Um forte dispositivo combinado da Polícia de
Intervenção Rápida (PIR), agentes da ordem pública e dos Serviços de
Inteligência e Segurança de Estado (SINSE), dispersaram esta manhã, de forma
violenta, uma concentração de veteranos de guerra que se preparava para
realizar uma manifestação na cidade do Lubango, província da Huíla.
No acto, as forças policiais detiveram 14
manifestantes e um jornalista que cobria a tentativa pacífica de protesto que,
entretanto, foram libertados depois de cerca de 10 horas, no Comando Municipal
do Lubango.
As forças policiais e de segurança, avaliadas em
mais de 150 elementos, desbodraram-se no local de concentração da manifestação
por volta das 5h00 e, inicialmente, avisavam os veteranos, que começaram
a convergir no local por volta das 6h00, a retiraram-se voluntariamente do
local.
Perto das 8h00, veteranos destemidos formaram um
grupo de mais de 250 elementos, munidos apenas de cartazes e animados por
cânticos, os agentes da PIR receberam ordens para agredi-los à bastonada.
O coordenador fiscal do Fórum Independente dos
Desmobilizados de Guerra de Angola (FIDEGA), Armando Segunda, que procurava
organizar os seus companheiros, foi um dos principais visados dos cassetetes da
polícia.
“Eu sou deficiente, perdi a perna esquerda na
guerra. Três agentes da PIR agarraram-me como se eu fosse um porco e
espancaram-me por todo o corpo, com porretes. Tenho o corpo inflamado”, disse
ao Maka Angola o capitão na reserva, Armando Segunda. Este oficial
serviu como comandante da 1ª Companhia, do 1º Batalhão da 35ª Brigada,
estacionada no município da Jamba, Huíla, onde foi ferido por uma mina
anti-pessoal em 1989.
Por sua vez, o correspondente da Rádio Despertar e
do jornal Angolense, Sebastião Silva, disse a este portal que foi detido
por elementos à paisana que, de imediato, confiscaram o seu telemóvel e
torceram-lhe o braço. “Já na viatura da polícia, os agentes ameaçaram-nos.
Disseram-nos ‘quem abrir a boca será fuzilado”, referiu o jornalista.
Domingos Manuel Mendes, de 45 anos, um outro
veterano de guerra, corroborou das declarações do jornalista e adiantou mais:
“fomos chamados de cães e bandidos pelos emergentes [nome coloquial atribuído
aos agentes da PIR]. Também disseram-nos que nos podiam fuzilar e atirar na
Fenda da Tundavala”. O antigo soldado, desmobilizado em 1992, serviu como
operador-chefe de rádio-localização P-18, da brigada anti-aérea “Quadrante”,
então estacionada no município da Cahama, na província do Cunene. Há 20 anos
que reclama pela sua pensão, nunca paga.
A 9 de Julho passado, o FIDEGA formalmente
comunicou o governo provincial e entidades policiais e militares sobre a sua
decisão em realizar uma manifestação a 3 de Agosto. Segundo o presidente do
FIDEGA, Nunes Manuel, os seus filiados protestariam devido ao “incumprimento
por parte do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas (FAA), que
prometeu o envio de uma comissão, no mês de Julho, para avaliar a situação dos 16,000
desmobilizados que continuam por receber os seus subsídios desde 1992, há 20
anos”.
O tenente-coronel Nunes Manuel (na reserva)
lamentou, ao Maka Angola, o facto das autoridades locais nunca terem
respondido à sua correspondência sobre a manifestação.
“Apenas na quarta-feira (1 de Agosto), o delegado
provincial do SINSE veio ter connosco para se informar da manifestação”, disse
o oficial na reserva.
O presidente do FIDEGA informou també que “ontem,
Quinta-feira, falámos com o general Apolo Yakuvela, comandante da região
militar Sul, durante quase uma hora. O general deu-nos a conhecer do contacto
que teve com o chefe do Estado-Maior General [das Forças Armadas Angolanas]
sobre o assunto. Disse que o caso estava a ser resolvido e pediu-nos para cancelar
a manifestação”.
No decurso da movimentação das autoridades no mesmo
dia, Quinta-feira, o comandante provincial da Polícia Nacional na Huíla
telefonou ao tenente-coronel Nunes Manuel. “O comandante disse-me que, nesta
altura complicada de eleições, a realização da manifestação ‘era inconveniente’
e também me pediu para cancelar o acto”, explicou o líder dos desmobilizados.
O presidente do FIDEGA informou os seus
interlocutores sobre a sua decisão em não cancelar a manifestação “sob o risco
de criar ira junto dos meus homens, porque as autoridades nunca cumprem com as
suas promessas”.
No entanto, o porta-voz provincial da Polícia
Nacional, Paiva Tomás, escusou-se a prestar declarações sobre a acção policial
e os veteranos de guerra detidos.
Entre os detidos, no comando municipal da Polícia
Nacional, encontravam-se os veteranos de guerra Adriano Pedro, Agostinho Pedro,
Daniel Faria, Daniel Sabambi, Domingos Manuel, Domingos Vitorino, Inácio Caule,
João António, João Figueiredo, José António Cuia, Lote Correia, Luís Guerra e
Rafael Capingala.
Após a dispersão da manifestação, agentes policiais
e de segurança encetaram buscas de veteranos de guerra nos arredores e em
várias zonas residenciais.
As ameaças de fuzilamento a que os detidos foram
sujeitos lembram o desaparecimento, há dois meses, em Luanda, de Alves
Kamulingue e Isaías Cassule, então envolvidos na organização de uma
manifestação de ex-guardas presidenciais, prevista para 27 de Maio
passado. Adensam-se as suspeitas sobre o que lhes terá acontecido depois
de terem sido raptados na cidade. Por outro lado, a Fenda da Tundavala, apesar
de ser um local turístico, guarda nas suas entranhas esqueletos de várias
purgas políticas.
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