sexta-feira, 5 de abril de 2013

Moçambique. Muxunguè palco de guerra. Renamo deixou um morto no ataque ao quartel da FIR


 magem do “brigadeiro da Renamo, Rasta Mazembe morto pela Polícia”, segundo a própria Polícia   

Hoje não houve confrontos
Muxunguè (Canalmoz) – O administrador de Chibabava, distrito a que pertence o posto administrativo de Múxunguè, Arnaldo Fernando Major, disse ontem à Reportagem do Canalmoz/Canal de Moçambique  que a sede da Renamo nesta localidade atravessada pela Estrada Nacional N1 que liga o sul ao centro e norte do país, “estava já transformada numa base, com os antigos guerrilheiros da Renamo concentrados”, mas admitiu, entretanto, taxativamente, que não estavam armados deixando a perceber que as autoridades procuram agora a todo o transe encontrar justificações para o iniciativa tomada pela FIR e que acabaria com o sossego em Muxunguè. 
Numa entrevista que nos concedeu no Hospital Rural de Muxunguè, Arnaldo Fernando Major contou-nos nos seguintes termos a versão do governo: “Na sede da Renamo já tinham sentinelas, postos avançados e nós a nível do governo do distrito fizemos questão de convocar a parte política da Renamo e conversámos com eles para sabermos qual era a razão da concentração. Então diziam-nos que estavam à espera do chefe que vinha para um seminário. Então dei-lhes um ultimato porque não foram autorizados para estarem ali concentrados, para além de que não havia condicções sanitárias para estarem ali tantos homens aglomerados. Estavam quase duzentas pessoas, não tinham latrinas, não tinham nada, pelo que aconselhámos que deviam se dispersar. Tudo isto já há duas semanas atrás. Só que isto, bom, não cumpriram e a Policia na sexta-feira (29 de Março de 2013) chamou a chefia deles e deu ultimato para eles destroçarem. Não acataram, até que na madrugada de ontem (03 de Abril de 2013), a Policia interveio para manter a ordem, para impor a ordem. Não disparou arma nenhuma. Nem era madrugada, já eram sete horas quando eles estavam a fazer a formatura deles, então a força de intervenção rápida foi para lá, dispersou as pessoas, usou gás lacrimogénio, duas granadas de gás lacrimogénio, e dispersaram. Não houve, não houve nenhum ferido, houve um ligeiro. Só que bom, na madrugada de hoje (ontem, 04 de Abril de 2013) eles vieram. Afinal quando saíram ontem foram-se organizar. Na altura nós não pensávamos que eles tivessem armamentos, mas agora confirmamos que eles tinham armamento. Tínhamos informações em como eles tinham armas, mas como ali onde estavam não tinham armas, nós não confirmámos… Então hoje (ontem, 04 de Abril) às 04 horas de facto atacaram a nossa força e tivemos isto que tivemos”. 
O balanço, segundo o administrador do distrito de Chibabava, foi de quatro mortos e nove feridos do lado da Polícia (FIR-Força de intervenção Rápida), uma senhora civil ferida, e um homem da Renamo morto.
No ataque ao Posto policial de Muxunguè a Renamo deixou no terreno um homem morto. O comando da FIR no local e o administrador de Chibabava disseram que o homem morto no aquartelamento da unidade da FIR é o “brigadeiro Rasta Mazembe” (ver foto)
Na visita ao quartel que foi proporcionada à Reportagem do Canalmoz e do Canal de Moçambique pelo Comando da FIR em Muxunguè, pudemos ver o corpo de um homem da Renamo, morto a uma dezena e pouco de metros da porta da cadeia onde estavam encarcerados “16 homens da Renamo” feitos prisioneiros no ataque da véspera à sede da Renamo, pela FIR.
Ao lado do local onde estava o cadáver do dito “brigadeiro da Renamo”, estavam sacolas e malas particulares de elementos da Renamo, apreendidas na véspera na sede civil do partido liderado por Afonso Dhlakama. 
Estavam também ali estacionadas, no quartel da FIR, apreendidas, cinquenta e seis (56) bicicletas. Pertencem a cidadãos que se encontravam na sede política da Renamo quando a Policia tomou a iniciativa de abrir a hostilidades ao atacá-la na quarta-feira de manhã.
De acordo com várias pessoas contactadas pelo Canalmoz, entre empresários, professores e vendedores ambulantes, a Renamo estava a promover uma ampla reunião de militantes na sua sede, na última quarta-feira de manhã, quando a FIR tomou a iniciativa de atacar aquele espaço privado alegando que não tinham obtido autorização prévia para se reunirem, como aliás nos foi explicado pelo administrador de Muxunguè.
No dia (03 de Abril) em que a Policia invadiu sem mandato a sede da Renamo em Muxunguè, de acordo com testemunhos que recolhemos de civis, havia cerca de duas centenas e meia de pessoas ali reunidas. Os números de várias fontes vão de duzentas e duzentas e cinquenta pessoas.
Ainda de acordo com vários depoimentos gravados de civis, nos últimos anos nunca tinha sido visto um único homem da Renamo armado em Muxunguè, até se registar o ataque ao quartel da Policia (FIR).
Do ataque da Renamo, dia 04 de Abril, a FIR mostrou-nos uma arma AK47 que teria sido usada pelo homem abatido no quartel. Mostraram-nos ainda uma outra Kalash. As duas são armas antigas, com carregadores de quarenta munições e não de trinta como usam as AK47 mais modernas.
A Policia diz que havia um outro homem ferido que foi arrastado pelos atacantes e levado. Mostraram o rasto mas ao longo de trilho visível no piso de areia do quartel não vimos uma única gota de sangue.
Os números oficiais fornecidos pelo administrador de Muxunguè ao Canalmoz não são os mesmos que nos foram fornecidos por vários funcionários do Hospital Rural de Muxunguè em várias circunstâncias distintas em que procurávamos ainda obter informações sobre o balanço de vítimas. De acordo com todas as fontes hospitalares, deram entrada naquela unidade de saúde quatro cadáveres de agentes da FIR e ainda 13 feridos da FIR, dos quais nove graves. Entrou ainda uma senhora civil ferida por uma “bala perdida”.
Quando a nossa Reportagem deixou Muxunguè cerca das 11 horas da manhã de quinta-feira (ontem) a população que ainda não tinha abandonado a vila devido ao tiroteio da véspera na sede da Renamo, estava a fazê-lo. Se na quarta-feira quando chegámos a Muxunguè, cerca das 18 horas, a vila já era uma vila fantasma, contrariamente ao habitual, agora ainda está mais deserta.
O pânico está semeado em Muxunguè.
O movimento rodoviário diminuiu consideravelmente.
Era voz corrente ontem em Muxunguè que a Renamo poderia voltar a atacar para libertar os seus 16 homens mantidos na prisão sem que se conheça decisão judicial para tal. Mas hoje Muxunguê passou uma noite tranquila e acordou sem “guerra”, segundo um comerciante por nós contactado telefonicamente.
Falando à nossa Reportagem no hospital de Muxunguè, quando estava a ser transportado para uma viatura que levaria feridos ao Hospital Central da Beira, um dos agentes da FIR disse-nos que o ataque se deu por volta das 04 da manhã. Explicou-nos que os agentes da FIR estavam a dormir. “Fomos surpreendidos pelos disparos”, disse-nos Jaime Alfiado, contorcendo-se de dores com o abdómen rasgado por uma bala.
Jacinto Kamoto, outro agente da FIR gravemente ferido, disse-nos que veio da cidade da Beira para “cumprir uma missão”. “Só que de repente vieram e atacaram onde nós estávamos acampados. Tiroteio não tiroteio, heish surpresa meu… nós estávamos a descansar e já começámos ali…já era guerra…outros disparavam…outros disparavam…já de repente eu sai, fiz tática de guerrilha e fui baleado nas costas”. 
E é natural de onde? – “Eu sou natural de Lichinga, mas vivo na Beira”. E há quanto tempo está na FIR? – “Este é o meu terceiro mês de trabalho”.


O que nós vivemos

A nossa Reportagem estava a cerca de duzentos metros do quartel da FIR que foi atacado pela Renamo. Estávamos a pernoitar na viatura em que nos transportávamos, estacionados na bomba de gasolina da BP. Eram exactamente 03h40 quando começámos a ouvir fogo intenso de rajada. Saímos da viatura e vimos, de vários camiões de carga diversa estacionados nas imediações da bomba da BP, começarem a sair, em fuga precipitada, os seus ocupantes. Pessoas que estavam a pernoitar no chão de pavet da estação de serviço, desapareceram. O ambiente estava dominado por tiros de amas ligeiras e explosões de granadas e armas pesadas. O eco dos disparos vinha a certa altura também de longe, de várias frentes. 
Quando pela primeira vez se fez silêncio por algum tempo voltaram a aparecer nas instalações da BP alguns dos motoristas dos camiões. Todos eram da opinião de que poderia estar a suceder um mal entendido entre agentes no quartel dado que tinham sido vistos alguns a beber nas pouquíssimas barracas que estiveram abertas.
O fogo intenso no entanto não parou e voltou a acontecer. Víamos movimento dentro do quartel sem contudo podermos perceber o que realmente estava a suceder.
No quartel a certa altura havia muita luz e fumo de uma granada e de granadas de luz.
O fogo só parou mesmo cerca de uma hora depois dos primeiros disparos.
Ainda durante o tiroteio houve vários camiões que zarparam arriscando-se por meio do fogo.
O quartel fica do lado direito da N1 para quem viaja no sentido Norte-Sul, no sentido do Save.
A sede da Renamo fica do outro lado da estrada relativamente ao quartel da Policia.
O ataque viemos depois a saber que se iniciou da estrada para o quartel, atraindo a policia para essa frente. No entanto o grupo principal da Renamo viria a entrar no quartel com infiltração pela retaguarda, do lado do hospital.
O administrador de Muxunguè alegaria, na entrevista que nos concedeu, que a policia teve muitas baixas porque não quis disparar para baixo para evitar atingir a população dado tratar-se de uma zona habitada. (Fernando Veloso e Luciano da Conceição)

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