quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Pitra Neto e o Esbanjamento Compulsivo


Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, Pitra Neto (na foto) e José Pedro de Morais integram um grupo de agentes do Estado criteriosamente escolhidos pelo Presidente José Eduardo dos Santos para, com o suporte de fundos públicos, se constituírem no núcleo da burguesia nacional. O primeiro é ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Segurança, o segundo ocupa o cargo de ministro da Administração Púbblica, Emprego e Segurança Social (MAPESS), enquanto o terceiro foi ministro das Finanças.
Em Angola, a acumulação primitiva de capital tem vindo a beneficiar exclusivamente a corte de José Eduardo dos Santos. São ministros, generais, políticos e familiares a quem o Presidente da República ordenou que fossem entregues ou se apropriassem, geralmente de maneira ilícita, de fabulosos recursos do Estado para a criação de núcleos de poder económico capazes de catalisar o progresso do país pela via da criação de empresas e do fomento do emprego.
Em 2005, o Semanário Angolense fez um interessante levantamento de cruzamento de negócios e concluiu que, com excepção de Valentim Amões, não “há nenhum outro grande empresário que tenha ido dos negócios para a política”. Já o inverso, dizia o jornal, estava cheio de exemplos. “Não há político de primeira linha hoje que não tenha participações aqui e acolá”.
Isso demonstra que o processo de formação dos novos capitalistas angolanos foi sempre controlado e monitorado pelo regime e, em especial, pelo Presidente da República.
No levantamento feito nessa altura, Pitra Neto acumulava a pasta do MAPESS com o cargo de vice-presidente do MPLA. Era também associado ao Grupo Gema, onde tinha e tem como sócios Carlos Feijó e José Leitão (actual e antigo chefe da Casa Civil da Presidência, respectivamente). O então ministro das Finanças, José Pedro de Morais, era associado à Fininvest, um grupo em que se associavam os seus irmãos Pedro Neto e Jorge Morais, para além de Kundi Paihama, na altura ministro da Defesa. Por sua vez, o general Kopelipa era associado a muitos grupos empresariais, nomeadamente a Grinaker LTA Angola, Robbuster e Grupo Five.
Todos esses agrupamentos empresariais, sem excepções, foram alimentados por fundos públicos.
Mas, o ímpeto da acumulação do capital foi tal que, em 2009, José Eduardo dos Santos parecia ter perdido o controlo da situação. Falando por ocasião da visita do Papa Bento XVI ao nosso país, em Março daquele ano, José Eduardo mostrou-se assustado com a enorme balbúrdia que já então se vivia. “O que há a fazer é separar claramente os negócios privados dos negócios do Estado”, disse.
Um ano antes, José Eduardo dos Santos, que sabe bem quem tem o quê, pareceu desiludido com as performances dos novos capitalistas. Como muitos cidadãos deste país, José Eduardo dos Santos também teria concluído que os novos-ricos não estavam a retribuir, ao país, os favores recebidos. Em discurso de campanha eleitoral (e sugerindo que conhecia bem a quem se estava a dirigir), José Eduardo dos Santos pediu aos novos detentores de riqueza para “reinvestir pelo menos 70 por cento dos lucros em projectos de interesse nacional que visam combater o desemprego, a pobreza, a falta de habitação e a aumentar a oferta de bens e serviços”.
O que levou o Presidente da República a fazer aquele apelo foi a constatação que uma boa parte dos novos-ricos angolanos “torra” o dinheiro em causas totalmente fúteis.
A semana passada, o Maka Angola revelou como e para onde vão alguns dos milhões subtraídos ao erário público.
Em dois dos cinco apartamentos que comprou na Torre Baía, num luxuoso complexo habitacional no Estoril, em Portugal, Pitra Neto tem como vizinho o ministro de Estado e da Casa Militar. Em Angola, Pitra Neto e o general Kopelipa não são conhecidos por cultivar uma grande amizade recíproca. Antes pelo contrário.
Um levantamento igualmente feito pelo Semanário Angolense, em 2005, concluiu que as clivagens entre os dois eram antigas, mas ter-se-iam acentuado em 1996, altura em que alguns membros do governo “ligados à gestão da economia, apoiados por Kopelipa, tentavam, à viva força, convencer o Presidente da República que o Ministério da Administração Pública, Emprego e Segurança Social seria o responsável pelos desequilíbrios inflacionistas que então atormentavam a economia angolana”. Segundo os detractores, Pitra Neto não “fazia absolutamente nada para inverter a situação”.
De acordo com o referido semanário, o general Kopelipa, ao tempo director de um obscuro e desconhecido GEPA (Gabinete de Estudos, Projectos e Análises) teria também as suas impressões digitais numa outra cabala contra Pitra Neto, a qual consistia em associar o ministro do MAPESS a Moisés Nele, então governador da Lunda Norte, “acusado (e depois exonerado) de fazer maus negócios com dinheiro do Estado”.
Se em Angola Pitra e Kopelipa não fazem questão de ser grandes amigos, em Lisboa, contudo, os dois homens não têm a mais pequena dificuldade em conviver no luxuoso complexo do Estoril.
Na mesma Torre Baía, o antigo ministro das Finanças, José Pedro de Morais, mostrou o quanto vale: comprou quatro apartamentos, nos 1º., 2º., 4º. e 5º pisos.
O que se passa na Torre Baía é a prova de que alguns integrantes da nossa elite não estão preocupados em reinvestir no país os frutos do seu enriquecimento em circunstâncias obscuras. Muitos deles estão empenhados em superar-se em “olimpíadas” que visam determinar quem consegue ostentar mais riqueza e quem consegue impressionar mais os estrangeiros, nomeadamente os portugueses.
Pitra Neto, Kopelipa, José Pedro de Morais e muitos outros estão a fazer o que era previsível: gastar de forma dissoluta o que ganharam ilicitamente.
O que esses privilegiados fazem não tem nenhum parentesco com a reprodução do capital. O que eles fazem em Lisboa e noutras paragens é um hino ao boçalismo e ao exibicionismo. E isso é uma bofetada na cara da maioria dos angolanos.
Em Abril de 2009, o jornalista, escritor e deputado João Melo, que pertence à mesma família política e ideológica de Pitra Neto, Kopelipa e José Pedro de Morais, escreveu o seguinte na revista África 21: “No actual momento histórico de Angola, um ‘capitalismo’ que – em vez de investimento no futuro não só dos capitalistas, mas da sociedade – seja confundido apenas com a apropriação pessoal (a qualquer custo), esbanjamento e exibicionismo pode ter, a médio prazo, consequências imprevisíveis”. Pobre João Melo, ninguém o levou a sério ou, então, foi tido como invejoso…
O problema é que José Eduardo dos Santos confortou as mãos de alguns eleitos com milhões e milhões de dólares para fazer deles o núcleo da burguesia nacional. Mas não os equipou com um valor essencial: o patriotismo.
Essa gente faz o que faz porque não tem um pingo de amor pela sua Pátria.
António Domingos Pitra da Costa Neto fez o que, garantidamente, quase nenhuma outra pessoa no MPLA faria. Em duas ocasiões, prescindiu de oportunidades extraordinárias de poder. Primeiro, rejeitou reiteradas ofertas de José Eduardo dos Santos, no sentido de fazer dele o seu delfim. Segundo, pediu para deixar a vice-presidência do MPLA.
O que sempre pareceu enigmático pode ter agora alguma explicação. Provavelmente Pitra Neto não quis desonrar as duas funções. Na verdade, “casa” mal a condição de vice-presidente da República ou do MPLA com a de exportador compulsivo de divisas para o estrangeiro. E, não tendo aberto mão dessa sua condição, espera-se que Pitra Neto continue coerente consigo mesmo, não se deixando “derreter” com a oferta do posto de presidente da Assembleia Nacional. O cargo tem de ser honrado.


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