Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, Pitra Neto
(na foto) e José Pedro de Morais integram um grupo de agentes do Estado
criteriosamente escolhidos pelo Presidente José Eduardo dos Santos para, com o
suporte de fundos públicos, se constituírem no núcleo da burguesia nacional. O
primeiro é ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Segurança, o segundo
ocupa o cargo de ministro da Administração Púbblica, Emprego e Segurança Social
(MAPESS), enquanto o terceiro foi ministro das Finanças.
Em Angola, a acumulação primitiva de capital tem
vindo a beneficiar exclusivamente a corte de José Eduardo dos Santos. São
ministros, generais, políticos e familiares a quem o Presidente da República
ordenou que fossem entregues ou se apropriassem, geralmente de maneira ilícita,
de fabulosos recursos do Estado para a criação de núcleos de poder económico
capazes de catalisar o progresso do país pela via da criação de empresas e do
fomento do emprego.
Em 2005, o Semanário Angolense fez um
interessante levantamento de cruzamento de negócios e concluiu que, com
excepção de Valentim Amões, não “há nenhum outro grande empresário que tenha
ido dos negócios para a política”. Já o inverso, dizia o jornal, estava cheio
de exemplos. “Não há político de primeira linha hoje que não tenha
participações aqui e acolá”.
Isso demonstra que o processo de formação dos novos
capitalistas angolanos foi sempre controlado e monitorado pelo regime e, em
especial, pelo Presidente da República.
No levantamento feito nessa altura, Pitra Neto
acumulava a pasta do MAPESS com o cargo de vice-presidente do MPLA. Era também
associado ao Grupo Gema, onde tinha e tem como sócios Carlos Feijó e José
Leitão (actual e antigo chefe da Casa Civil da Presidência, respectivamente). O
então ministro das Finanças, José Pedro de Morais, era associado à Fininvest,
um grupo em que se associavam os seus irmãos Pedro Neto e Jorge Morais, para
além de Kundi Paihama, na altura ministro da Defesa. Por sua vez, o general
Kopelipa era associado a muitos grupos empresariais, nomeadamente a Grinaker
LTA Angola, Robbuster e Grupo Five.
Todos esses agrupamentos empresariais, sem
excepções, foram alimentados por fundos públicos.
Mas, o ímpeto da acumulação do capital foi tal que,
em 2009, José Eduardo dos Santos parecia ter perdido o controlo da situação.
Falando por ocasião da visita do Papa Bento XVI ao nosso país, em Março daquele
ano, José Eduardo mostrou-se assustado com a enorme balbúrdia que já então se
vivia. “O que há a fazer é separar claramente os negócios privados dos negócios
do Estado”, disse.
Um ano antes, José Eduardo dos Santos, que sabe bem
quem tem o quê, pareceu desiludido com as performances dos novos capitalistas.
Como muitos cidadãos deste país, José Eduardo dos Santos também teria concluído
que os novos-ricos não estavam a retribuir, ao país, os favores recebidos. Em discurso
de campanha eleitoral (e sugerindo que conhecia bem a quem se estava a
dirigir), José Eduardo dos Santos pediu aos novos detentores de riqueza para
“reinvestir pelo menos 70 por cento dos lucros em projectos de interesse
nacional que visam combater o desemprego, a pobreza, a falta de habitação e a
aumentar a oferta de bens e serviços”.
O que levou o Presidente da República a fazer
aquele apelo foi a constatação que uma boa parte dos novos-ricos angolanos
“torra” o dinheiro em causas totalmente fúteis.
A semana passada, o Maka Angola revelou como e para onde vão alguns dos milhões subtraídos
ao erário público.
Em dois dos cinco apartamentos que comprou na Torre
Baía, num luxuoso complexo habitacional no Estoril, em Portugal, Pitra Neto tem
como vizinho o ministro de Estado e da Casa Militar. Em Angola, Pitra Neto e o
general Kopelipa não são conhecidos por cultivar uma grande amizade recíproca.
Antes pelo contrário.
Um levantamento igualmente feito pelo Semanário
Angolense, em 2005, concluiu que as clivagens entre os dois eram antigas,
mas ter-se-iam acentuado em 1996, altura em que alguns membros do governo
“ligados à gestão da economia, apoiados por Kopelipa, tentavam, à viva força,
convencer o Presidente da República que o Ministério da Administração Pública,
Emprego e Segurança Social seria o responsável pelos desequilíbrios
inflacionistas que então atormentavam a economia angolana”. Segundo os detractores,
Pitra Neto não “fazia absolutamente nada para inverter a situação”.
De acordo com o referido semanário, o general
Kopelipa, ao tempo director de um obscuro e desconhecido GEPA (Gabinete de
Estudos, Projectos e Análises) teria também as suas impressões digitais numa
outra cabala contra Pitra Neto, a qual consistia em associar o ministro do
MAPESS a Moisés Nele, então governador da Lunda Norte, “acusado (e depois
exonerado) de fazer maus negócios com dinheiro do Estado”.
Se em Angola Pitra e Kopelipa não fazem questão de
ser grandes amigos, em Lisboa, contudo, os dois homens não têm a mais pequena
dificuldade em conviver no luxuoso complexo do Estoril.
Na mesma Torre Baía, o antigo ministro das
Finanças, José Pedro de Morais, mostrou o quanto vale: comprou quatro
apartamentos, nos 1º., 2º., 4º. e 5º pisos.
O que se passa na Torre Baía é a prova de que
alguns integrantes da nossa elite não estão preocupados em reinvestir no país
os frutos do seu enriquecimento em circunstâncias obscuras. Muitos deles estão
empenhados em superar-se em “olimpíadas” que visam determinar quem consegue
ostentar mais riqueza e quem consegue impressionar mais os estrangeiros,
nomeadamente os portugueses.
Pitra Neto, Kopelipa, José Pedro de Morais e muitos
outros estão a fazer o que era previsível: gastar de forma dissoluta o que
ganharam ilicitamente.
O que esses privilegiados fazem não tem nenhum
parentesco com a reprodução do capital. O que eles fazem em Lisboa e noutras
paragens é um hino ao boçalismo e ao exibicionismo. E isso é uma bofetada na
cara da maioria dos angolanos.
Em Abril de 2009, o jornalista, escritor e deputado
João Melo, que pertence à mesma família política e ideológica de Pitra Neto,
Kopelipa e José Pedro de Morais, escreveu o seguinte na revista África 21:
“No actual momento histórico de Angola, um ‘capitalismo’ que – em vez de
investimento no futuro não só dos capitalistas, mas da sociedade – seja
confundido apenas com a apropriação pessoal (a qualquer custo), esbanjamento e
exibicionismo pode ter, a médio prazo, consequências imprevisíveis”. Pobre João
Melo, ninguém o levou a sério ou, então, foi tido como invejoso…
O problema é que José Eduardo dos Santos confortou
as mãos de alguns eleitos com milhões e milhões de dólares para fazer deles o
núcleo da burguesia nacional. Mas não os equipou com um valor essencial: o
patriotismo.
Essa gente faz o que faz porque não tem um pingo de
amor pela sua Pátria.
António Domingos Pitra da Costa Neto fez o que,
garantidamente, quase nenhuma outra pessoa no MPLA faria. Em duas ocasiões,
prescindiu de oportunidades extraordinárias de poder. Primeiro, rejeitou
reiteradas ofertas de José Eduardo dos Santos, no sentido de fazer dele o seu
delfim. Segundo, pediu para deixar a vice-presidência do MPLA.
O que sempre pareceu enigmático pode ter agora
alguma explicação. Provavelmente Pitra Neto não quis desonrar as duas funções.
Na verdade, “casa” mal a condição de vice-presidente da República ou do MPLA
com a de exportador compulsivo de divisas para o estrangeiro. E, não tendo aberto
mão dessa sua condição, espera-se que Pitra Neto continue coerente consigo
mesmo, não se deixando “derreter” com a oferta do posto de presidente da
Assembleia Nacional. O cargo tem de ser honrado.
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