!? Hã!?
Quando queria tomar um galão e não tinha dinheiro, sentava-se ao pé de alguém que se preparava para tomar o seu. Utilizava a ponta do guarda-chuva como colher para agitar o açúcar, como o galão já não dava para beber, o Luís ingeria-o assim mesmo.
O Frederico de vez em quando sentava-se à nossa mesa. Trocava opiniões, dava-nos conselhos, jogava aos matraquilhos, ao bilhar… era quase como um pai. Quando alguém se comportava indignamente não tinha meias medidas. Chegou ao ponto de expulsar clientes seguros pelas orelhas, pelo vestuário e até com um pontapé no rabo. Quando surgia um possível desordeiro, nós sabíamos que não demoraria muito a que ele não conservasse o ambiente salutar.
Forte e de altura acima do comum, a sua presença era suficiente para impor respeito. A sua esposa era bastante humilde e seguia os mesmos princípios. A filha quando começou a namorar, sentia vergonha de servir os clientes, de levar a bandeja às mesas. Pedia-nos por favor em voz baixa para os servirmos, quando eram clientes ocasionais. Isto só se verificava durante o dia porque à noite não era necessário. Em suma, o êxito do Frederico deve-se à intimidade que mantinha com os seus clientes, o que acho digno de realce para quem pretenda manter o seu futuro no negócio.
Depois instalou-se uma sapataria, e antes dela uma pequena tabacaria que entre várias coisas vendia jornais e algumas revistas. Era aqui que comprava o Diário de Lisboa, ou o República. O Diário de Lisboa porque preferia este a qualquer outro, devido à sua linha editorial. Acho que era o mais educativo. Voltando à sapataria, esta tinha muitos modelos de sapatos, o que para nós era motivo de satisfação. Depressa angariou muitos clientes e as vendas eram consideráveis.
Mas, na parte baixa dos Olivais-Sul existia uma pequena área que devido ao comportamento dos seus moradores passou a chamar-se aldeia dos macacos.
Imagem: http://www.oliveirasalazar.org/galeria.asp?idTema=68
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