Lisboa - O editorial da edição desta quarta-feira do diário
estatal Jornal de Angola defende o fim dos investimentos angolanos em Portugal,
considerando que, ao contrário de outros, o investidor angolano não é
bem-vindo.
Fonte:
Publico
Sob o título
“Alvos selectivos”, o editorial do único diário que se publica em Angola
defende ainda que Portugal “não é de confiança”.
“Todos os
investidores estrangeiros são bons para Portugal, menos os angolanos. Não há
qualquer desconfiança dos que compram aeroportos, portos, companhias de
aviação, de electricidade, posições maioritárias em bancos”, alega o editorial.
“Mas se algum
angolano anunciar que vai investir num determinado sector, uma matilha ruidosa
de comentadores avençados lança logo calúnias sobre o comprador e envenena os
possíveis negócios com intrigas e desconfianças inaceitáveis”, acrescenta.
Partindo do
princípio de que as “elites portuguesas corruptas decididamente não querem nada
com os investidores angolanos”, o Jornal de Angola defende a retaliação. “Vai
sendo tempo de respondermos na mesma moeda. E quem já investiu que leia os
jornais, oiça as rádios e televisões (...) Um país que valoriza lixo humano
como se fosse oiro de lei não tem condições para receber um euro sequer de
investimento. Quem promove bandidos a heróis não é de confiança”, acentua.
O “lixo humano” a
que se refere o Jornal de Angola são o que o diário angolano cita como “heróis
dos portugueses” que seguem “os caminhos da insídia e da traição em Angola”.
“Qualquer pobre
diabo que soletre umas palavras contra o Executivo de Angola ganha em Lisboa o
estatuto de activista dos direitos humanos e tem todo o espaço nos órgãos de
comunicação social. Angolano que em Lisboa insulte os titulares dos órgãos de
soberania de Angola é um herói para os portugueses. É assim desde o 25 de Abril
e tem-se agravado desde que os angolanos começaram a investir em Portugal”,
argumenta.
O jornal estatal
angolano considera que "Portugal tem um problema insolúvel com os seus
heróis" e que se hoje valoriza o que chama "lixo humano", no
tempo da guerra colonial "guindava aos píncaros da fama e cobria com o
manto do heroísmo os que assassinavam populações indefesas". "Anda
por aí muito assassino com as mais altas condecorações portuguesas. Alguns até
se opuseram ao 25 de Abril de 1974 e tentaram salvar o império combatendo ao
lado das tropas do regime de apartheid da África do Sul ou integrando
esquadrões especiais armados pelo ditador Mobutu" [antigo Presidente do
Zaire, actual República Democrática do Congo].
O editorial desta
quarta-feira segue-se ao que foi publicado no passado domingo, assinado por
José Ribeiro, director do diário angolano, e surge após a notícia avançada na
última edição do semanário Expresso, segundo a qual o procurador-geral da
República de Angola, João Maria de Sousa, está a ser investigado em Portugal
pelo Ministério Público por “suspeita de fraude e branqueamento de capitais”.
No texto de
domingo, José Ribeiro “desconfia” da boa-fé de Portugal nas relações com
Angola, referindo haver “perseguições” aos interesses angolanos.
Na sequência deste
texto, João Maria de Sousa reagiu, num comunicado enviado segunda-feira à
agência Lusa em Luanda, em que classifica como “despudorada” e “desavergonhada”
a forma como o segredo de justiça é “sistematicamente violado” em Portugal em
casos relativos a “honrados” cidadãos angolanos.
No texto da edição
desta quarta-feira do estatal Jornal de Angola, considera-se que a notícia do
semanário Expresso, apresentado como “jornal oficial do PSD”, partido que
lidera a coligação governamental em Portugal, constituiu um “assassínio de
carácter”.
"Magistrados
do Ministério Público em Portugal seleccionaram como alvo a abater o
procurador-geral da República, João Maria de Sousa. Desengane-se quem pensa que
se trata de um mero acaso", diz. "Não foi ocasional o ataque brutal
que os serviços do Ministério Público de Portugal fizeram contra o
vice-presidente da República [Manuel Vicente] e outros dirigentes angolanos."
Em Novembro, o Expresso avançou a notícia, confirmada pelo PÚBLICO, da existência de uma investigação contra “altos dirigentes angolanos” por suspeitas de fraude fiscal e branqueamento de capitais. Seriam pelo menos três figuras do círculo próximo do Presidente, José Eduardo dos Santos: Manuel Vicente, vice-chefe de Estado e ex-director-geral da empresa petrolífera Sonangol, o general Hélder Vieira Dias "Kopelipa", ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência, e o general Leopoldino Nascimento "Dino", consultor do ministro de Estado e ex-chefe de Comunicações da Presidência.
“Este episódio que envolve magistrados do Ministério Público e o jornal oficial do PSD não é o primeiro. Mas os legítimos representantes do povo angolano têm de fazer tudo para que seja o último. Afinal estamos todos a ser ofendidos por aqueles que sempre tratamos com respeito e consideração”, conclui o editorial desta quarta-feira.
Para o jornal angolano "não é nova" a posição de "fazer tudo para tratar Angola como um Estado que não merece confiança nem respeito da comunidade internacional". "Vem desde a noite de 10 de Novembro de 1975, quando um ministro do Governo português de então impediu o Conselho da Revolução de reconhecer a independência de Angola [a 11 de Novembro], dando aos 'capitães de Abril' informações falsas."
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