Sandro
Fernandes
Direto de Volgogrado
Uma das histórias (ou lendas) de guerra mais
conhecidas mundialmente é a da derrota de Napoleão (1812) e de Hitler (1943)
contra os russos devido ao rigoroso inverno do país. Os soldados franceses e
alemães não estariam preparados para as temperaturas extremas do gigante branco
e capitularam. Verdade ou mentira, a história é contada e recontada por
estrangeiros e pelos próprios russos. Pouco se fala, no entanto, sobre uma
outra coisa tipicamente russa que também pode ter dado uma ajudinha nas
vitórias do país: a vodka.
Mãe
Pátria, a estátua monumental símbolo da história de Volgogrado
"Em poucos dias, Stalingrado era uma cidade destruída", contra veterana
Cerco de Stalingrado completa 70 anos: conheça história e personagens
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Em 1943, antes da ofensiva da União Soviética
em Staligrando, o marechal russo Georgui Jukov informou a Stalin que, como as
tropas não tinham anticongelante suficiente, estava sendo utilizada a vodka
para impedir que a água dos radiadores congelasse. Com o aumento do uso de
vodka para os carros, Stalin decidiu cancelar a distribuição da bebida para os
soldados do combate, até então fixada em 100g diárias. Ao mesmo tempo, o líder
soviético resolveu premiar os melhores soldados. Como? Com 200g de vodka por
dia.
Para os soldados que não se destacavam na
linha de frente, a vodka só era distribuída em nove dias festivos durante o
ano. A tática ajudou a aumentar a motivação dos soldados russos e o resultado
já é conhecido de todos - a Rússia venceu a batalha contra os alemães.
Cento e trinta anos antes da vitória em
Stalingrado, a vodka parece ter tido um papel importante na vitória russa
contra outro inimigo: Napoleão Bonaparte. O general francês e historiador
Philippe-Paul de Ségur, que participou
do enfrentamento com a Rússia em 1812, descreveu em seu livro que os soldados
franceses estavam adoecendo e morrendo por beber vodka russa. “Nossos jovens
soldados, enfraquecidos pela fome e o cansaço, achavam que esta bebida
restauraria sua energia, mas o calor (da bebida) fez com que eles gastassem o
resto de energia como em uma explosão e depois caíssem esgotados”.
Napoleão não menciona esta situação nos
boletins da Grande Armada, mas de Ségur cita mais detalhes deste problema
enfrentado pelos franceses. “Havia outros, ainda mais embriagados, que foram
vencidos pelas tonturas ou sonolências e caíram em valas ou nas estradas. Seus
olhos, meio fechados, aguados, viam a morte com indiferença. A morte tomou
conta deles e morreram estupidamente, sem nenhum gemido”.
Como em qualquer guerra, há muitas coisas
ainda pouco conhecidas sobre o cerco de Stalingrado. “Ainda é um tabu na Rússia
falar sobre os desertores, por exemplo”, conta a professora de história da
Universidade de Volgogrado, Ludmila Loviskaya. “Pelo menos 70 mil soldados
russos passaram para o lado alemão durante a guerra. Eles não fizeram isso
somente para desertar, mas muitas vezes pela simples promessa de melhores
pratos de comida no lado ‘inimigo’”.
Segunda a professora, os livros de História
falam do número de mortos, mas esta informação não passa a verdadeira ideia do
que era estar em combate. “A gente costuma achar que as condições eram ruins,
mas não paramos para refletir que a expectativa de vida dos soldados russos na
guerra não chegava a 24 horas. Para os oficiais, três dias era uma média
otimista”. Lovskaya cita ainda que canibalismo era comum pela falta de
provisões e que ratos e cavalos mortos também iam para a mesa dos que lutavam
no front.
“A política soviética do ‘Nem um passo
atrás’, lançada por Stalin, saiu vitoriosa. Mas o custo do enfrentamento foi
alto. Foram dois milhões de mortos dos dois lados somente na batalha de
Stalingrado. A maioria dos russos e dos alemães tem um parente ou amigo próximo
morto na guerra. Estes eventos deveriam ser usados para que tenhamos uma
consciência histórica, em vez de inflar o nosso patriotismo”, conclui
Loviskaya.
Imagem: Loja de bebidas alcoólicas em Moscou
na década de 1950: teria a vodka ligação com as vitórias militares?
Foto: Three Lions / Getty Images
Foto: Three Lions / Getty Images
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