Já muita gente percebeu que, ao nível da
comunicação social pública, o director-geral do Jornal de Angola, José
Ribeiro, não tem nenhum concorrente à vista: é, destacadamente, o maior
lambe-botas do governo.
Ele vê nas mais pequenas e insignificantes
realizações do governo aquilo que mais nenhum angolano enxerga: singularidade,
imponência, grandiosidade e, sobretudo, generosidade do Presidente da
República.
Mas na edição do dia 8 de Julho do jornal que
dirige, José Ribeiro superou-se a si mesmo. Os elogios ao programa habitacional
do governo raiaram o ridículo.
Depois de ter visitado a quase desabitada
centralidade do Kilamba, de onde saiu profundamente deslumbrado, José Ribeiro
sucumbiu à emoção e ao desvario nos rasgados elogios que teceu à gigantesca
cidade fantasma.
É uma pena que José Ribeiro não enxergue um palmo
para além da centralidade do Kilamba. Se o fanatismo não lhe toldasse
gravemente os olhos e a mente, o director do Jornal de Angola saberia
que a realidade do país real – e não aquele cor de rosa, destinado a ser
vendido a incautos visitantes – não tem nada a ver com as “habitações
confortáveis” que ele supõem existirem nos Zangos e outros bairros pelo país
adentro.
Se José Ribeiro abrisse mão, por apenas algumas
horas, do conforto do seu gabinete e decidisse viajar pelo país para ver o que
se faz em matéria habitacional, chegaria à imediata conclusão que o governo não
faz milagre nenhum ao “construir 200 habitações em cada município”. É que
a maior parte do que lá se faz não pode ser designado como habitação.
No interior do país e, nomeadamente, em alguns
municípios de Malanje, há uma realidade, no mínimo, gravemente ofensiva para os
naturais dessas localidades e, mais ainda, para os cidadãos a que se destinarão
aquilo que no jargão oficial se designam por casas evolutivas.
As chamadas casas evolutivas, erguidas por vontade
de José Eduardo dos Santos (afinal não é ele quem decide tudo?), em algumas
localidades do país, são um verdadeiro escárnio aos filhos desta Angola.
O que a foto documenta, eufemísticamente designado
como casa evolutiva, é um conjunto de paredes disposto num espaço de 4X4
metros, dividido em duas partes iguais, e que será distribuído por duas
famílias. Para além de partilharem paredes comuns, os futuros habitantes
desses cubículos terão ainda de concordar num calendário para o acesso à
retrete, já que esta também é comum.
Aquelas mentes pagas para cobrir de generosidade e
magnanimidade toda a palavra e acto do Presidente, não perderam tempo a
descobrir que as ditas casas evolutivas são uma alavanca muito forte na cruzada
contra a pobreza. Pergunta-se: como é que em pleno século XXI, se pretende
combater a pobreza construindo cubículos em que é de todo impossível acomodar,
ao mesmo tempo, cama, geleira ou arca, fogão, televisor e mesa, cadeiras e
outros móveis indispensáveis a um conforto mínimo?
Estima-se que uma boa parte desses cubículos
estejam prontos a tempo de serem distribuídos no dia 28 de Agosto, exactamente
o dia em que o Presidente completará 70 anos de vida. A coincidência entre o
aniversário presidencial e a entrega dos cubículos associará, para sempre, o
nome de José Eduardo dos Santos a um dos piores insultos ao povo angolano.
Por mais fértil que seja a imaginação, não se
afigura nada fácil acomodar num apertado espaço de 2×2 metros o quarto, a
cozinha, a sala e os respectivos móveis. E mais: os infelizes
contemplados terão de sujeitar-se prévia ou posteriormente à castração. É de
todo impossível que espaços com as dimensões das ditas casas evolutivas possam
ser habitados por famílias, por mais pequenas que sejam.
Depois da construção de 500 “casas” em Viana,
Panguila, Zango I e outros projectos habitacionais de deplorável qualidade, o
executivo dá mais um passo na sua cruzada de sistemático e reiterado
desrespeito para com os angolanos.
É caso para dizer que o Presidente retribui com
desprezo e desonra a lealdade e a fidelidade de muitos angolanos. E neste caso
ele não é o único culpado. Se os angolanos se fizessem respeitar, se não se
resignassem à condição de feudo eleitoral, José Eduardo dos Santos não se
atreveria a pisoteá-los. Se os angolanos soubessem valorizar o seu voto, José
Eduardo dos Santos pensaria duas ou mais vezes antes de mandar executar uma
empreitada que configura uma verdadeira provocação e desprezo aos filhos deste
país.
Quando José Eduardo dos Santos fala em “Crescer
Mais e Distribuir Melhor”, afinal do que verdadeiramente se trata é de
proporcionar apartamentos luxuosos, avaliados em milhões de dólares, para os
seus filhos, enquanto uma boa parte dos angolanos é remetida para cubículos.
Outro exemplo de “crescimento e distribuição” à
moda do actual executivo é o destino dado a espaços públicos de estacionamento
em Luanda.
Defronte do antigo cinema Avis havia um espaço onde
as pessoas que iam ao cinema estacionavam as suas viaturas. Esse espaço hoje já
não existe. Tchizé dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos, decidiu que só
poderia mandar construir o seu Solar do Alvalade, o mesmo prédio em
que, segundo o portal Club K, o seu irmão ganhou um apartamento avaliado em
vários milhões de dólares.
Se José Ribeiro não se empenhasse em entortar a
história deste país, para agradar ao Presidente, saberia também que defronte do
Jornal de Angola havia um largo usado para estacionamento, mais tarde
baptizado pelas autoridades angolanas com o nome de Julius Fucik. Até
funcionários do próprio Jornal de Angola parqueavam ali os seus carros.
No lugar do parque hoje nasceram dois arranha-céus. Também neste caso o lema
“Crescer Mais e Distribuir Melhor” não poderia ser mais elucidativo daquilo que
é o verdadeiro programa de governo do MPLA.
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